APURAÇÃO

217 municípios do estado têm problemas na Justiça

O movimento de magistrados Maranhão sem Corrupção já contabiliza quase 100 processos contra gestores públicos municipais

bom jardim ma
Processos de improbidade administrativa são o que há de comum entre todos os municípios do Mara­nhão. Alguns acumulam ainda atraso ou fraude na prestação de contas, lesão ao erário, des­vio de verbas, falsidade ideoló­gica, contratação de servidores sem concurso, fraude em licita­ções, falta de comprovação de aplicação de recursos do Fundo Municipal de Saúde (FMS), má aplicação dos recursos do Fun­do de Manutenção e Desenvol­vimento da Educação Básica e de Valorização dos Pro­fissionais da Educação (Fundeb), fragmenta­ção de despesas e dispensa ir­regular de licitações.
Apenas no último ciclo elei­toral, mais de 74 prefeitos e ex-prefeitos foram condenados pelo Tribunal de Justiça do Estado. Eles respondem por mais de 80 cri­mes relacionados ao seu papel à frente da administração públi­ca dos municípios. Entretanto, a lista divulgada em Janeiro, não incluía os exemplos mais famo­sos de escândalos envolvendo prefeitos, e nem o recente afasta­mento de 180 dias, pela Câmara Municipal, da prefeita de Gover­nador Newton Bello, Leula Bran­dão, no último dia 6 de março.
Uma nova lista com cidades cujos prefeitos e ex-prefeitos que responderão a processos por im­probidade administrativa foi di­vulgada por magistrados do movi­mento Maranhão sem Corrupção, e já contabiliza quase 100 proces­sos contra gestores públicos mu­nicipais. Outros processos para­dos atingem todas as prefeituras do estado, segundo o movimento.

Nenhuma das relações, en­tretanto, inclui nomes como o de Lidiane Leite, ex-prefeita de Bom Jardim, Baldoíno e Richard Nixon, de Bacuri, e Helder Lopes Aragão, de Anajatuba, por exem­plo, a despeito da repercussão de seus crimes, que direta ou in­diretamente foram prejudiciais à administração pública, e de terem sido afastados das prefei­turas, ou terem o mandato cas­sado ainda em 2015.

Cenário político
Os casos de prefeitos presos no Maranhão ganharam repercussão nacional, e, segundo especialis­tas, servem como um retrato pre­ocupante da má administração pública no país. Para o cientista político Hesaú Rômulo, o cená­rio comum à todos municípios de todo o Maranhão, é danoso para o cenário político do es­tado, ao mesmo tempo em que prejudica a população “Em uma democracia es­pera-se o poder seja alternado entre os representantes eleitos, mas a necessidade de presença constante do judiciário interfe­re diretamente no andamento de políticas públicas essenciais aos municípios. Nas duas últi­mas décadas presenciamos um aumento relevante de investi­gações que resultaram na conclusão de que os ges­tores estariam inaptos a go­vernar”, comentou.

O especialista aponta ainda que o número de casos envol­vendo prefeitos em exercício nos últimos anos abre espaço para questionar como comportamen­tos semelhantes, em gestões mais antigas não foram investigados. “Se, em um primeiro momen­to pode sinalizar uma vigilância maior por parte do judiciário, e indicar que gestores públicos não estão imunes às regras de con­duta, ela abre uma interrogação sobre como os gestores públi­cos mantiveram-se distantes de qualquer lei por tanto tempo”, indaga o cientista político.

O juiz da Comarca de São Luís, Douglas Melo, conta que a moro­sidade nos processos que agora estão sendo julgados se deu, entre outros fatores, por envolverem gestores em exercício. “É muito complicado um processo contra prefeitos. Eles têm muitos recur­sos, arrumam testemunhas de lu­gares completamente diferentes de onde eram gestores. O sistema é feito para o atraso”, comentou o juiz Douglas Melo, um dos lí­deres do movimento Maranhão sem Corrupção. Melo ainda des­tacou que os juízes estão optan­do por não afastar os gestores em exercício. “Apenas em casos que atinjam os direitos humanos os prefeitos serão afastados”, disse.

