Amor incondicional

Da fragilidade à luta: conheça histórias de mães de filhos com deficiências

Poliana Gatinho, Ana Claudia Arruda, e Liane Souza fizeram das dificuldades uma filosofia de vida em busca de direitos.

Ana Cláudia e seu filho João Gabriel. (Foto: Arquivo Pessoal)

“Mãe: substantivo feminino. Mulher que deu à luz, que cria ou criou um ou mais filhos. Fêmea de animal que teve crias ou que cuida ou cuidou delas”. Assim o dicionário define a palavra “mãe”. Mas, para os estudiosos, a definição vai muito além do sentido da palavra que o ser “mãe” representa dentro do universo humano. Só quem foi ou é mãe e carrega consigo o sentido inerente à maternidade que é parir e criar o filho para o mundo sabe o seu verdadeiro significado.

E foi por conta deste instinto maternal, que ultrapassa os limites do entendimento quando a mulher torna-se mãe de uma criança com deficiência, no qual aflora, na maioria das vezes, um amor incondicional, que O Imparcial conta neste Dia das Mães a história de Poliana Gatinho, Ana Claudia Arruda, e Liane Souza, mães com filhos com deficiência, que fizeram das dificuldades uma bandeira de luta e uma filosofia de vida em busca de direitos para outras mães e filhos que vivem em situação semelhante à vida delas. Para Ana Cláudia Arruda, que é professora, descobrir que seria a mãe de uma criança com deficiência não foi uma notícia fácil de receber. Ana Claudia, que é mãe de João Gabriel, que nasceu com microcefalia, revelou que seu principal receio foi o julgamento velado da sociedade por uma situação que não cabe escolha. “Primeiro vem o medo. Afinal, não sabemos o que o diagnóstico trará de consequências. O nosso olhar muda, a vida ganha outro sentido. Mas, depois, vem a força. A força, o amor incondicional. E é isso que nos impulsiona a ser melhor a cada dia, por ele”, disse ela.

Durante a sua trajetória materna de filho com deficiência, Ana Claudia contou ainda que, uma das grandes e maiores dificuldades que encontrou foi o preconceito, lamentando que infelizmente, ainda não tem como a sociedade superá-lo. “São pessoas que vêem  crianças com deficiência como pessoas doentes, ou com olhar de pena. E isso dói muito em uma mãe. Superar é não se importar com olhares curiosos e com o afastamento social que inevitavelmente ocorre. Não se importar com a opinião dos outros que não conhecem, não convivem e não sabem nada sobre preconceito e diferenças. Outras dificuldades são as financeiras, pois os tratamentos são bem caros, medicações, terapias e tentamos fazer o possível para que ele tenha o melhor, o que está ao nosso alcance”, revela.

Sobre o que aprendeu convivendo com o seu filho, João Gabriel, Ana Claudia revelou que abriu-se a uma diversidade de modos de uma vida desconhecida e que teve que aprender no cotidiano. “A luta diária pelo progresso dele é cansativa, sim. A maternidade não deve ser romantizada. Temos nossas dificuldades sendo mães típicas ou atípicas. Mas é superada ao ver meu filho se tornando um vencedor nos pequenos detalhes do dia a dia. Agradeço a Deus todos os dias pelo privilégio de ter sido a eleita pra receber esse filho especial e  juntos vamos caminhando, superando todos os obstáculos, descobrindo as pequenas e boas coisas da vida, construindo novos sonhos e vivendo intensamente cada dia como se fosse único”, contou Ana Claudia Arruda.

Luta pelos direitos da pessoa com deficiência

Liane Souza (mãe), Carlos Eduardo (filho) e familiares. (Foto: Arquivo Pessoal)

Ser mãe de uma pessoa com deficiência para Liane de Jesus Rabelo de Souza, pedagoga,  fundadora e diretora do Centro Dialético dos Pais e Amigos dos Especiais, e conselheira estadual dos direitos da pessoa com deficiência, também não foi fácil.  Mãe de Carlos Eduardo, hoje com 32 anos, nascido em 28 de outubro de 1988, transformou a sua vida em uma história linda de resistência, e, para isso o apoio da família foi muito importante para  ele vencer barreiras. 

Liane Souza fez uma viagem no tempo e contou que no dia do nascimento de Carlos Eduardo, conhecido como Dudu, ela passou o que muitas famílias passam por causa da negligência, imprudência e imperícia médica, que é a demora no parto. E foi isso que aconteceu com Carlos Eduardo, ao nascer. “Eu tive um rompimento uterino, pela demora do parto, essa demora causou uma anoxia perinatal grave, (faltou oxigenação no cérebro) passou alguns dias na incubadora, foi encaminhado para Apae pelo dr. Fernando Ramos, na época médico neurologista. Mas, eu só fui saber que ele teria alguns comprometimentos quando ele já tinha  dois anos, e foi muito difícil. Eu descobri o diagnóstico de paralisia cerebral em Brasília no Hospital Sarah Kubitcheck em janeiro de 1990 , me senti perdida, sem saber o que fazer, então eu e meu esposo Eduardo começamos a lutar pela vida do nosso filho. Já tínhamos um filho mais velho, Mário, que hoje está com 35 anos.  E nessa caminhada, que não foi fácil, não por ter um filho com deficência, não foi fácil porque em nosso caminho encontramos muitas pessoas maravilhosas, mas também pessoas que não viam que ali tinha uma pessoa, focavam na deficiência, não vendo nenhuma possibilidade, mas isso nunca nos impediu de lutar. A paralisia cerebral é uma condição neurológica que acontece antes, durante, ou depois do parto, com nosso filho foi durante o parto”, contou Liane Souza. 

