17% dos casados no Maranhão têm até 19 anos
Maranhão faz parte de estudo sobre casamento infantil. No estado em 2016, das 24 mil uniões formais, cerca de 17% foram de meninas e meninos até 19 anos
Bebê, criança, pré-adolescente, adolescente, jovem, adulto, idoso… O ser humano passa por fases em sua vivência e cada uma delas com suas peculiaridades, características, saberes, aprendizados, responsabilidades. Quando algumas dessas etapas evolutivas são puladas, as consequências, principalmente as emocionais, podem até ser invisíveis, mas são profundas.O Brasil ocupa o quarto lugar no ranking mundial de casamento infantil de meninas, com 2,9 milhões de uniões precoces no total. Evasão escolar, gravidez precoce e responsabilidade pelo trabalho doméstico são as principais consequências das uniões indicadas no estudo Tirando o Véu, da Plan International Brasil (em parceria com a Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (FLACSO), realizado em Codó, no Maranhão e em mais quatro cidades baianas. O levantamento, que aprofunda causas e consequências do casamento infantil no país, foi apresentado na última terça-feira, em Salvador.
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Toda união, formal ou informal, em que pelo menos uma das pessoas tem menos de 18 anos é considerada um casamento infantil. Estima-se que 7,5 milhões de meninas se casem precocemente todos os anos no mundo. O Brasil está entre os cinco países da América Latina e Caribe com a maior incidência de casos. O número de casamentos e/ou uniões gerais no Brasil em 2016, foi de 1,09 milhão. Deste total, 137.973 incluíram meninas e meninos com até 19 anos, sendo que foram 28.379 uniões de meninos, contra 109.594 uniões de meninas. No Maranhão, também em 2016, do total de 24.824 uniões formais, 3.463 foram de meninas e 894 de meninos. Em Codó, dos 220 casamentos e/ou uniões gerais, 48 foram de meninas e 12 de meninos, com idades entre 15 e 19 anos.
O estudo fez uma investigação quantitativa nacional, para recolhimento de dados estatísticos, e uma investigação qualitativa local, com grupos focais na Bahia (Salvador, Camaçari e Mata de São João) e no Maranhão (Codó). Foram conversas com meninas casadas e não casadas abaixo de 18 anos, mulheres de 18 a 25 anos que se casaram adolescentes, meninos não casados, maridos que se casaram com adolescentes e famíliares.
A escolha por esses dois estados se deveu à combinação de critérios como: alto percentual de casamentos ou uniões de meninas adolescentes, figurando entre os dez estados com pior desempenho em 2015 (O Maranhão ocupa o décimo lugar, com 3.769 casos); características das cidades favorecem uma amostra representativa; presença da Plan nos dois estados, nas cidades citadas.
No total, foram realizadas 84 entrevistas semiestruturadas nacionais e locais e 30 Grupos Focais (GFs), que reuniram 218 participantes. Todos os dados de campo, tanto nacionais como locais, foram colhidos entre os meses de novembro e de dezembro de 2017 (amostra Bahia) e abril de 2018 (amostra Maranhão). “O que queremos com a divulgação deste estudo é descortinar o véu que encobre esse tipo de violação, que atinge em sua maioria as meninas que acabam vendo no casamento uma possível solução de problemas que enfrentam em suas famílias e na sociedade, como violência doméstica, violências sexuais e trabalho infantil”, disse Sara Oliveira, gerente de projetos da Plan International Brasil na Bahia. “Todos esses dados mostram que um alarmante número de meninas acabam em um casamento precoce para resolver problemas ou tentar uma vida melhor, mas acabam perdendo a essência da adolescência, tendo a infância roubada.”
Da perspectiva do estudo, pode-se afirmar que as meninas se casam com homens mais velhos, com maior instrução formal e melhores perspectivas econômicas, o que as coloca em posição de desigualdade, sujeitas a violências de gênero. As funções conjugais exercidas pelo casal são marcantes e simbólicas: o homem em posição de provedor, responsável por trabalhar e levar dinheiro e proteção à família, e a mulher no papel de cuidadora da casa e dos filhos. Também é importante destacar que todos os entrevistados, sem exceção, não gostariam que seus filhos e filhas se casassem antes dos 18 anos, quebrando o ciclo familiar que ainda se repete em muitas famílias, especialmente nas localizadas em áreas mais rurais.
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