Votações sobre fake news são retomadas em duas frentes: TSE e CPMI
O TSE investiga a chapa Bolsonaro-Mourão por tirar vantagem de uma invasão ao grupo no Facebook responsável pelo movimento #EleNão, que reuniu quase 3 milhões de opositoras da candidatura.
A conversão do presidente Jair Bolsonaro ao figurino menos belicoso e mais discreto foi forçado não apenas pela prisão de Fabrício Queiroz , mas também devido à possibilidade de convergência entre o inquérito das fake news do Supremo Tribunal Federal (STF), as investigações da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito do mesmo tema e o julgamento da cassação da chapa de Bolsonaro-Hamílton Mourão no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) — este último será retomado hoje, pois o ministro Alexandre de Moraes devolveu o processo para a pauta e é esperado o voto do presidente Luiz Roberto Barroso. Também hoje deve ser votado o Projeto de Lei 2.630/20, que define o combate às mentiras disseminadas nas redes sociais e inclui as empresas de tecnologia da informação neste esforço.
No placar do TSE, três ministros votaram por conceder aos autores das ações — as coligações dos então candidatos à Presidência Marina Silva (Rede) e Guilherme Boulos (PSol) — a possibilidade de trazer aos autos mais evidências sobre o suposto abuso de poder, na campanha de 2018. Foram eles: Edson Fachin, Tarcísio Vieira e Carlos Veloso Filho –– Og Fernandes e Luiz Felipe Salomão foram contra. Entretanto, nos bastidores da Corte, comenta-se que o processo que pede a cassação da chapa Bolsonaro-Mourão tem fragilidades e, portanto, tem tudo para ser arquivado.
Mesmo assim, uma interseção entre as ações no TSE, no STF e na CPMI pode trazer dores de cabeça. Presidente da Comissão e relator do PL das fake news, o senador Angelo Coronel (PSD-BA) avisou ao TSE e ao Supremo que as provas levantadas estão à disposição da Justiça. “Estamos procurando patrocinadores de robôs, principalmente na área política, para termos eleições sem influência das redes digitais na escolha dos representantes”, destaca.
Integrante da Comissão, a vice-líder do PT, deputada Natália Bonavides (RN), salienta que a ação do STF que culminou na operação da Polícia Federal de quebra de sigilo contra apoiadores do presidente, suspeitos de disseminar fake news, tinha um tom parecido com os levantamentos da CPMI. “O que está em curso é uma organização criminosa, com núcleo político que escolhe alvos, dá o comando dos ataques, tem um núcleo operacional para criar conteúdo e disparar as mensagens, e um núcleo empresarial, que financia. Não é algo amador. Os fundamentos da decisão seguem a mesma linha da CPMI, que há indício de organização criminosa, com núcleo financiador”, explica.
Geraldo Tadeu Monteiro, cientista político, mestre em sociologia política e doutor em direito e professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), acredita que a máquina de moer reputações vem de antes de Bolsonaro assumir a Presidência.
“Temos a convicção de que existe uma ação rápida, eficiente e articulada (de disparo de fake news), que começa via WhatsApp, Facebook e Twitter. Depois que (Sergio) Moro pediu demissão (do Ministério da Justiça), por exemplo, virou inimigo. Começaram a circular mensagens chamando-o de traidor. É evidente que essa máquina foi criada na campanha eleitoral e se mantém ativa”, afirma.
Projeto
Autor do PL sobre as fake news, previsto para ir à votação hoje, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) observa que é preciso uma ação urgente do Congresso contra as ações que visam assassinar reputações por meio das redes sociais. “Temos problemas com contas falsas, redes de robô, impulsionamentos artificiais, e são pontos consensuais. Claro que há preocupação de segurança dos dados, mas uma vítima tem que ter o direito de denunciar o agressor. O cidadão tem direito à honra e privacidade”, afirma.
Apesar da expectativa do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), de que os senadores cheguem à sessão com as dúvidas sobre o PL sanadas, ainda há pontos indefinidos. O relator, Angelo Coronel, não pretende abrir mão de itens polêmicos, como a obrigação de que as plataformas de mensagens como WhatsApp e Telegram guardem os registros das conversas por três meses. Por falta de consenso, senadores fizeram nove pedidos de adiamento e três de retirada de pauta na semana passada. Hoje, deve haver uma nova onda de requerimentos. Se Alcolumbre desistir de colocar a matéria em votação, os senadores terão pelo menos mais um dia para discuti-la. Amanhã, com sessão conjunta prevista no Congresso, o assunto dificilmente voltaria à pauta.
Mudança de nome de grupo motivou ação
O TSE investiga a chapa Bolsonaro-Mourão por tirar vantagem de uma invasão ao grupo no Facebook responsável pelo movimento #EleNão, que reuniu quase 3 milhões de opositoras da candidatura. Depois do ataque, o grupo “Mulheres Unidas contra Bolsonaro” virou “Mulheres com Bolsonaro #17”. O então candidato a presidente publicou em suas redes sociais um “print” da comunidade virtual e um texto de agradecimento ao suposto apoio. No TSE, entende-se que as ações impetrados pelas chapas de Marina Silva e de Guilherme Boulos são juridicamente frágeis e com poucas chances de prosperar. Mas, apesar da tendência de arquivamento, há ministros que enxergam motivos para conceder às coligações dos então candidatos mais tempo para comprovar a interferência do ataque hacker no pleito presidencial.