RESSARCIMENTO

Prefeito de Rosário e familiares são acionados por improbidade administrativa

Ação do Ministério Público do MA quer garantir ressarcimento de R$ 3 milhões e 300 mil dos danos causados e pagamento de multa

O Complexo Ferroviário de Rosário. Créditos - IPHAN/Reprodução

As movimentações financeiras do prefeito de Rosário, José Nilton Calvet Filho, e de seus parentes, com valores sem origem identificada, motivaram o Ministério Público do Maranhão (MPMA) a ajuizar Ação Civil Pública (ACP) — por ato de improbidade administrativa contra o gestor municipal, familiares e as empresas deles, no dia 2 de setembro.

Também foram acionados sócios de outras empresas que firmaram contratos com a administração municipal de Rosário.

O objetivo da ação é garantir eventual ressarcimento de R$ 3 milhões e 300 mil dos danos causados e pagamento de multa. O MPMA solicitou ao Poder Judiciário que determine, liminarmente, a indisponibilidade dos bens dos requeridos e a condenação deles por improbidade administrativa que resultou no enriquecimento ilícito dos mesmos.

O IMPARCIAL entrou em contato com a assessoria do Prefeito de Rosário — que disse não ter sido notificado formalmente da ação do MPMA, e repudiou o que descreve como campanha difamatória contra sua imagem. Veja na íntegra o parecer de Calvet Filho ao final da matéria.

Os alvos da ação

São alvos os seguintes familiares do prefeito: Francisca Rocha Calvet (esposa), Jonatha Carvalho Calvet (irmão) e Dulcimary Bezerra Desterro (cunhada).

As empresas Farmacenter Comércio (matriz em Morros e filial em Rosário), C A Santos Eireli (São Luís), WB Soluções e Engenharia LTDA (Vitória do Mearim) e CWDR Promoções e Empreendimentos (São Luís) igualmente foram acionadas, assim como o sócio desta última, Claudio Wilson Damasceno Rodrigues.

Leonardo Pinto de Lima também é demandado por colaborar com o suposto esquema de lavagem de dinheiro.

A ACP é assinada pela titular da 1ª Promotoria de Justiça de Rosário, Maria Cristina Lobato, e pelos promotores de justiça Ana Carolina Mendonça, Fernando Berniz Aragão e Marcos Valentim Pinheiro Paixão, integrantes do Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas (Gaeco).

O início das investigações

De acordo com Maria Cristina Lobato — que atua na defesa do patrimônio público e da probidade administrativa — a investigação foi iniciada em 2023 após tomar conhecimento de fatos que indicavam enriquecimento ilícito do prefeito Calvet Filho e do irmão Jonatha Calvet, em conluio com pessoas físicas e jurídicas.

A promotora de justiça destacou que, como o gestor possui foro privilegiado, os fatos foram comunicados ao procurador-geral de justiça para conhecimento e adoção de possíveis providências na esfera penal. No âmbito da Promotoria de Justiça, as apurações foram realizadas nas áreas cível e administrativa, em atuação conjunta com o Gaeco.

Os valores

As investigações confirmaram que a filha mais velha do prefeito estuda Medicina em uma faculdade particular de São Luís, cuja mensalidade é de R$ 12.626,00. A outra filha estuda em uma escola com mensalidade de R$ 2.800,00. A soma das duas parcelas mensais supera o valor da remuneração bruta de R$ 15 mil do gestor. O valor líquido recebido por ele é de R$ 11.108,38.

No registro de candidatura, em 2020, o atual prefeito declarou não possuir bens em seu nome e, posteriormente, as investigações revelaram gastos incompatíveis com os rendimentos.

“O mesmo ocorre com seus familiares, que igualmente demonstraram evolução patrimonial acelerada, acentuada a partir da eleição de Calvet Filho”, afirmou, na ação, Maria Cristina Lobato.

Além disso, em 2020, o prefeito de Rosário recebeu seis parcelas do auxílio emergencial destinado a pessoas de baixa renda: cinco parcelas de R$ 600 e uma de R$ 300.

Evolução patrimonial

Os indícios de enriquecimento ilícito foram confirmados pela comunicação de “movimentação financeira atípica” feita pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).

O Relatório de Inteligência Financeira (RIF) encaminhado pelo Coaf indicou duas comunicações envolvendo Dulcimary Desterro. A primeira foi a operação com pagamento no valor de R$ 50 mil em espécie registrada no cartório do 2º Ofício de Rosário em que ela figura como compradora de um imóvel em 2021.

A segunda foi um depósito em espécie no valor de R$ 50 mil em que a Farmacenter Comércio figura como titular e Dulcimary Desterro como responsável e depositante.

De acordo com as investigações, Leonardo Lima foi sinalizado pelo COAF no monitoramento sistêmico de prevenção à lavagem de dinheiro por ter movimentações atípicas concentradas com a empresa C A Santos Eireli.

Esta era responsável pela maioria de seus créditos e tinha três contratos, entre 2022 e 2023, com as Secretarias de Assistência Social, Administração e Recursos Humanos, Educação e Saúde de Rosário, com valores que ultrapassam R$ 700 mil.

Leonardo Lima repassou valores para a Farmacenter Comércio, da qual Jonatha Calvet é proprietário.

