LENÇÓIS MARANHENSES

Órgãos afirmam que festa de réveillon em Atins não obteve todas as licenças

Segundo Secretaria de Meio Ambiente, evento foi multado por ter sido feito à revelia do governo do Maranhão; Superintendência do Patrimônio da União também vai autuar

Foto: Reprodução / Mareh Music

É o sonho de muita gente curtir uma festa de réveillon em local paradisíaco e ver o primeiro nascer do sol do ano em um cenário de beleza única. É o caso da Vila de Atins, nos Lençóis Maranhenses, que recebeu a festa eletrônica Mareh Nye 2019 entre os dias 26 de dezembro e 2 de janeiro. O evento levou à região cerca de 300 pessoas por dia e contabilizou 600 na noite mais cheia. Este último número corresponde a mais de um terço da população da vila e de três comunidades do entorno, que somam 1,5 mil habitantes.

Esta área é dividida por duas Unidades de Conservação da União que não podem receber eventos desse tipo. Uma delas é o Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses (PNLM) e a outra é a Área de Proteção Permanente (APA) dos Pequenos Lençóis.

O órgão responsável pelo manejo e uso de Unidades de Conservação é o Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio), que indeferiu no dia 31 de outubro o pedido feito pela organizadora da festa, a empresa Mareh Music, de realizar o evento em região de proteção ambiental.

Segundo a nota técnica do órgão, o local onde se pretendia realizar o evento é área pública da união não regularizada. “Tratando-se de evento cultural noturno em período de ano novo, há de se considerar que haverá consumo de bebidas alcoólicas e produção de som ambiente. Considerando que o evento será para 500 convidados, haverá privatização temporária do espaço público, com cobrança de ingresso e restrição de acesso à terceiros durante o evento”.

A nota ainda diz que o projeto do evento prevê que, devido à direção do vento, os moradores do povoado Atins não seriam perturbados. “Entretanto, devemos levar em conta os impactos decorrentes da poluição sonora sobre a fauna do PNLM. Todo e qualquer som ambiente produzido no local do evento será direcionado ao interior do PNLM, gerando poluição sonora e podendo afetar espécies da fauna que se estressam com ruídos altos”.

O ICMBio ainda demonstrou preocupação com o fato da festa abrir um precedente na região. “Se for possível autorizar o evento em questão, outros eventos semelhantes também poderão ser autorizados. Desta forma, o potencial impacto à unidade se repetiria toda vez que alguma produtora desejasse realizar evento cultural no PNLM”.

Acesso negado

Com o pedido indeferido pelo ICMBio, a produtora Mareh Music passou a procurar uma área fora das Unidades de Conservação para realizar dois dos seis dias de evento. A Ilha de Cuba, um banco de areia em frente à praia de Atins, foi escolhida. A empresa, em resposta por email, explicou que “houve apenas consulta ao ICMBio, que atestou que a área escolhida fica fora do limite do parque e o evento não oferecia nenhum risco ao parque e ou sua fauna e flora”.

Está é a Ilha de Cuba. A linha vermelha representa os limites do Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses. Ao lado está o local da festa (Imagem: ICMBio)

Quatro dias de festa aconteceram na praia de Atins e dois na Ilha de Cuba. Questionada sobre quais licenças foram emitidas para realização do evento, a Mareh Music respondeu: “Licença provisória de funcionamento do bar da praia 9bar já existente, que foi arrendado, e licença para execução de evento (este com aval das secretarias responsáveis incluindo a de meio ambiente)”. As secretarias referidas são do município de Barreirinhas.

No entanto, segundo a Superintendência do Patrimônio da União (SPU), no aspecto patrimonial a empresa Mareh Music não apresentou pedido de permissão de uso para realização do evento. “O pedido teria que ser protocolado com antecedência de 30 dias. Estamos adotando as providências quanto ao Auto de Infração”, afirmou o chefe da Divisão de de Controle de Utilização do Patrimônio da SPU, Ribamar Silva.

Em resposta, a Mareh Music afirma que entrou sim em contato com a SPU, que ficou de dar retorno.