Sobre as dificuldades que enfrentou, Liane Souza lembra que há 32 anos ter um filho com deficiência não foi nada fácil, porque naquela época ela achava que a culpa era do seu filho que não conseguia, e o olhar da sociedade para nossos filhos era de incapacidade, de “coitadinho”, “doentinho” então eu percebia que a dificuldade não estava no meu filho Carlos Eduardo, mas sim nas pessoas que não oportunizavam. E essa barreira, que é chamada de barreira atitudinal, é a maior barreira que ela e a sua família enfrenta até hoje.

Diante da situação, Liane Souza, ressaltou que teve que se reinventar para tornar o mundo de seu filho e de mães com histórias parecidas com a dela pudessem ter um ponto de apoio. “Percebi o quanto precisava mudar o meu olhar, não porque tive um filho com deficiência, mas porque todos têm direito de viver numa sociedade para todos. E digo que muitas mudanças aconteceram nesses 30 anos, através da nossa luta por uma sociedade mais justa, e nesse processo a família é fundamental. É na família que a criança com deficiência chega e tem que ser acolhida. E o grande passo que foi dado, começou por um Grupo de Pais do CDPAE – Centro Dialético dos Pais e Amigos dos Especiais. E quero aqui homenagear todas as mães do CDPAE, nesse dia das mães, que começaram essa história, junto comigo e Claudia Brandão, mãe de Ritinha, e hoje vemos a luta do Movimento da Pessoa com Deficiência através do Fórum Maranhense das entidades de Pessoas com Deficiência e Patologia. A nossa luta é histórica de resistência, essa foi a mudança em mim. Eu queria que todos experimentassem esse amor que tenho  por meu filho Carlos Eduardo, através de uma história que todos podem construir juntos, independente de qualquer característica, cada pessoa aprende e cada uma do seu jeito”, contou Liane, que é casada com Eduardo Henrique e é avó de Maria Cecília.

A descoberta do autismo do filho

Poliana Gatinho e seu filho João Lucas. (Foto: Arquivo Pessoal)

Já para Poliana Gatinho, turismóloga, mãe de João Lucas, criança autista de 5 anos de idade, descobrir que seria mãe de um filho com deficiência  foi a sensação mais complexa que já  teve na vida. “Eu senti medo, não sabia absolutamente nada sobre autismo e isso me dava uma sensação de impotência muito grande. Logo que recebi o diagnóstico do meu filho eu passei três dias e três noites chorando sem parar, duvidando da minha capacidade de ser mãe, me sentindo insuficiente pro tamanho do desafio que sabia que iria ter que encarar a partir dessa nova realidade”, contou Poliana Gatinho.

Em entrevista a O Imparcial, Poliana Gatinho revelou que a sua maior dificuldade foi conseguir trabalhar seus medos e passar a conviver com eles de uma forma que eles já não lhe travassem o caminhar pelo melhor para a vida do seu filho. “Hoje eu tenho muitos medos ainda: do preconceito que meu filho ainda pode sofrer, dele não ser compreendido, e de tudo que pode acontecer pelo capacitismo que ainda existe muito forte na nossa sociedade. A diferença é que hoje esses medos já não me travam mais, pelo contrário, eles são a minha mola propulsora para lutar todos os dias por uma sociedade mais justa, digna e inclusiva”, ressaltou a turismóloga.

Sobre qual o presente que  daria para a mãe de um filho especial, Poliana Gatinho afirmou que  gostaria de dar a outras mães que se encontram  nesta mesma situação a oportunidade de serem mais aceitas pela sociedade. “Gostaria de dar a todas uma vacina chamada aceitação. Amor de Mãe é incondicional e esse amor não se explica, só é pra amar , amar e amar. Quero dizer às mães que estão recebendo o diagnóstico do autismo de seus filhos agora que: o diagnóstico é um ponto de partida, seu filho é uma pessoa, ele não é um pedaço de papel ditando tudo que ele pode ser, ele simplesmente é o teu filho e pode ser tudo que puder, quiser e tiver que ser e quando as dificuldades te desafiarem, olhem bem fundo nos olhinhos brilhantes deles e se conectem a eles através da força mais potente e transformadora que Deus deixou na Terra: AMOR DE MÃE”, finalizou.

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