Produtores e artistas maranhenses opinam sobre mudanças na Lei Rouanet
Novas regras anunciadas pelo governo federal geram expectativa positiva na classe artística local
Quem trabalha com projetos incentivados sabe a saga que é, depois da aprovação do projeto, para conseguir patrocinador. Encontrar uma empresa disponível a investir em um projeto é um dos maiores entraves para produção cultural, ainda mais quando se trata de produções das regiões Norte e Nordeste. Com as novas regras anunciadas pelo governo federal sobre a Lei Federal de Incentivo à Cultura, antes conhecida como Lei Rouanet, a classe acredita estar mais perto de conseguir ultrapassar os limites antes dominado pelo eixo Rio-São Paulo. Conversamos com alguns produtores locais que, em sua maioria, aprova as mudanças.
As medidas alteram os limites de projetos financiados, a distribuição geográfica dos recursos e criam exceções para algumas categorias de incentivos. O teto dos projetos financiados foi reduzido de R$ 60 milhões para R$ 1 milhão. O máximo que uma empresa pode financiar na modalidade incentivada cai de R$ 60 milhões para R$ 10 milhões.
As mudanças preveem um foco maior nos estados para além do eixo Rio de Janeiro-São Paulo. Foram introduzidas novas exigências, como a ampliação do percentual de ingressos gratuitos, que deverão ser assegurados entre 20% e 40%.
Para o artista, produtor cultural e presidente da Benta Produções, Silvério Jr., as mudanças foram bem vindas principalmente quando se trata das produções do eixo Norte-Nordeste. “Primeiro a mudança do teto. Não sei se atingiu em cheio as grandes produções que vemos muito no sul e sudeste. Para as regiões Norte e Nordeste tivemos algum benefício, porque nossos projetos são um pouco mais modestos, e que esses números vultuosos não fazem muita diferença. O que impacta mais é a questão do fomento, da captação, porque projetos a gente tem para se adaptar a esse novo patamar de valores. O grande problema nosso aqui é a captação junto às empresas, porque projetos bons a gente tem”, opina.
Para o cantor e curador do Lençóis Jazz e Blues Festival, a principal mudança foi mesmo a diminuição do teto, mas que não impacta muito nos projetos que saem das regiões Norte e Nordeste. “A gente não consegue captar nem 500 mil imagina 1 milhão, imagina 60 milhões. Esse recurso apesar de ter diminuído, não chegava pra gente. Então acredito que agora, por terem menos recursos, essas empresas vão ter que destinar par pequenos e médios projetos. Acho que vai melhorar um pouco a nossa vida, democratizar os recursos, apesar de ter diminuído, pelo menos é o que a gente espera. Acho que foi uma mudança boa. A gente não precisa de muito dinheiro, precisamos do mínimo pra fazer uma coisa que a gente já faz”, atesta o artista.
Acostumado a trabalhar com produção e captação, o jornalista e produtor cultural Zema Ribeiro disse que as alterações anunciadas pelo governo Bolsonaro são inócuas. “Uma maquiagem a disfarçar coisas que já existiam. O teto de projetos afetará grandes projetos e projetos com duração continuada, casos de orquestras etc. A maior parte dos projetos aprovados, sobretudo no Norte e Nordeste não chega ao teto anunciado agora, de 1 milhão. A Lei sempre se chamou Lei de Incentivo à Cultura, Rouanet sempre foi um apelido, dado em reconhecimento a seu idealizador, Sérgio Paulo Rouanet, importante intelectual brasileiro, Ministro da Cultura no governo Collor. A paralisação na Ancine com a questão das prestações de contas e a extinção do Ministério da Cultura são retrocessos inéditos e inaceitáveis e afetam toda uma cadeia produtiva que movimenta grandes cifras e gera milhões de empregos. No fim das contas é um governo de despreparados agindo sobre temas aos quais não têm a menor afeição ou conhecimento. Há um discurso de criminalização de artistas supostamente ligados ao PT ou de esquerda, em que supostamente a “mamata” acabaria com essas mudanças. Mas artistas como Chico Buarque, Caetano Veloso e Gilberto Gil, para citar uns poucos de carreira consolidada, em nada serão afetados”, opina.
A produtora Cássia Melo, gerente do Grupo Oito, afirma que gostaria muito que essa mudanças também impactassem na questão da descentralização. “Eu que já trabalho há mais de 20 anos com a Lei Rouanet, vejo de maneira positiva que o teto caia mesmo de 60 milhões para 10 milhões por empresa. Eu acho esse teto abusivo, a gente que produz no Norte e Nordeste, e eu que venho de uma experiência de Rio e São Paulo, tenho plena convicção que vão se quebrar carteis e máfias dessa lei que estão instaladas nessas cidades, a sua maioria produtores que em conchavo com empresas privadas, trabalham de maneira muito nebulosa a questão da lei de incentivo e acaba sujando o mercado. A gente precisa dividir melhor e reduzir esses limites usados pelas empresas de Rio e São Paulo e distribuir para o todo o Brasil. Sobre o aumento das distribuições dos ingressos gratuitos, acho muito justo, porque a gente está falando de um dinheiro que é de verba pública e que deve beneficiar a pessoa que não tem acesso à cultura”, pontua.