Ambulatório encerra atendimentos para Covid-19 em Imperatriz
Em 15 dias, projeto voluntário realizou 2,5 mil atendimentos. Com desgaste dos profissionais e demanda reduzida, prefeitura deve redistribuir o atendimento nos postos de saúde
Após duas semanas de pleno funcionamento em horário comercial, com uma estrutura que foi montada no Centro de Convenções de Imperatriz em apenas 3 dias, o ambulatório construído pelo projeto voluntário A União traz a Cura, que abriu as portas no dia 18 de maio, anunciou o encerramento dos atendimentos para casos suspeitos do novo coronavírus nesta quarta-feira (03).
Apesar do anúncio, pacientes que já estavam em acompanhamento devem retornar até sexta-feira (05), para terminar o ciclo da medicação e reavaliação do quadro clínico pelos médicos.
“Eu e meu filho mais novo sentimos o mal-estar desse vírus e fomos atendidos dia 21 de maio. Já saímos com a medicação em mãos para uso por 5 dias. Meu marido precisou voltar e de lá foi encaminhado para fazer uma tomografia, o laudo diagnosticou lesão no pulmão. Ele foi medicado com injetáveis mais de 5 dias no ambulatório e está se recuperando a cada dia”, revelou a dona de casa Ramona Reis, que teve a família incluída nos números de casos suspeitos da Covid-19 atendidos no ambulatório.
Números ocultos
Ao todo, de acordo com a administração do ambulatório, foram realizados 2.588 atendimentos gratuitos, feitos por uma equipe multiprofissional que contou com cerca de 200 voluntários. Apesar disso, os casos tratados como Covid-19, que totalizam 1.456 (56 % dos atendimentos), não entram nas estatísticas oficiais da Secretaria de Estado da Saúde (SES) e caem na conta da subnotificação da doença em imperatriz.
Isso ocorreu porque, entre outras razões, o ambulatório não dispunha de testes rápidos disponíveis para detecção do vírus, fora a questão dos critérios necessários para resultados confiáveis. Além disso, o ambulatório tinha o propósito de atender pacientes nos estágios iniciais da doença, a fim de evitar complicações que fossem parar nos hospitais. “A ideia era tratar pacientes com sintomas logo no início da doença. Aguardar resultado nem sempre dá certo”, destacou Antônio Wagner, administrador do ambulatório.
Os pacientes foram avaliados pelos médicos com base no quadro clínico e na realização de tomografia torácica. No total, foram realizados 637 exames.
“Em média, a gente tinha de 40 a 50 pessoas por dia fazendo todo um trabalho de uma equipe multiprofissional (médicos, enfermeiros, farmacêuticos, psicólogos, assistente social, uma equipe multidisciplinar), com todo o acolhimento necessário e o mais importante: o diagnóstico radiológico, as tomografias que definiam a gravidade dos casos e a proposta terapêutica, as medicações”, informou o médico Irisnaldo Félix da Silva, idealizador do projeto, que também atendeu pessoalmente a muitos pacientes.
Solidariedade no colapso
A lotação máxima dos leitos clínicos e das Unidades de Terapia Intensiva (UTI) na rede pública de saúde, especialmente nas duas primeiras semanas do mês de maio, quando Imperatriz passou de 165 para 653 casos confirmados do novo coronavírus e saltou de 8 para 38 óbitos em 15 dias, acendeu o alerta para o colapso, também, na rede particular de saúde da cidade.
O Hospital Santa Mônica, reservado aos casos suspeitos da Covid-19 para pacientes com plano de saúde, passou a receber um número expressivo de pessoas sem convênio, mas dispostos a pagar pelo atendimento particular, sobrecarregando todo o sistema de saúde da cidade.
Foi o pontapé para o médico Irisnaldo Félix da Silva, que preside uma empresa de plano de saúde em Imperatriz, unir forças para o enfrentamento à doença na cidade, com a criação do ambulatório.
