O medo de andar de ônibus em São Luís
Em apenas dois dias ocorreram quatro assaltos na Grande Ilha de São Luís com desfechos graves.
“Já fui assaltada em coletivo uma vez, em 2017, o ônibus estava na Avenida dos Franceses, um pouco antes da rodoviária. Mas já presenciei 8 assaltos. Em um deles, em março de 2019, um senhor tentou convencer o bandido a não assaltar, mas infelizmente, ele levou um tiro na cabeça e morreu na hora. O ônibus estava na avenida Getúlio Vargas (no ônibus que fazia linha para o Santa Clara). Lembro que o som do tiro foi quase ensurdecedor e lembro também da quantidade de sangue. Na hora do tiro, todos os passageiros se abaixaram e após a fuga do bandido todos saíram muito assustados de dentro do ônibus e eu só consegui sair porque um colega me tirou. Eu fiquei paralisada”. O relato é da estudante de Administração Anna Karollynne Pereira, de 20 anos.
O medo veio acompanhado de uma sensação de frustração e impotência. “Como pode estarmos tão vulneráveis? Era esse meu pensamento. Não sinto segurança ao andar de coletivo, no entanto, é o único meio que tenho de locomoção. Eu ando muito desconfiada. Já perdi a conta de quantas vezes desci do ônibus por ter alguém que me passa um certo medo. E todas as vezes que passo nesses locais é impossível não lembrar”, contou Anna Karollynne.
Luciana Araújo, hoje com 19 anos, conta do primeiro dia que andou de ônibus, 19 de janeiro de 2019. Nesse dia, na sua estreia, ela foi assaltada.
“Foi horrível, a primeira vez que fui andar de ônibus, tava empolgada até, achando que tava independente e tal… Peguei um ônibus no terminal da Praia Grande para ir pro Angelim. Não tava com celular na mão, nem nada, daí quando chegou no Monte Castelo, dois caras entraram, um passou e o outro ficou na frente. Saíram pegando o celular de todo mundo, a renda do ônibus. Foi horrível, carrego esse trauma até hoje”, contou ela.
O fato, é que a onda de violência deixa a população, usuária de transporte coletivo, com medo diário de andar em ônibus. Passageiros e trabalhadores relatam o temor de ter que se deparar com essa situação que acontece cotidianamente, pois se sentem vulneráveis a ações criminosas.
Cobrador de um coletivo que faz linha para a Cidade Operária, o trabalhador, que pediu para não ser identificado, diz que a vida nesse trabalho é um risco constante. “Já presenciei 5 assaltos desde que trabalho como cobrador, mas tem colega meu que já passou por muito mais situações dessas. Em alguns dos assuntos, as abordagens são muito violentas. Vi gente sendo ferida, apanhando, é um terror, mas a gente precisa trabalhar, né? É sair de casa e pedir proteção para que nada grave aconteça”, disse o trabalhador.
Os relatos acima são apenas de algumas das centenas de vítimas diárias de assaltos a coletivos na Região Metropolitana de São Luís. Em apenas dois dias ocorreram quatro assaltos na Grande Ilha de São Luís com desfechos graves.
De acordo com a Secretaria de Segurança Pública, neste ano, até 18 de maio, já são 506 roubos a coletivos na Grande Ilha, o que dá uma média mensal de 101 assaltos. Em todo o ano passado, 1.608 coletivos foram assaltados.
Na quarta-feira passada, dia 18, houve duas ocorrências. Em uma delas, a passageira Regina Rodrigues perdeu a vida, ao se jogar do coletivo para fugir do assalto que acontecia no ônibus em que ela estava (Paranã/São Francisco).
Em outra ocorrência, o motorista Igor dos Santos, que fazia a linha Santa Clara/João Paulo, reagiu a um assalto, entrou em luta corporal com o assaltante e levou várias perfurações de faca. O motorista foi atendido e teve alta. Já o assaltante, fugiu e foi preso no dia 19, no residencial Nova Terra, em São José de Ribamar.
