Feminicídio

O “julgamento” nas redes sociais

O assassinato de Bruna Lícia Fonseca e de José Willian repercutiu em todas as esferas e suscitou, um ato contra o feminicídio em frente à Casa da Mulher Brasileira.

Reprodução

O primeiro caso de feminicídio em São Luís deste ano chocou a população e levantou uma onda de manifestações. Nas redes sociais as postagens demonstravam sentimentos de pena, de lamentação, de ódio, de vingança, de repúdio. O assassinato de Bruna Lícia Fonseca e de José Willian ocorrido no sábado, dia 25 de janeiro, repercutiu em todas as esferas e suscitou, na última quinta-feira, um ato contra o feminicídio em frente à Casa da Mulher Brasileira, organizado pelo Fórum Maranhense de Mulheres. e teve a participação do secretário de Segurança Pública, Jefferson Portela, da secretária da Mulher, Ana do Gás e de mulheres que fazem parte de movimentos sociais.

O secretário de Segurança Pública Jefferson Portela ressaltou que incitar a violência também é crime, seja qual for o meio de manifestação. O secretário destacou ainda, que o sistema de segurança do Estado combate efetivamente os autores de crimes de feminicídio, e que há uma rede de proteção às mulheres, com atendimento especializado às vítimas de violência. “Apelo às mulheres para que não esperem o estágio fatal de violência; que, diante de uma situação de risco ou ameaças, procurem os órgãos de defesa da mulher”, recomendou Portela.

Apelo às mulheres para que não esperem o estágio fatal de violência; que, diante de uma situação de risco ou ameaças, procurem os órgãos de defesa da mulher

Segundo o Departamento de Feminícidio, esse foi o primeiro caso na capital neste ano. Na tarde do dia 25 de janeiro, o soldado da Polícia Militar Carlos Eduardo Nunes Pereira, de 25 anos, assassinou Bruna Lícia e o suposto amante dela, José Willian, em um apartamento no Condomínio Pacífico I, no bairro Vicente Fialho, em São Luís.

O policial chegou no apartamento e encontrou Bruna e Jose Willian juntos no quarto. O PM declarou ainda que entrou em luta corporal com o casal, momento em que sacou a arma e atirou em ambos. Bruna Lícia foi sepultada no dia seguinte, em São José de Ribamar, região metropolitana de São Luís.

No domingo, tal a repercussão do caso, em que muitos afirmaram que a vítima teve o que mereceu (muitos desses posicionamentos foram postados em redes sociais), o Fórum Maranhense de Mulheres publicou nota de repúdio e classificou o feito como ato covarde. “A crueldade se faz mais monstruosa ainda em virtude da forma como estão sendo veiculadas matérias sobre o caso nas redes sociais. Grande parte delas destruindo a imagem da vítima, que passa a ser responsabilizada pela sua morte. Que é isso? Em que mundo estamos? Ainda estamos vivendo na idade média? Porque as mulheres continuam sendo vítimas desta cultura patriarcal que nos oprime e nos reduz a um órgão sexual que tem como finalidade apenas procriar e dar prazer aos homens, ao marido em especial. Bruna Lícia está sendo destruída na sua moral e na sua integridade de ser humano. Mesmo sendo violentamente assassinada, ainda assim, não está sendo vista com humanidade que todo cristão merece. Sua morte não lhe dá paz, sua morte é justificada por um possível adultério que teria praticado”, disse a nota.

Nas redes sociais

Com efeito, dentre um dos milhares de comentários que foram postados, um chamou a atenção e está sendo investigado: o do Policial Militar e assistente social Tiago de Jesus. Em um de seus comentários, Tiago afirmou que se as mulheres traírem os seus maridos poderão também morrer, assim como Bruna Lícia.

Em nota, o Conselho Regional de Serviço Social (CRESS-MA- 2ª Região) repudiou as declarações do mesmo ao incitar o ódio e estimular o assassinato de outras mulheres.

“A atitude do referido assistente social reforça apologicamente a naturalização do feminicídio que tem sua expressão máxima na perpetração do machismo, prática que ainda persiste no interior das relações sociais na sociedade brasileira em pleno século XXI, com expressões particularizadas na realidade maranhense que historicamente traz refrações do coronelismo e do patriarcado. Nós, assistentes sociais, lutamos contra todas as formas de opressão e exploração, e nos contrapomos veementemente contra esse adensado conservadorismo moralista, pró – fascista, genocida, que tem atacado e ferido a integridade física e moral de amplos segmentos sociais, dentre eles as mulheres desse país”, diz um trecho da nota, que termina declarando que está tomando as medidas cabíveis “para apuração do fato em conformidade com o arcabouço jurídico específico da profissão”.

A Comissão da Mulher e da Advogada da OAB/MA também se manifestou sobre o caso.

“O feminicídio é a triste consequência do machismo alicerçado na naturalização de comportamentos, que fazem pessoas acreditarem que diferenças sexuais respaldam superioridade de um gênero sobre o outro. A vida humana é feita de dissabores e escolhas. Violência não é solução, tampouco justificativa para as frustrações vividas. Diante tamanha atrocidade, não seremos complacentes com tamanho desrespeito à dignidade da pessoa humana e banalização da vida. Logo, repudiamos, de forma veemente, o ato brutal cometido pelo policial militar que tem direito à defesa e a um julgamento justo, assim como repudiamos todos os posicionamentos de culpabilização da vítima e que incentivam o julgamento e opressão do gênero”.

Violência contra a mulher

Segundo o Departamento de Feminicídio, em 2019 foram registrados 48 casos, e em 2018, 43.  O Boletim Social “Crimes violentos contra mulheres no Maranhão”, lançado pelo Instituto Maranhense de Estudos Socioeconômicos e Cartográficos (Imesc), na última sexta-feira, faz uma análise dos números de crimes violentos contra mulheres cometidos entre os anos de 2016 e 2018, e aponta que houve uma redução nos homicídios de 19,51%. “Tendo em vista que o feminicídio é uma tipificação específica do crime de homicídio, tanto no âmbito nacional como estadual, verifica-se que, mesmo com a redução dos casos de homicídios contra as mulheres, houve ampliação dos casos de feminicídio”, analisou Talita Nascimento, chefa de Departamento de Estudos Populacionais e Sociais do IMESC.

Mesmo com a redução dos casos de homicídios contra as mulheres, houve ampliação dos casos de feminicídio

No Maranhão, entre 2015 a 2018, observou-se uma redução de -22,5% no número de ocorrências de crimes violentos letais intencionais (CVLI) contra mulheres, que acompanhou a redução de 23,2% no total e CVLI (homens e mulheres) no mesmo período.

No mesmo período, a capital maranhense seguiu a tendência estadual de redução dos registros de CVLI, apresentando redução de 58,4% da taxa de crimes letais com vítimas mulheres, diz o boletim.  O secretário de Estado de Programas Estratégicos, Luis Fernando Silva, pontua que essa redução pode ser atribuída à intensiva política de prevenção e combate à violência implementação pelo Governo do Estado do Maranhão, a exemplo do Programa Pacto pela Paz e a Patrulha Maria da Penha.

Quanto à análise dos crimes violentos letais intencionais por bairros de São Luís, identificou-se um maior agrupamento dos casos, nos anos de 2017 e 2018, com vítimas mulheres nos bairros do Coroadinho, João Paulo, Liberdade e Cohab, além de focos de ocorrências em bairros da zona rural, como Rio Grande e Coqueiro.

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