DESIGUALDADE

Regiões com maior desigualdade entre ricos e pobres são mais afetadas pela pandemia, diz Estudo

Levantamento aponta que as regiões brasileiras mais vulneráveis à COVID são as que tem maior desigualdade social

Palafita em São Luís: ao fundo, o Palácio dos Leões. (Foto: Arquivo)

Pesquisa da Escola Nacional de Administração Pública (Enap) mostra que a pandemia da COVID-19 que afeta o Brasil desde 2020 mudou a geografia do país. Os municípios mais vulneráveis à doença são os que têm população com maior desigualdade social, especialmente aqueles de médio porte.

Não são necessariamente os municípios mais pobres (com menor renda) os mais afetados, mas as cidades onde há muitos ricos e muito pobres convivendo no mesmo espaço, alerta a pesquisa inédita realizada em 5.570 municípios, de 25 de fevereiro a 31 de julho de 2020.

O Brasil tem um alto percentual de habitantes vulneráveis à pobreza: 44% da população possui renda domiciliar inferior a R$ 255 por pessoa. Um dado que chama a atenção no estudo é que 134 cidades brasileiras têm mais de 80% da população nessa condição.

Um exemplo típico, informa a Enap, é o dos municípios de São Paulo e do Rio de Janeiro, estados mais populosos do Brasil. O rendimento médio de cada habitante é o maior do país (R$ 1.504), porém os recursos não são divididos na mesma proporção entre a população. Isso faz com que o coeficiente de Gini – diferença entre mais ricos e mais pobres – também seja o maior de todos.

De forma geral, a pesquisa revela que quanto maior a renda, o desenvolvimento do município e o acesso à rede de esgoto e água encanada, menor a vulnerabilidade em relação à COVID. Quanto maior a desigualdade econômica da população, maior a vulnerabilidade à doença.

“Isso evidencia que a pandemia possui uma geografia própria, desenha seus próprios caminhos e contornos, cujas explicitações podem contribuir para nossas reflexões e análises”, esclarecem a autora e as coautoras da pesquisa, Janaina Lopes Pereira Peres, Camila Camargo, Lara Laranja e Luciana Guedes da Silva, pesquisadoras da Universidade de Brasília (UnB).

Maiores impactos

O pior cenário está em municípios com média de 27 mil habitantes: um universo de 459 cidades cujos indicadores socioeconômicos e territoriais as tornam mais vulneráveis aos efeitos negativos da pandemia do que a média do país.

Foram considerados indicadores como taxa de óbito e número de casos confirmados da doença. A taxa de óbito, nesse caso, foi de 39,8, isto é, a relação entre o número de mortes por 100 mil habitantes. Mais do que o dobro da média nacional, informa o estudo.

“A pesquisa é um retrato das desigualdades socioeconômicas no avanço da pandemia no país. Um retrato que representa um passado recente, mas aponta para o futuro, porque os resultados do estudo reúnem conhecimento suficiente para orientar estratégias e tomadas de decisões no setor público”, afirma Diogo Costa, presidente da Enap.

A pesquisa encontrou relação direta entre auxílio emergencial e incidência da covid-19: quanto maior a quantidade e o valor médio dos auxílios, maiores também são as taxas de casos e óbitos por 100 mil habitantes.

O município maranhense de Chapadinha está no grupo dos mais vulneráveis à COVID e outras vulnerabilidades. Foto: Reprodução.

A explicação das pesquisadoras é que, como os dois indicadores são de vulnerabilidade, o resultado mostra que a falta de recursos impacta na maior transmissão da doença e aumento dos óbitos.

A pesquisa dividiu os municípios em 7 regiões, considerando suas vulnerabilidades. Os mais afetados foram agrupados na região de número 2. Nesse grupo estão municípios como Chapadinha (MA), Nova Araçá (RS), Pimenteiras do Oeste (RO) e Vila Bela da Santíssima Trindade (MT).

Nessas cidades, 50% dos domicílios têm quartos compartilhados por mais de duas pessoas. São os locais com maior taxa de casos de COVID-19 e com a terceira pior posição no ranking de óbitos pela doença. Influenciaram negativamente o baixo acesso da população à água e esgoto, a densidade dos domicílios (muitas pessoas dividindo a mesma casa), dentre outros.

A pesquisa confirma que não é a renda — por si só — que interfere diretamente na disseminação do vírus, mas sim o conjunto de vulnerabilidades.

Risco

O tamanho da população dos municípios e a distância em relação às capitais também impactam no avanço da doença: cidades mais populosas e mais próximas das grandes cidades tendem a ter pior desempenho em casos e óbitos pela doença, informa o estudo da Enap no Caderno Cátedras COVID, que reúne artigos com estudos específicos sobre a doença no país.

“Se há algum esboço de consenso acerca da pandemia de COVID-19 é de que ela vem apenas revelar, agravar ou aprofundar uma crise a que já estamos expostos há muitos anos e que sua tragédia seria ainda maior sem os sistemas sociais de proteção vigentes no Brasil”, destaca o artigo.

A grande densidade de pessoas nos domicílios pode dificultar ou mesmo impossibilitar, em alguns casos, o atendimento às recomendações de isolamento e distanciamento social. No Brasil, pouco mais de 25% da população são de casas com densidade alta: mais de duas pessoas por dormitório. Nos municípios com população média aproximada de 27 mil habitantes, esse percentual chega a 50% de domicílios com quartos compartilhados por mais de duas pessoas, e esse dado parece se relacionar com a situação da pandemia.

Esses são os locais com maior taxa de casos e com a terceira pior posição no ranking de óbitos. O melhor cenário pode ser observado nos municípios que têm o menor contingente populacional (cerca de 7 mil habitantes): baixo registro de casos e de mortes por COVID.

Em relação ao IDH-M, que avalia educação, longevidade e renda, o agrupamento de municípios mais vulnerável também é o que congrega os que têm população média de 27 mil habitantes. Essas cidades ainda se destacam negativamente no quesito infraestrutura, porque mais de 37% têm abastecimento de água e de tratamento de esgoto inadequados (enquanto a média nacional é 9%).

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