ALCÂNTARA

A Festa do Divino em tempos de pandemia

Fé, devoção e tradição de um dos maiores festejos religiosos do Maranhão, que reúne centenas de pessoas, teve que se adaptar em sua estrutura por conta da pandemia.

A festa acontece na cidade histórica de Alcântara (MA), situada a 22 quilômetros da capital São Luís. (Foto: Divulgação)

Com uma celebração simbólica, mas cheia de fé, que os devotos do culto ao Divino Espírito Santo percorreram as ruas de pedras de encantaria em Alcântara até a Igreja de Nossa Senhora do Carmo.  Por conta da pandemia da Covid-19, a tradição foi mantida pelos organizadores da festa respeitando todos os protocolos de saúde, sem aglomeração, festas, e sem o cortejo imperial formado por imperador ou imperatriz mordomo-régio, mordoma-régia, mordomo-mor, mordoma-mor, caixeiras e bandeirinhas.

Este ano somente a “Santa Croa” (a Coroa do Divino), símbolo religioso da tradição secular desfilou no último dia 23 de maio, Dia de Petencostes, em cima de um carro de som, acompanhada de uma banda de músicos formadas só por instrumentos de sopro que entoavam hinos e músicas, que ecoavam pelos casarões e ruiínas erguidas pelos colonos açorianos, portugueses e seus descendentes, quando chegaram à cidade desde o início do século XVII para povoar a região distante apenas 22 km de São Luís.

Mesmo sem os rituais como alvoradas, o carregamento e levantamento do mastro, a distribuição de licor, chocolate, bolos e o tradicional doce de espécie,  a família da Imperatriz da festa, Alda Pinheiro, promoveu um almoço para os organizadores da festa e poucos convidados, que foi servido em uma antiga senzala nos fundos da residência de sua família. A tradição de entoar cantos ao divino também aconteceu de forma tímida, marcada por muitos disparos de foguetes. O encantamento com a festa, que perdura quase duas semanas e mobiliza centenas de pessoas na cidade histórica, não teve o seu glamour do cortejo feito pela corte com suas roupas bordadas com pedras, canutilhos, miçangas e paetês que remetem a um passado que se faz presente a cada ano durante a festa que é uma das mais importantes práticas religiosas do Maranhão, que ainda conserva por meio de seus personagens aspectos do período colonial.

Em sua maioria, os participantes são pessoas humildes, de baixo poder aquisitivo, que se esforçam para produzir uma festa rica e luxuosa, onde não podem faltar as refeições fartas, a decoração requintada e caras vestimentas para as crianças do império. Por se tratar de uma festa longa, custosa e cheia de detalhes, sua preparação e realização levam vários meses e envolve muita gente, construindo assim uma grande rede de relações entre todos os participantes.

Caixeiras do Divino: o espírito da festa

CAIXEIRAS DO DIVINO COMPÕEM UM GRUPO DE MULHERES COM RAÍZES AFRODESCENDENTES QUE PROPAGAM OS ENSINAMENTOS

Hoje a principal preocupação dos organizadores da Festa do Divino em Alcântara está relacionada à diminuição da quantidade de Caixeiras (senhoras que carregam a tradição) ao longo dos ano pela falta de interesse da nova geração em relação ao evento que já faz parte do calendário cultural no Maranhão. Vale ressaltar que as Caixeiras do Divino compõem um grupo de mulheres com raízes afrodescendentes que propagam os ensinamentos de toques de caixa para as próximas gerações, além de realizar o ritual sagrado da Festa do Divino Espírito Santo sob a forma de obrigação espiritual. Os rituais que as Caixeiras realizam ao tocar caixa e cantar para o Divino são a tradução do simbolismo do sagrado. As Caixeiras constituem um dos elementos mais importantes da festa, podemos dizer que sem elas não há festa do Divino, por isso se faz necessário um trabalho de perpetuação da presença destas mulheres na tradição.

Em São Luís e em diversas outras cidades maranhenses, a festa do Divino é estreitamente identificada com as mulheres, e em especial com as mulheres negras ligadas às religiões afro-brasileiras.

Esse fato distingue a festa no Maranhão das festas do Divino realizadas em outras regiões do país e lhe dá uma feição bem particular. Com exceção de algumas festas, como a de Alcântara, organizada com o apoio de autoridades locais e sem vínculos com terreiros, a grande maioria das festas do Divino no Maranhão é realizada em casas de culto (tambor de minas), onde a presença feminina é dominante.

O sentimento pelo sagrado despertado pelo Divino Espirito Santo só entende quem vive, tem contato, ou, por meio da fé, que são representadas nesta festa que vai muito além de ser um cartão postal para turista ver.

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