Pandemia impulsiona congelamento de óvulos e embriões
Atualmente, a orientação é de que cada caso seja avaliado individualmente, desde que tomadas as medidas de prevenção contra a covid-19.
O reconhecimento da pandemia de covid-19 pelas autoridades sanitárias brasileiras, em março, foi determinante para que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida recomendassem, num primeiro momento, o fechamento de todas as clínicas de reprodução assistida. Foi autorizada apenas a continuidade dos procedimentos já em andamento.
Posteriormente, o posicionamento foi alterado com permissão para que fossem atendidos apenas casos considerados de urgência: pacientes em tratamento de câncer, com desejo de preservar a fertilidade, e casos em que postergar o tratamento pudesse afetar os resultados, como pessoas com idade avançada ou com baixa reserva ovariana.
Atualmente, a orientação é de que cada caso seja avaliado individualmente, desde que tomadas as medidas de prevenção contra a covid-19.
Sandro Sabino, especialista em reprodução assistida e sócio-diretor da Clínica Vilara, revela que a procura por congelamento de óvulos e embriões cresceu 15% na unidade de saúde durante a pandemia. “Acredito que, de certo modo, as pacientes se atentaram para o fato de não poderem ficar sem fazer nada, esperando a pandemia acabar, e muitas decidiram congelar óvulos ou embriões.”
No que se refere à procura pelo serviço durante a pandemia, o médico considera estar relacionado ao temor de desenvolverem alguma possível complicação da covid-19 na gestação, impactando na saúde do bebê.
“A recomendação para as mulheres é manter a calma. A COVID-19 não apresenta sinais de contaminação do feto nem risco de má formação ou demais problemas. É crucial seguir as orientações médicas e os protocolos de higienização e isolamento social. O momento requer consciência e cautela”, observa.
O adiamento da gestação é uma das principais explicações para o crescimento da prática de congelar óvulos, já que a técnica seria uma forma de “burlar” o relógio biológico.
A pesquisa “Estatísticas do Registro Civil 2018” do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE) aponta que a maternidade após os 40 anos é uma realidade. O estudo revela uma redução no número de filhos em 2018 com as mulheres optando por serem mães cada vez mais tarde.
O levantamento ainda mostrou que a idade para se tornar mãe antes dos 30 anos caiu 16,1%, entre 2008 e 2018, e aquelas que se tornaram mães, entre 30 e 39 anos, subiu 56%. As mulheres com 40 anos ou mais apresentaram uma redução de 14,9%.
DECISÃO PENSADA
A pedagoga Aline Elvira De Figueiredo decidiu, aos 38 anos, realizar o procedimento de congelamento. Ela conta que nunca pensou em ter filhos, mas reconhece que pode mudar de ideia futuramente, uma vez que a mulher, quanto mais a idade avança, as possibilidades de engravidar vão se reduzindo.
Por recomendação de uma ginecologista, ela procurou especialistas em fertilização assistida e depois de um ano “pensando bem”, decidiu pelo procedimento. “Foi tudo muito rápido. Desde a primeira consulta até a coleta e congelamento foi em menos de um mês”, conta a pedagoga.
Durante 12 dias, ela usou uma medicação, acompanhada de ultrassons, a cada três dias, que monitoravam a movimentação do ovário. “O medicamento é simples e aplicado em casa. Doze dias antes da coleta ele é intensificado. A coleta é rápida e feita com anestesia. Dura em torno de 30 minutos.”
Todos os óvulos são recolhidos através de um sistema de punção e levados em laboratório onde são separados aqueles com melhor forma e saúde a serem congelados. O congelamento não tem “data de validade” e os óvulos ou embriões poderão ser utilizados em qualquer época.
ENVELHECIMENTO NATURAL
“O sistema reprodutor feminino apresenta uma redução na qualidade e na quantidade de óvulos ao longo dos anos, reduzindo as taxas de gestação e aumentando as de abortamento. Os estudos mais recentes demonstram que um bebê do sexo feminino nasce com cerca de 2 milhões de folículos e, ao longo dos anos, esse número vai reduzindo, sendo que, ao chegar na puberdade, apresenta em média 500 mil. Já próximo da menopausa, por volta dos 45 anos, o estoque restringe drasticamente, chegando a aproximadamente 2 mil”, revela Marco Melo, da Associação de Ginecologistas e Obstetras de Minas Gerais (Sogimig).
Segundo Marco Melo, as mulheres já nascem com o número de óvulos armazenados em toda a sua vida. Com o passar do tempo vai gastando os óvulos e os que permanecem passam por processo de envelhecimento e perdem a qualidade.
“Por isso o efeito do tempo sobre a taxa de gravidez. O congelamento de óvulos, embriões ou sêmen interrompe o metabolismo e eles podem ser preservados por tempo indeterminado”, explica.
Nos últimos oito anos, a procura pela criopreservação apresenta grande interesse. O receio de uma gravidez durante um processo de pandemia sem que se tenha ainda conhecimentos científicos sobre sua influência na saúde do bebê fez com que muitos casais adiassem os planos de filhos.
Além de quem opta pela maternidade tardia, outra indicação é para quem passará por tratamentos oncológicos ou cirurgias mutiladoras, como ocorre na endometriose (crescimento anormal de tecido fora revestimento uterino) ou com a retirada de tumores ginecológicos benignos.
A indicação do congelamento de óvulos é uma alternativa para preservação do potencial produtivo, antes dos procedimentos.
Sabino destaca que a técnica de preservação da fertilidade com o congelamento pode ocorrer em qualquer idade até 45 anos, contudo, o potencial de sucesso está diretamente relacionado à idade no momento do procedimento. Os resultados são melhores, quando essa prática ocorre antes dos 38 anos, mas isso não impossibilita o processo em idade mais avançada. Nesse cenário, serão necessários mais ciclos de coleta de óvulos para ampliar a chance de sucesso.