Na quinta-feira, 19, durante o dia, o passageiro Wellington Rosa da Silva, reagiu a um assalto no coletivo que faz a linha Coqueiro, em Pedrinhas (zona rural de São Luís). Ele acabou levando um tiro, não resistiu ao ferimento e faleceu.
No mesmo dia à noite, uma mulher foi levada refém durante a ação de um assalto ao ônibus Circular I, na Av. Vitorino Freire.
Ela foi levada para que os bandidos pudessem fugir, e somente foi encontrada pela polícia na madrugada de sexta-feira (20), no bairro Estiva, próximo a BR-135, na zona rural de São Luís. Segundo informações, ela foi mantida refém por quatro homens desde o assalto. Três receberam prisão preventiva, o outro, até então, estava foragido.
Autoridades planejam ações preventivas
De acordo com a Secretaria de Estado da Segurança Pública (SSP), devido a esses recentes ataques, houve intensificação das ações diárias em combate a assaltos a ônibus na Região Metropolitana de São Luís.
Ainda, segundo o órgão, todos os batalhões operacionais da Polícia Militar estão realizando policiamento ostensivo e dando continuidade a Operação Catraca, voltada para enfrentar crimes em coletivos.
“O objetivo é proporcionar mais segurança aos usuários de transporte coletivo, vans, transporte alternativo, por meio de abordagens. Essa operação é desenvolvida em toda a Região Metropolitana. É realizada manhã, tarde e noite, diuturnamente, visando proporcionar mais segurança para os usuários desse tipo de transporte”, informou Cláudio André, tenente-coronel da PM.
De acordo com o órgão, em fevereiro de 2021 foram registrados 101 assaltos, enquanto no mesmo período em 2022, houve uma queda de 5 ocorrências, contabilizando 96 assaltos. Já na comparação de março, a queda foi de -11, de 124 assaltos em 2021, caiu para 113 no referido mês do corrente ano. “Em abril, houve a maior redução no número de roubo a coletivos na Grande São Luís. A redução foi de 134 para 115, uma diferença de 15%.
no número de roubo a coletivos”, informou a SSP.
Em suas redes sociais, o prefeito de São Luís Eduardo Braide informou que os secretários municipais de Transporte e de Segurança participaram de reunião na noite do dia 19 na Secretaria de Segurança do Estado, para garantir ações imediatas em relação à segurança no sistema de transporte público.
Da reunião ficou acertado que: A SMTT informará ao Estado as rotas de ônibus com maior índice de assaltos; a Polícia Militar intensificará as operações de fiscalização nos ônibus; a Polícia Civil vai agilizar as investigações dos casos ocorridos; A SEMUSC dobrará o efetivo da Guarda Municipal nos terminais de integração.
O Sindicato dos Rodoviários do Maranhão por sua vez, informou foram expedidos e encaminhados ofícios para os órgãos envolvidos, principalmente, a Secretaria de Segurança Pública, para que essa prática seja combatida com mais rigor em toda a Grande São Luís.
“Diante desta situação, o Sindicato dos Rodoviários do Maranhão alerta que se a insegurança dentro dos coletivos continuar, todos os rodoviários cruzarão os braços e o sistema de transporte público em São Luís irá parar, até que o serviço volte a ser seguro para trabalhadores e usuários”, informou o Sindicato.
Assaltos a coletivos
2021
- Janeiro – 104
- Fevereiro -101
- Março – 124
- Abril – 134
- Maio – 129
- Junho – 115
- Julho 171
- Agosto – 178
- Setembro – 167
- Outubro – 115
- Novembro – 148
- Dezembro – 122
2022
- Janeiro – 119 (15)
- Fevereiro – 96 (-5)
- Março – 113 (-11)
- Abril – 115 (-19)
- Maio – 63*
*Primeira quinzena de maio deste ano