MARANHÃO

Relembre os altos e baixos dos carnavais de antigamente em São Luís

A elite fazia o seu carnaval com cordões que percorriam poucas ruas da cidade e se reuniam no Teatro São  Luiz, hoje Teatro Arthur Azevedo, onde acontecia o tradicional baile

Reprodução

O Carnaval maranhense teve  origem do século XVIII e, a exemplo do resto do Brasil,  com seus folguedos importados  das terras europeias, daí que as festas eram animadas por músicas oriundas da Checoslováquia como a polka; a quadrilha, da França, mazurca e outras. Tudo vindo para o Brasil com  a chegada da Corte Portuguesa, em 1808 e  logo absorvidas no Rio de Janeiro e depois Brasil a fora até chegar a São Luís.

O historiador regional Ananias Martins, afirma no seu livro Carnavais de São Luís: “ Antes dos bailes se tornarem moda após a segunda metade do Século XIX, a elite ficava muito confinada às suas residências, poucos iam às ruas, pois tinham servos para todos os fazeres”.

A elite fazia o seu carnaval com cordões que percorriam poucas ruas da cidade e se reuniam no Teatro São  Luiz, hoje Teatro Arthur Azevedo, onde acontecia o tradicional baile. Até  em 1811 observava-se  pouco divertimento para a classe dominante. Conforme Ananias Martins, eram  os escravos e pobres que se manifestavam festivamente nas ruas , comemorando dias de santos e tocando seus tambores de forte expressão em São Luís.  Daí, supor-se que, com o passar do tempo. cedeu lugar para a  consagrada a tradição do Tambor de Crioulas.

O entrudo no carnaval

Os carnavais de Entrudo considerado por alguns como violento, mas que envolvia toda a gente da cidade. Os grupos de entrudo atacavam os passantes, indistintamente, jogando-lhes água, tintas e outros líquidos que lhes sujavam as vestes, situação amenizada, anos mais tarde com a invenção do líquido Sangue do Diabo, visto que a tinta, depois de lançada,  logo desaparecia.

O entrudo foi praticado desde os tempos coloniais e reprimido a partir da segunda metade do Século XIX, dando lugar a outro tipo de entrudo com ênfase para a maisena que até hoje faz parte das brincadeiras nos bairros da cidade, com os foliões jogando-se, mutuamente, o amido de milho mais conhecido do Brasil.

Muitas brincadeiras desapareceram com o passar do tempo, como o bloco do Urso, Chegança, Congos, Caninha Verde, cordões de Baralho, Dominós, Cruz Diabos, Pierrôs, Arlequins e outras. Os fofões perduram, porém em pequenos grupos ou solitariamente, não mais em cordões.

Evolução da folia

O Carnaval maranhense evoluiu a partir da segunda metade do século XX  e atingiu seu ponto alto nos anos noventa, quando chegou a ser considerado o terceiro carnaval do Brasil, cujo critério para tal denominação, nunca foi esclarecido. O período de sua decadência se deu com a sua  carioquização e baianização, com a implantação do carnaval de passarela, no mesmo estilo do Rio de Janeiro, guardando-se as necessárias proporções, nunca atingiu o nível de luxuosidade, por falta de investimento por parte do poder público ou de empresas locais. As agremiações maranhenses não contam com os recursos dos bicheiros ou de  outras fontes nada ortodoxas.

Criou-se então o concurso das escolas de samba e outros folguedos,  mas, o concurso polariza-se entre as maiores agremiações  como Flor do Samba, Turma do Quinto, Favela do Samba, Unidos de Fátima e Turma de Mangueira etc. As de menor porte não saíram, do papel de coadjuvante, embora que em algum momento surpreendam  as maiores e conquistem o concurso oficial.

Assim, o Carnaval maranhense se dividiu em três: o de passarela com os desfiles  das Escolas de Samba, Blocos tradicionais, blocos afros com forte tendência para o reggae e danças de estilo afro, criadas pelos seus coreógrafos e com músicas autorais. O Carnaval de Rua com seus blocos de sujos, de fofões, das charangas e outros das mais diversas etiologias.

A baianização do Carnaval maranhense se deu com a introdução do Axé, muito popular em Salvador-Bahia,  que invadiu a região litorânea da ilha com seus trios elétricos das bandas baianas que se celebrizaram executando somente músicas do seus estilo e criadas pelos seus compositores, virando febre entre os mais jovens.