“Tal situação indica que Jonatha Calvet recebeu valores da empresa contratada pelo município de Rosário, qual seja a C A Eireli, e que Leonardo Lima é apenas um intermediário para mascarar o vínculo direto entre aqueles”, afirmaram, na ACP, os representantes do MPMA.

Na avaliação dos promotores de justiça, Calvet Filho e Jonatha Calvet tiveram um aumento significativo de patrimônio desde 2021, primeiro ano do mandato da atual gestão na cidade de Rosário.

“Os créditos referentes aos salários dos dois constituem um percentual pequeno do total do dinheiro nas contas deles, que, em sua maioria, são de origem desconhecida ou advindas da Farmacenter, a qual, por sua vez, é alimentada por pessoas ligadas a empresas que contratam com o município”.

Também foi constatado que as notas fiscais emitidas em nome do prefeito Calvet Filho e da esposa dele, Francisca Estela Rocha, ultrapassam a renda oficial do casal.

Antes de ser eleito prefeito, Calvet Filho não tinha outra fonte de renda e nem patrimônio prévio, chegando a receber auxílio emergencial em 2020, assim como a esposa e o pai dele, José Nilton Pinheiro Calvet.

Com Jonatha Calvet, foi também detectada essa desproporção, já que não tinha vínculo empregatício, nem ocupava cargo público, figurando somente como sócio das mencionadas farmácias, que passaram a ser utilizadas para receber dinheiro de empresas contratadas pelo município de Rosário até chegarem às mãos dos irmãos Calvet e cônjuges.

Depósitos sem origem identificada

Após decisão judicial que autorizou a quebra do sigilo bancário dos requeridos, foi elaborado um relatório de análise bancária pelo Laboratório de Tecnologia contra Lavagem de Dinheiro (LAB-LD/MPMA). A partir daí, o Ministério Público do Maranhão constatou que, entre os anos de 2021 e 2023, Calvet Filho recebeu mais de R$ 1 milhão e 327 mil em sua conta bancária e 70% desse valor é formado de depósitos sem origem identificada.

O dinheiro não identificado foi recebido, em grande parte, por 448 depósitos com valor máximo de R$ 10 mil cada um.

“Em clara tentativa de, por um lado, obstar a rastreabilidade da origem dos montantes e, por outro, evitar a comunicação do Coaf quanto a transações atípicas”, relataram na ACP os promotores de justiça.

As mesmas irregularidades foram constatadas na conta da primeira-dama Francisca Estela Calvet: ela recebeu mais de R$ 751 mil, entre 2021 e 2023, em recursos não rastreáveis, correspondendo a 77% de valores sem origem identificada.

Jonatha Calvet — assessor-chefe de Assuntos Institucionais de Rosário — recebe salário bruto de R$ 6.750,00.

Porém, a movimentação financeira é incompatível com os rendimentos e com o porte da Farmacenter, da qual ele é sócio. Nos três primeiros anos da gestão municipal, ele recebeu R$ 1 milhão e 36 mil em sua conta bancária.

Dulcimary Desterro, cunhada do prefeito, movimentou mais de R$ 540 mil no período de 2021 a 2023. Ela recebeu uma série de depósitos de empresas que possuem contratos com a administração municipal rosariense.

Para concluir as investigações, o MPMA igualmente avaliou a movimentação financeira da Farmacenter.

O Relatório de Análise Bancária detectou indícios de que a conta da empresa é usada como conta de passagem. Foram identificados 408 depósitos em dinheiro. Cada depósito não ultrapassou o valor de R$ 9 mil, muitos fracionados no mesmo dia, totalizando R$ 521.643 mil.

Jonatha Calvet recebeu da Farmacenter, em 2022, R$ 184.787 mil, que obteve créditos de Cláudio Wilson Damasceno e Leonardo Pinto de Lima. Eles são intermediários das empresas WB Soluções e C A Santos.

A maior parte dos créditos é desconhecida, indicando que a Farmacenter serve de álibi para justificar os ganhos do irmão do prefeito.

O que disse o Prefeito

Procurado por O IMPARCIAL, o Prefeito Calvet Filho disse não ter sido notificado formalmente sobre o processo e repudiou o que define como “campanha difamatória” praticada contra o gestor de Rosário.

Veja a nota na íntegra:

A assessoria de comunicação do prefeito Calvet Filho vem a público informar que não foi notificado formalmente a respeito do processo de acusação de enriquecimento ilícito no bojo de ação de improbidade proposto pelo Ministério Público.

De tal sorte informa ainda que processos dessa natureza correm em segredo de justiça ante a proteção de dados pessoais cuja entidade propositora da ação possui laboratório específico no quadro de sua instituição que preconiza tal conduta onde o vazamento prematuro de informações processuais sem a formação da triangulação processual formal causa espanto.

Quanto as acusações formuladas no bojo do processo, após a devida notificação e acesso aos autos, a assessoria jurídica exercerá o contraditório com a finalidade demonstrar a inocência do prefeito a respeito das acusações formuladas.

Por fim, o prefeito Calvet Filho repudia com veemência toda campanha difamatória que está sendo praticada contra a sua pessoa e também rechaça toda conduta antiprofissional que desrespeitando corolários de proteção de dados gerou o vazamento de seus dados pessoais.

***Da assessoria do Ministério Público do Maranhão (MPMA)

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