“A ideia surgiu em razão do aumento que a gente vinha tendo no começo de maio, subindo a curva, e o sistema público saturado começou a impactar na rede privada. Então, todo o planejamento que a gente tinha para para os convênios começou a ser saturado por uma clientela particular que não estava conseguindo atendimento na rede pública. Aquela margem que a gente normalmente trabalha já tinha extrapolado e começamos a ir atrás de estruturas hospitalares, surgiu até a ideia de montar um hospital de campanha, mas da rede privada. A gente vendo aquela avalanche de gente que em 10 dias já lotou o hospital foi o que nos fez partir para um plano B, um ambulatório onde tivesse a aplicação de medicamentos”, lembrou o idealizador do projeto.
Mas, inicialmente, seria um ambulatório particular, de custos mais acessíveis. A socialização da ideia acabou mobilizando a parceria com empresários, atraindo a ajuda dos governos estadual e municipal e, principalmente, incentivando uma ação solidária, com os profissionais voluntários que permitiram que o atendimento fosse totalmente gratuito à população.
“No primeiro momento, ele [o ambulatório] ía ser com a iniciativa privada custeando parte desse valor, mas a gente fazendo um preço baixo. Conversamos com a iniciativa privada, a Associação Comercial se disponibilizou a oferecer o Centro de Convenções; fizemos uma conversa com o [Governo do] estado, que se disponibilizou em fornecer medicamentos e parte das tomografias; o município também entrou com parte das tomografias e forneceu a climatização e a limpeza da estrutura; aí, quando a gente conversou com os profissionais, pra cada um dos que eu liguei, eu, pessoalmente, todo mundo se prontificou a ajudar. Aquilo foi uma das coisas que realmente nos moveu”, orgulhou-se o idealizador do projeto.
O atendimento chega ao fim conforme o planejamento de duas semanas feito pela administração, dado o desgaste da equipe profissional, por serem todos voluntários, e também em razão da redução na procura por atendimento, as filas já não se formavam com a mesma extensão nos últimos dias.
A atual redução na ocupação dos leitos clínicos e de UTis (85% no Hospital Macrorregional e 80% no Hospital de Campanha – dados do último boletim da SES) também seria reflexo do atendimento com diagnóstico precoce no ambulatório.
Agora, essa importante porta se fecha para novos pacientes que precisarem de atendimento gratuito, mas abre o risco de novo colapso na saúde, se não houver continuidade no atendimento, mesmo com a demanda incerta. As autoridades de saúde ainda não afirmam se a cidade atingiu o pico da curva de contágio do novo coronavírus.
“Tão logo a gente começou essa operação, nós sentimos [o impacto] na rede privada. Do dia 18 [de maio] em diante, uma queda diária na quantidade de pessoas no pronto socorro. Foi o que fez a gente ter certeza que duas semanas seriam o necessário. Acabamos estendendo pra 3 semanas, que é esta em que estamos, mas com 2 semanas a gente já tinha vencido aquela avalanche de gente e agora os casos que irão aparecer, as estruturas do estado e município deverão dar conta. Foi o principal motivo que fez a gente entender que o nosso momento foram aquelas duas semanas cruciais. A gente conseguiu fazer de forma mais simples, medicando o paciente, sem ocupar um leito hospitalar. Diagnóstico precoce e tratamento precoce”, esclareceu Irisnaldo.
Para onde ir?
Com a desativação do ambulatório, pacientes com sintomas leves e moderados da Covid-19 devem procurar as Unidades Básicas de Saúde de Imperatriz. A Secretaria Municipal de Saúde (Semus) informou que 4 postos terão o atendimento voltado exclusivamente para casos suspeitos da doença, a partir da próxima semana.
“Essas 4 Unidades Básicas de Saúde são as que já têm o horário estendido, até as 20h: Cafeteira, Maria Aragão, Vila Lobão e Milton Lopes, que serão referência para a Covid-19, para aqueles primeiros atendimentos que estavam tendo no Centro de Convenções”, reforçou a secretária municipal de saúde, Mariana Jales.
Imperatriz tem atualmente 2.172 casos confirmados, mas 1.644 pessoas estão recuperadas da Covid-19 e há 428 casos ativos. A cidade registra 100 mortes por coronavírus e há 2 dias nenhum óbito é incluído no boletim diário da Secretaria de Estado da Saúde (SES).