Por que um leito de UTI faz tanta falta? Entenda!
Antes da pandemia, Maranhão tinha quase metade dos leitos que tem hoje
Basta se falar que um parente será transferido para a UTI que a família logo fica apreensiva, como se junto à notícia viesse uma “sentença de morte”, dada a gravidade da situação. Se por um lado é verdade que os casos mais graves são acompanhados de perto por médicos intensivistas, por outro, sentença de morte seria mesmo não poder ser assistido em uma Unidade de Terapia Intensiva. É exatamente essa a falta que faz um leito de UTI, seja na rede pública ou na rede privada de saúde.
Dados de uma pesquisa realizada recentemente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em parceria com a fundação Oswaldo cruz (FIOCRUZ), colocaram o Maranhão na 7ª posição dos estados com menor índice de distribuição de leitos de Unidades de Terapia Intensiva (UTI) do Brasil: apenas 8 para cada 100 mil habitantes. Antes da chegada da pandemia ao estado, o Maranhão contava com 339 leitos.
Coincidentemente, em outro ranking – o de mortes por Covid-19 -, o Maranhão aparece novamente em 7º lugar nacional, atrás de São Paulo (4.823), Rio de Janeiro (2.852), Ceará (1.748), Pernambuco (1.640), Amazonas (1.433) e Pará (1.329), de acordo com o último boletim do Ministério da Saúde.
No nordeste, com 604 mortes provocadas pelo coronavírus registradas até a noite de segunda-feira (18) segundo o último boletim epidemiológico, o Maranhão ocupa hoje o 3º lugar – Ceará e Pernambuco estão na frente.
Em comparação à quantidade de habitantes, um dado chama a atenção: a taxa proporcional de mortes no Maranhão (0,008%) é igual à do estado de São Paulo, que tem uma população de 45 milhões de pessoas, enquanto o Maranhão tem 7 milhões, de acordo com o IBGE.
Nesse cenário, outro fator ganha relevância: a falta de respiradores nas cidades do interior do estado. A mesma pesquisa do IBGE revela que, até dezembro de 2019, o número de respiradores ainda era insuficiente, pois apenas 65 dos 217 municípios possuíam o equipamento, que é necessário para a tratamento de pacientes com complicações da doença.
Incremento
Desde o início da pandemia, de acordo com a Secretaria de Estado da Saúde, foram abertos 306 novos leitos de UTI para atender a pacientes graves da Covid-19 no Maranhão, que agora conta com 645 leitos, sendo 350 destinados ao tratamento de pessoas infectadas pelo novo coronavírus. Ao todo, segundo o Governo do Estado, já foram investidos R$227,8 milhões no combate à doença.
Ainda assim, incrementar melhorias neste contra-relógio leva um tempo para surtir os efeitos esperados. Isso porque leitos e equipamentos por si não salvam vidas. Fundamentais na linha de frente do enfrentamento ao novo vírus, o número de profissionais da saúde ainda não satisfaz o nível considerado ideal para a população do estado: são 81 médicos e 106 enfermeiros a cada 100 mil habitantes, de acordo com o IBGE, o que coloca o estado em último lugar no ranking nacional.
Um agravante: nem todos esses profissionais atuam no combate à pandemia. “Esse é o número de médicos de todas as especialidades. E com os leitos de UTI a situação é catastrófica, não apenas no Maranhão, mas no Brasil”, ressalta Marcelo Medo, chefe do IGBE-MA.
Fora o número defasado, a forma como os profissionais estão distribuídos é outra preocupação. “Em geral, o que se observa é que há uma grande concentração desses profissionais nas regiões mais desenvolvidas, como a região metropolitana de São Luís e a região tocantina, em especial na cidade de Imperatriz, enquanto que em regiões de menor desenvolvimento a presença de médicos e enfermeiros é mínima”, sinaliza o chefe do órgão.
Além da necessária contratação de profissionais da saúde, é preciso investir nas condições de trabalho dessas pessoas. O número de profissionais infectados no Maranhão já passou de 800, com 14 óbitos até aqui, o que levou muitos a se afastarem do trabalho. O resultado é a saturação dos serviços de atendimento por falta de profissionais, os quais acabam sobrecarregados, sofrendo consequências físicas e mentais.
Educação
Se o cenário pode melhorar com investimentos corretos e rápidos, também pode mudar com a conscientização da população sobre a necessidade do distanciamento social, O problema, porém, é que esse desrespeito ainda visto em grande quantidade também tem justificativas que revelam deficiências em outras esferas.
Hoje, o maior índice de infectados da capital maranhense está em áreas mais afastadas e em áreas mais populares. A impressão de muitos é que a rotina nessas localidades não teve tanta mudança. “É como se a população das classes mais altas da sociedade estivesse enfrentando o tédio, enquanto a outra parte, formada majoritariamente por trabalhadores que perderam suas rendas e seus empregos, enfrentasse a fome, sem o devido entendimento da gravidade da situação da saúde no país e no mundo”, comenta Gabriel Nava, cientista social e pesquisador.
Logo, sim, o descumprimento às medidas de segurança no combate ao novo coronavírus é um fator relevante, mas não deve ser visto como o único culpado pelo atual cenário. “Apontar o dedo para um culpado , e escolher como donos da culpa aqueles que menos conseguem compreender a situação por falta de instrução, muitas vezes, não é só um grande equívoco, mas também uma grande crueldade”, finaliza Gabriel Nava.