Teve vida efêmera, visto que contava com o apoio oficial e atendia a interesses de grupos da mídia nacional, política local e empresarial, que viam nas organizações destes eventos, um excelente nicho de negócio. Assim como chegou se acabou como num passe de mágica.  O Axé, no entanto,  resiste ainda nas cidades do interior do estado, sob o patrocínio dos prefeitos que  contratam bandas baianas, em detrimentos dos músicos maranhenses, para o carnaval local.

Os desfiles dos trens elétricos chegaram ao fim na capital,  e Isso se deve a movimentos desenvolvidos pelos atores culturais, jornalistas e intelectuais da terra, que resolveram abrir guerra contra a descaracterização do carnaval maranhense, destacando-se o Bairro da Madre de Deus, um dos que reagiram bravamente contra a descaracterização do Carnaval de São Luís. A baianidade saiu de cena mas a carioquização continua no carnaval de passarela, notadamente nos desfiles das escolas de samba.

Estas que tiveram origem nas turmas de sambas existentes nos bairros periféricos da capital maranhense, com destaque para o bairro cultural Madre de Deus, onde haviam muitas turmas como Cruzeiro do Samba, Cadete do Samba, Turma do Quinto e outras. Turma de Mangueira, no João Paulo. Marambaia e  Correio do Samba que virou Unidos de Fátima em alusão ao bairro que lhe emprestou o nome, outrora Cavaco, hoje Bairro de Fátima. Marambaia virou escola de samba e continua resistindo. No Matadouro, hoje Bairro da Liberdade, haviam Imperador do Samba, Duque do Samba, e Liberdade do Samba, Maracatu do Samba, Salgueiro e outros já extintos. A influência carioca foi tão forte que as próprias mudaram o seu toque tradicional. Hoje o bloco Fuzileiros da Fuzarca, o mais antigo, fundado em 1936, é que mantém a sua batucada tradicional. O bloco recebeu este nome em face de na época, estar em cartaz, o filme Os Fuzileiros, no Cine Rialto, existente à época, na Rua do Passeio , e no momento da escolha do nome do bloco, um dos participantes sugeriu o acréscimo  de Fuzarca, na denominação.

O blocos

Os blocos afros foram inspirados nos grupos congêneres do estado da Bahia, sendo o Akomabu o primeiro do Maranhão, por iniciativa do Centro de  Cultura Negra – CCN, objetivando levar para a população a mensagem da raça nesse formato,  com brincantes fantasiados em  roupas com indicativos tribais africanos, para lembrar suas origens e consagrar a sua luta pela dignidade do povo negro. Depois, em 1990, surgiu no Bairro de Fátima, o bloco Abimimã, com batuque mais forte e defendendo os mesmos propósitos.

Os blocos alternativos também ocupam espaço destacado no carnaval, geralmente formados nas comunidades e se apresentam tocando músicas  tradicionais ou autorais, destacando-se entre tantos, o Bicho Terra, da Madre de Deus, com brincantes fantasiados de bichos.

Os blocos organizados se apresentam com foliões fantasiados de forma padronizada e animados por uma bateria e com um enredo para suas apresentações.

Os blocos tradicionais surgiram no carnaval, na primeira metade do Século XX, e inicialmente foram conhecidos como  Blocos de Tambor Grande ou Blocos de Ritmos, em virtude de sua cadência rítmica e utilização de grandes tambores confeccionados com madeira compensada  e cobertos com couro, chamados de contratempo. Os blocos contam também, em suas baterias,  com instrumentos de percussão como retintas, cabaças, reco-recos, ganzás, afoxés e agogôs.  Os blocos tradicionais se destacam também, pelo esmero na confecção de suas fantasias, geralmente muito luxuosas, e sambas autorais bem elaborados.

Os Corsos

Os corsos foram também muito tradicionais no nosso carnaval. Eram carros ornamentados e que levavam jovens mulheres com fantasias padronizadas e animadas por uma banda com instrumentos de sopro tocando músicas  da época.