Prisão a recém-empossado como vice-prefeito

Para a moradora da cidade, Larissa Sousa, a prisão do vice-prefeito, que havia sido recém-empossado em substituição ao prefeito afastado, foi uma sur­presa na cidade. “A comunidade ficou chocada. Nixon era o vi­ce-prefeito e só estava no cargo de prefeito há um mês. Depois todo mundo ficou bem revol­tado, ele estava desviando di­nheiro da educação. Hoje Ba­curi é uma cidade sem lei, não há segurança, a saúde está um caos”, comenta.

Para a vendedora, a cidade está ainda muito revoltada. “Fo­ram quatro anos entre idas e vin­das de Nixon e Balduíno (José Baldoino da Silva Nery, do PP, prefeito eleito e hoje à fren­te da administração pública). A cidade coleciona processos judiciais contra os gestores, é vergonhoso”, diz.

Já em Bom Jardim, moradores contam que antes da prisão a ci­dade já sabia e sofria muito com a administração pública, e que os desvios de verba da merenda escolar eram de conhecimento público. “Não foi surpresa para ninguém o que aconteceu. Hoje temos merenda escolar, mas na época todo mundo sabia o que se passava. Logo que a prefeita Lidiane sumiu daqui a cidade vi­rou um caos, não se sabia o que iria acontecer”, relata o funcio­nário municipal Ismael Melo.
Lidiane Leite responde, hoje em liberdade após ficar quase 40 dias foragida da polícia federal, a processo criminal por desvio de verbas, fraude licitatória e asso­ciação criminosa durante gestão à frente da Prefeitura de Bom Jardim.

Segundo o cientista político, o entra e sai de prefeitos e vices inviabiliza o andamento de po­líticas públicas e prejudica a po­pulação, mas a falta de punições gera um sentimento de impunida­de e propicia a continuidade em casos de corrupção. “O prefeito vai criando uma base de aliados e crédito com vereadores. A coisa é diferente quando ele é afastado e o vice assume”, comentou. 

“Existe um fosso entre inves­tigações que apontem irregulari­dades e a efetivação destas conde­nações. Isto em si é uma questão do próprio judiciário brasileiro que preconiza o foro privilegiado aos prefeitos, tornando a ques­tão sempre complexa e repleta de nuances. A lentidão favore­ce o investigado, prejudica o an­damento da agenda municipal e a população sofre a cada nova atualização. A instabilidade po­lítica, mais uma vez, gera uma descrença no poder efetivo das instituições sobre a vida dos in­divíduos”, analisa o pesquisador.

prefeitos e ex-prefeitos foram condenados pelo Tribunal de Justiça do Estado
Em Santa Inês, distante 246km de São Luís, moradores e fun­cionários municipais, que não querem se identificar, relatam que os prejuízos para a cidade durante o processo de prisão e soltura do prefeito Ribamar Al­ves (PSB), preso sob acusação de estupro, apenas agravaram uma situação já antiga no mu­nicípio, como o descaso com a saúde e com a educação.

“Ficamos sem coleta de lixo por semanas, os salários dos ser­vidores estão atrasados já há três meses. Em cada esquina era um boato quando o prefeito foi preso. Não sabíamos muito bem o que estava acontecendo e como ia ficar a cidade. Agora com a volta dele (Ribamar Alves) vários fun­cionários estão sendo demitidos da prefeitura”, contam.
“Não entendemos quando o prefeito diz que o vice desor­ganizou toda a cidade. Já esta­va tudo bagunçado, não temos nada. Há escolas que o ano le­tivo não começou. Na escola Edimilson Gonçalves a diretora pediu que os zeladores ‘esque­cessem’ os salários atrasados. Não tem merenda escolar, e não é de hoje”, diz uma professora da rede municipal, que prefe­re manter seu nome em sigilo.
Na cidade de Bacuri, na Bai­xada Maranhense, o que chama a atenção é a rotatividade entre o prefeito eleito José Baldoino da Silva Nery (PP) e o vice Richard Nixon (PMDB). Desde a eleição em 2012, ambos têm alternando o assento principal da prefeitura.
Nixon foi preso em maio de 2015, com mais cinco pessoas, sob acusação de agiotagem. Ele havia assumido a prefeitura após o prefeito Baldoíno ter sido afas­tado em março por improbida­de administrativa. Nixon foi sol­to 10 dias depois após expirar o prazo de prisão preventiva. Hoje quem está à frente da Pre­feitura Municipal de Bacuri é novamente Baldoíno.
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