Caso Samir Ewerton

Assédio: por que as mulheres silenciam?

O recente caso de vítimas de assédio que se uniram para denunciar o radialista Samir Ewerton levantou o debate nas redes sociais

Reprodução

“Ele foi claro, foi direto. Disse que eu deveria fazer sexo se quisesse a vaga e ainda comentou que isso era comum no meio, mas pediu que eu não comentasse com ninguém”, Carolina*, 38 anos, jornalista.

“Ele me olhou e eu retribui o olhar com um sorriso. Rolou essa coisa boba de quem tá começando a namorar, sabe? [risos]”, Raiane*, 22 anos, estudante de odontologia.

“Eu comecei a gritar quando ele puxou o meu rosto com força e me obrigou a beijar ele mesmo eu dizendo que não queria”, Jéssica*, 19 anos, estudante de direito.

Você consegue perceber a diferença entre esses três depoimentos? Há uma fronteira muito sutil que os separa: a diferença entre paquera e assédio. O recente caso do radialista Samir Ewerton, que teria assediado diversas mulheres, entre colegas de profissão e estudantes que se candidataram a uma vaga de emprego, fez levantar o debate sobre o assunto.

“Eu fiquei com muito nojo quando ele [Samir] me disse se eu quisesse ser contratada eu teria de sair com ele, pois ele já havia feito isso com outras mulheres, inclusive casadas, e que depois disso elas foram logo chamadas para a vaga de emprego”, desabafou a estudante de jornalismo, Milena*. Assim como ela, diversos depoimentos de mulheres que também foram assediadas começaram a ser divulgados na internet. “O sujeito me chama no Whatsapp tarde da noite e começa uma conversa no mínimo desconfortável, me assediando pela minha aparência e sugerindo que eu traísse meu marido”, conta outra vítima em suas redes sociais.

O tema é polêmico, está cada vez mais presente nas rodas de bate-papo e, principalmente no universo masculino, ainda é encarado com certo desdém. Há quem chame de “mimimi”, mas a verdade é que assediar e paquerar são ações completamente distintas.

É mesmo algo claro que identifica, de imediato, se aquele elogio é ou não invasivo e descabido: a permissão. “A paquera é quando há o consentimento, há a correspondência, de ambas as partes. O homem se aproxima da mulher ao perceber que é correspondido, e a mulher dá a ele essa liberdade. Já o assédio se configura quando o homem vê que não está sendo correspondido e ainda assim insiste ou já aborda a mulher de maneira incisiva, por vezes agressiva e violenta, pois acredita que ela não tenha condições de dizer se quer ou não. Ele tenta induzir a mulher a aceitar e, se não aceita, ele parte para a agressão seja verbal, com palavras injuriosas, ou até mesmo com ameaças”, esclarece a Delegada Kazumi Tanaka, coordenadora das Delegacias Especiais da Mulher (DEM) no estado.

Após a enxurrada de postagens denunciando o radialista, era grande a quantidade de comentários de julgamento às vítimas e de defesa do homem. “É isso o que acontece na sociedade machista, onde não só homens, mas também mulheres educadas num sistema patriarcal passam a enxergar no agressor possíveis justificativas para as atitudes por ele praticadas; além de buscarem nas vítimas possíveis razões para tenham sofrido as agressões”, explica a psicóloga especialista em comportamento, Joelina Abreu.

O limite da amizade

Para muitos homens, o discurso é basicamente o mesmo: “não existe amizade com mulher”. Para eles, essa “amizade” só existe quando o cara tem um certo interesse pela mulher. Saber diferenciar até onde vai o limite da amizade e onde começa a ser assédio é o que explica a delegada Kazumi: “Às vezes, a mulher dá uma liberdade no sentido de amizade, e o rapaz abusa dessa confiança que foi depositada nele. Aproveita, principalmente nessa época de carnaval, que ela esta sem o discernimento completo, porque bebeu demais e se permitiu a ficar com ele, ou ate mesmo teve uma relação sexual com ele.  Aí, se ele mantiver essa relação com ela estando fora de si, sem condições de expressar o seu consentimento, isso pode ser caracterizado como estupro, que é crime”.

Assédio no ambiente de trabalho

O assédio é um crime no Brasil desde 2001, quando ficou estabelecida a pena de detenção de um a dois anos. “O que se costuma sentir nessa hora é uma mistura de sensações desprazerosas que, dependendo do caso e da pessoa, já que cada uma tem um histórico próprio de vida, podem causar graves problemas emocionais”, revela a psicóloga Joelina.

Foi exatamente isso o que a jornalista Carolina*, de 38 anos, sentiu ao se deparar com a proposta indecente que recebeu do radialista Samir Ewerton. As sensações que Carolina teve foram da raiva à tristeza, além da decepção. “Eu me senti impotente, senti medo de denunciar, não soube o que fazer logo de imediato”, conta.

É considerado crime, de acordo com o artigo 216 A do Código Penal, quando a pessoa se aproveita do cargo exercido para retirar vantagem sexual de um subordinado. Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT),  em todo o mundo, 52% das mulheres economicamente ativas já sofreram assédio sexual.

“A mulher verificando que as perguntas direcionadas a ela em uma entrevista ou durante e convivência no trabalho não são comuns àquele ambiente e fogem do que era esperado, ela deve denunciar. Porque essa situação pode ser configurar um crime ou ainda que não, esse constrangimento tem repercussão nas esferas cível e trabalhista nas quais o acusado pode responder . Ela identificando essa situação, quando um superior ou recrutador exige dela favores sexuais em troca de ascensão profissional, ou então receba uma punição caso ela não ceda em aceitar um relacionamento com ele, tudo isso pode ser considerado assédio”, conclui a delegada.

*Os nomes usados na reportagem são fictícios 

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