Agentes funerários na mira do novo coronavírus
Mesmo com uso reforçado dos equipamentos de proteção, muitos profissionais que atuam em funerárias têm adoecido. Esta semana, um deles não resistiu à Covid-19.
Desde o começo da pandemia do novo coronavírus, a rotina de diversos profissionais mudou, com destaque para quem atua na área da saúde e em empresas funerárias. Para esses trabalhadores, a labuta diária exige cuidados redobrados, além de uma disponibilidade muito maior do que antes. Isso é o que afirma o Moacir Machado Júnior, diretor de uma das maiores funerárias do Maranhão.
“Por causa do aumento no número de óbitos, todos nós temos trabalhado bem mais. Antes, os últimos enterros do dia ocorriam até as 17h em nosso cemitério. Agora, só fechamos as portas quando realizamos o último enterro, que às vezes ocorre até as 21h”, revela o empresário.
A procura por mão de obra e equipamentos para melhor desenvolvimento do trabalho também foi um dos pontos que precisou ser repensado. “Tivemos a necessidade de alugar mais carros e contratar mais motoristas, devido ao aumento das demandas”, afirma Moacir. Isso acontece porque os corpos de vítimas da Covid-19 não podem ser velados, medida sanitária adotada para evitar novas contaminações.
Se por um lado a família das vítimas lamenta não poder se despedir daquele ente querido, por outro, os agentes funerários que atuam nos enterros acabam ficando expostos e vulneráveis, apesar do reforço na utilização dos equipamentos de proteção recomendados. “Boa parte dos nossos funcionários adoeceu, mesmo usando todos os EPI’s [Equipamento de Proteção Individual], porque precisamos lidar diretamente com o corpo”, ressaltou Moacir Machado Júnior.
Esse foi o caso do agente funerário Clorismar Lima de Carvalho (51), que acabou não resistindo à infecção pelo novo coronavírus e morreu na madrugada desta quarta-feira (13). Em São Luís, Clorismar já atuava havia mais de 30 anos como tanatopraxista, profissional responsável pela preparação do cadáver para o enterro. A principal suspeita é que Clorismar tenha contraído o vírus durante o trabalho, na funerária em que atuava, localizada no bairro Areinha, na capital.
Demanda crescente
Com a quantidade crescente de mortes provocadas pela Covid-19 e os óbitos decorrentes de outras causas, funerárias de todo o mundo passaram a atuar ininterruptamente. No caso da empresa de Moacir, o funcionamento já era de 24 horas antes mesmo da situação atual de pandemia. Porém, algumas empresas precisaram cobrar taxas extras para os sepultamentos, pois foram necessários investimentos além dos previstos em material adequado para os enterros, que estão em carência no mercado.
Para garantir que as famílias se sintam seguras diante de uma necessidade como essa, as empresas também reforçaram o estoque de caixões. “Temos uma quantidade considerável de caixões hoje, por entendermos que esse momento também exige planejamento do nosso setor”, afirmou Moacir Júnior.
Uso correto de EPI’s
A utilização correta dos Equipamentos de Proteção Individual contribui para uma menor exposição e melhor proteção dos profissionais que atuam no transporte e na preparação do corpo que será enterrado. Dentre os materiais que devem ser disponibilizados, estão macacões impermeáveis reutilizáveis, óculos de proteção, botas de PVC, luvas e máscaras faciais. Isso tudo, claro, sem esquecer a frequente higienização das mãos e punhos com água e sabão, e do uso frequente do álcool em gel durante todo o processo.
Na empresa de Moacir, os profissionais passaram por treinamento para redobrar os cuidados, porém, ele explicou que a necessidade de acompanhamento e monitoria do trabalho é frequente. “Apesar de usarmos todos os equipamentos recomendados, e dos cuidados que tomamos, um ou outro profissional fica doente”, comentou o empresário, que atualmente está com quatro motoristas afastados por doenças.
Dor sem despedida
Uma das vítimas do novo coronavírus foi o tio da empresária Cláudia Cardoso. Antônio Lisboa Araújo morreu aos 76 anos, em decorrência de complicações respiratórias causadas pelo novo coronavírus. A sobrinha conta que a família ficou muito abalada por não poder se despedir do parente.
“O processo de liberação do corpo foi demorado. Após a autorização de sepultamento, o corpo precisou ser levado diretamente para o cemitério. Só quem acompanhou, ao longe, o sepultamento foi a viúva, os cinco filhos deles e uma das noras. Para muitos de nós, da família, o jeito de participar daquele momento, de alguma forma, foi por meio de vídeo chamada”, compartilha Cláudia.
Protocolo de sepultamento
De acordo com a Secretaria de Estado da Saúde, a população e as centrais responsáveis por velórios são obrigadas a seguir o protocolo decretado pelo Governo do Estado para sepultamento de casos suspeitos e confirmados pela Covid-19 no Maranhão.
O enterro precisa ocorrer de forma rápida, tendo que ser realizado com o caixão totalmente fechado e a presença de até dez pessoas, desde que elas não façam parte de nenhum dos grupos de risco para a Covid-19. Além disso, só pode ser realizada apenas uma cerimônia simples antes do enterro, com duração máxima de 10 minutos.