Segundo confirmou a própria empresa da festa à reportagem de O Imparcial, os ingressos começaram a ser vendidos antes mesmo de haver a definição do local de realização. Em setembro, antes do indeferimento emitido pelo ICMBio no fim de outubro, dois lotes da festa já haviam esgotado. Conforme escreveu a Mareh Music, “esperamos o máximo a fim de contentar os moradores que estavam preocupados com o possível barulho”.

Frente a esse cenário, a Associação de Moradores para o Progresso do Atins (APPA) protocolou junto ao Ministério Público Federal, em novembro, uma denúncia sobre o caso.

Festa não teve autorização do Estado do Maranhão e foi multada

Contatada pela reportagem, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente (SEMA) afirmou que não houve consentimento para realização do evento.

“Em relação a festa de réveillon ocorrida em Atins, a empresa executou a atividade à revelia da Secretaria de Estado de Meio Ambiente, razão pela qual foi imediatamente penalizada com um Auto de Infração Ambiental”.

“No que diz respeito a emissão de autorização de festas e eventos, o município de Barreirinhas possui habilitação e competência para a expedição de autorização. Entretanto, como o evento foi realizado na APA dos Pequenos Lençóis, necessitaria, no mínimo, de uma autorização emitida pela SEMA, o que não aconteceu. Em razão disso, foram responsabilizados”.

Segundo a secretaria estadual, está em trâmite o processo administrativo de responsabilização ambiental das produtoras responsáveis pelo evento, sendo que o Auto de Infração ainda pode ser agravado. Haverá também o encaminhamento de uma equipe até a localidade onde foi realizado o evento e dependendo do diagnóstico de eventuais impactos ambientais e a biodiversidade local, serão obrigadas à reparação e recuperação do Ambiente.

A empresa Mareh Music afirmou que não houve nenhuma orientação sobre a necessidade de aval da SEMA.

Confira na íntegra as respostas da empresa Mareh Music

No dia 31 de dezembro, antes da reportagem ter acesso aos posicionamentos da SEMA e SPU, O Imparcial enviou questionamentos à representante da Mareh Music, que foram respondidos no dia 9 de janeiro e podem ser lidos na íntegra abaixo.

O Imparcial – Como diz a matéria, é verdade que a venda de ingressos começou a ser feita antes de haver um local definido para a festa?

Mareh Music – Sim é verdade. Esperamos o máximo a fim de contentar os moradores que estavam preocupados com o possível barulho;

O Imparcial – Qual foi o público total do evento, somando todos os dias? E a média de público diário?

Mareh Music – 600 pessoas no dia mais cheio. 250 a 300 media.

O Imparcial – Quais foram os requisitos ambientais para obtenção das licenças?

Mareh Music – Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos (PGRS) e os contratos com as empresas responsáveis pela coleta.

O Imparcial – Quais licenças exatamente foram obtidas? Houve alguma licença concedida pelo ICMBio?

Mareh Music – Licença provisória de funcionamento do bar da praia 9bar já existente que foi arrendado e licença para execução de evento (este com aval das secretarias responsáveis incluindo a de meio ambiente). Houve apenas consulta ao ICMBio, que atestou que área escolhida fica fora do limite do parque e o evento não oferecia nenhum risco ao parque e ou sua fauna e flora.

O Imparcial – Como funciona o monitoramento da cadeia de lixo e dejetos anunciada pela festa? Qual foi a quantidade total de lixo produzido e quanto deste total foi tratado ou corretamente destinado?

Mareh Music – Tracking nada mais é que o registro da cadeia de fornecedores que coletam os dejetos e rejeitos e levam até o destino combinado. No caso, o aterro de barreirinhas e a Coema. Não geramos plástico no festival, nosso lixo é 98% lixo seco e reciclável, nós separamos todo o lixo durante o evento e mandamos para o aterro de Barreirinhas, onde os catadores já receberão o lixo separado e deram destino de reciclagem ao mesmo (infelizmente não existem estações de reciclagem institucionalizadas na região). Já o lixo orgânico foi entregue em atins para compostagem e adubação de uma horta. Ou seja nosso lixo foi todo reaproveitado. Os dejetos foram para a Coema.

O Imparcial –  Como funcionou o abastecimento de energia da festa? Houve alguma relação com a queda de luz em Atins durante o evento?

Mareh Music – 100% geradores autônomos. Não tem relação com a queda da rede de luz de Atins, pois não a utilizamos nos eventos.

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