Percorriam as ruas da cidade e o chamado circuito carnavalesco que se  estendia da Praça Deodoro, Rua do Sol, Praça João Lisboa, Rua Grande , Rua do Passeio e Praça da Saudade. As participantes atiravam confetes, serpentinas e lança-perfumes nas pessoas que permaneciam nas portas de suas casa, para ver os corsos passar. Estes corsos desapareceram do carnaval maranhense e o único congênere que resiste é a Casinha da Roça, criada em 1946, por Emídio França que possuía uma oficina de montagem de carrocerias no Monte Castelo. A alegoria até os tempos atuais é  montada na carroceria de um caminhão com varas e palhas, no estilo das casas da zona rural do interior.

Ali são expostos os produtos da culinária interiorana e a animação fica por conta de um tambor de crioulas. A Casinha da Roça é ornamentada por cofos, meaçabas, peixes secos, animais vivos em gaiolas de madeiras, arapucas. Mulheres quebram coco babaçu,  fazem comida, peneiram arroz e outras atividades próprias do trabalho rural.

Carnaval de clubes

O Carnaval virou festa popular mas não perdeu a pose e foi recebido com honras e glórias nos salões dos clubes sociais como Casino, Jaguarema e Grêmio Lítero Recreativo Português, hoje já extintos, com exceção do Litero, que ainda resiste, graças ao empenho do jornalista e advogado Carlos Nina, seu presidente, e de alguns associados que nunca deixaram o clube.

Os bailes nestes clubes sociais eram de grande pompa, com toda sociedade presente. Estes clubes realizavam concursos de fantasias, nos quais participavam pessoas da sociedade e outros ligados à cultura com destaque para o colunista social, estilista e carnavalesco Chico Coimbra.  Mas haviam outros clubes que eram frequentados pela classe média como o Clube dos Sargentos,  Califórnia Clube de Campo, Montese, União Recreativa da Boa Vontade – URBV  e outros.

Para os mais jovens (crianças e adolescentes) o empresário Moisés Tajra criou um vesperal no mezanino do Cine Eden, de sua propriedade, na Rua Grande.

Bailes de máscaras

Na década de 40 a 50, surgiram em São Luís os chamados bailes de máscaras que eram os bailes populares nos quais as mulheres tinham que estar mascaradas para poder frequentar. A cada ano recebiam denominações diferentes como Gruta de Satã, do conhecido Moisés; Bigorrilho, do Dutra; Colombina, Vassourinha, Berimbau, Jovem Guarda, comandado pelo empresário Raimundo Nicomedes, conhecido como “Mundiquinho”,  sempre na  Rua Senador João Pedro, próximo  ao canto da Fabril.

Estes bailes eram muito frequentados, visto que, sem serem identificadas, as mulheres da classe média e alta, ali se faziam presentes sem o risco de serem alvos de comentários dos fofoqueiros de plantão. Entretanto, as mulheres pobres, da periferia, eram predominantes.

Eram mulheres donas de casa, operárias das fábricas, trabalhadoras,  mulheres que se permitiam a participar de forma desinibida sem terem seus valores morais afetados. Ali conviviam com as profissionais do sexo e até se deixavam levar por  alguma aventura que chamavam “amor de carnaval”,  que era efêmero, sem responsabilidade, mas que resultou em muitos casamentos.

Foram tempos áureos do carnaval, onde o clima era de muita alegria, conforme avalia o jornalista/radialista Antonio Moreno, baseado no seu trabalho como radialista e cronista carnavalesco.  Estes clubes atraiam foliões do Centro e dos bairros dos subúrbios da cidade. Os bailes de máscaras não sofreram o processo de decadência e o seu fim se deu por decreto, em 1965, pelo então prefeito Epitácio Cafeteira, que determinou o fim destes bailes. Os motivos que o levaram a tal atitude, até hoje, não foram plenamente esclarecidos e tal determinação resultou em pilhérias por parte de alguns comunicadores e serviu de inspiração para o maestro João Carlos Nazaré, que lançou sua marchinha com o refrão “ Cafeteira não quer máscara neste carnaval”.

Apesar dos seus altos e baixos, o carnaval do Maranhão continua  pleno e se constitui em uma das principais  festas populares do estado. Porém, em face da pandemia de Coronavírus, que assola  o mundo e que matou milhares de maranhenses, o Governo do Estado deverá cancelar todos os eventos relacionados ao carnaval em 2021.

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