Aos 73 anos, o deputado federal Jarbas Vasconcelos é, ao mesmo tempo, opositor ferrenho de Dilma Rousseff e de Eduardo Cunha. Enquanto a maioria dos políticos do Congresso Nacional escolheu um lado na guerra entre a petista e o peemedebista, o ex-governador pernambucano critica com contundência a permanência de Cunha no comando da Câmara e defende com veemência o impeachment de Dilma. “Ele é um psicopata sem limites, que consumou um processo explícito de chantagem e assédio. Ela, por sua vez, permitiu que se fizesse aquilo, oficializasse a chantagem. Não pode estar se fazendo de santinha.”
Jarbas recebeu o Correio na quarta-feira — horas antes de Cunha acatar o pedido de abertura do impeachment de Dilma — e na quinta-feira, quando o Congresso já discutia uma eventual convocação extraordinária para contar prazos do processo. Na entrevista, ele avaliou as crises política, econômica e moral sem precedentes do país, o papel dos Três Poderes, a falta de qualificação de políticos da Câmara, um eventual governo de Michel Temer e revelou arrependimentos, como o de ter votado em Cunha para o comando da Casa no início da legislatura. “Eu devia ter procurado saber, até pela minha experiência. Eu errei, via o Cunha como um simples lobista, mas que tinha um discurso contra a hegemonia do PT”, disse ele, que é uma espécie de dissidente no PMDB, partido do qual foi fundador, ainda quando a legenda era chamada de MDB.
Ao longo da vida pública, o pernambucano Jarbas Vasconcelos alternou mandatos de deputado estadual, federal, senador, governador e prefeito do Recife. Nas urnas, ganhou de lavada para Miguel Arraes, mas perdeu de forma contundente, em 2010, para Eduardo Campos, neto do mitológico político. “Eduardo era um animal político, nós fomos para um total isolamento em Pernambuco; se persistíssemos naquilo, seríamos aniquilados nas eleições municipais de 2012”, disse Jarbas, que revelou pela primeira vez os bastidores da reaproximação com Eduardo Campos. A seguir os principais trechos da entrevista:
Eduardo Cunha oficializou a chantagem na política brasileira?
Sim, uma chantagem anunciada, a mídia vinha acompanhando, a opinião pública, formadores de opinião pública. Cunha tentou fazer isso lá atrás com o conjunto da oposição, ludibriou esse conjunto da oposição, prometendo colocar em pauta, na ordem do dia, o impeachment. E não fez. Quando a oposição percebeu isso, deixou ele de lado e partiu para pedir reiteradamente e oficialmente a sua renúncia. Então ele, já denunciado no Conselho de ética, passou a assediar a Presidência, em especial o PT, que tem três membros que integram o conselho de ética. Desde segunda-feira que ele não faz outra coisa aqui em Brasília. Ele percorreu um caminho da barganha, esteve atrás de Michel Temer. Se os três representantes do PT não votassem com ele, ele anunciaria o impeachment. Mandou recados para a presidente, disse isso ao Jaques Wagner, ministro da Defesa. E na quarta-feira, como se consumou por decisão partidária do presidente do PT de dar continuidade ao processo, ele se trancou e despachou. Para mim não foi nenhuma surpresa, ele é um doente, uma pessoa sem limites e capaz de tudo. Ontem se consumou um processo explícito de chantagem e de assédio. É relevante o que ele fez ontem? É relevante, mas ele poderia ter feito há 45 dias. Barganhou no mau sentido. É um processo de degradação e ficou ainda mais confuso, mais tumultuado.
Mas a oposição festejou…
Festejou, a oposição não quer entrar nesse mérito que estou entrando.
Por quê?
A oposição deu ênfase que a ação foi importante e relevante, o pontapé inicial.
Mesmo com Cunha sob suspeição?
A oposição está pragmática, o que interessa à oposição é o pontapé inicial, acompanhar o processo. Concordo que o pontapé foi importante, mas o Cunha não pode acompanhar isso. É como uma partida de futebol. Ele deu o primeiro chute, mas tem de sair. Foi importante o que ele fez, mas o processo não é rápido e leve. É penoso, duro, complicado.
Quanto tempo leva?
Não vejo antes de cinco ou seis meses. Sobretudo por ter sido apresentado agora no fim do ano. O país já está parado. O governo que levou à paralisação do país, não foi o contrário. Então a gente vai ter uma paralisia maior ainda no mês altamente significativo, que é dezembro, mês de confraternização, de festas, de presente, do comércio tirar o pé da lama. É triste.
O que o senhor espera da Dilma?
Ela é imprevisível. Na quarta-feira, ela misturou as coisas. Tinha repudiado a atitude do Cunha, e isso eu concordo, mas dizer que é um malfeito, e que não gosta disso? Ela vive rodeada de malfeito, vive acompanhando isso. Ela se submeteu ao processo de chantagem, ela discutiu, colocou ministros, designou o Jaques e o Berzoini para acompanharem isso. Como a coisa extrapolou, a ameaça foi persistente, constante, e a repercussão, negativa, alguém buzinou no ouvido dela que todos iam se dar mal. Ela não foi surpreendida, surpreendido foi o país por não ter acesso a esses detalhes da chantagem.
E quanto aos prazos?
É um processo novo. O de Collor foi com dois anos até o impeachment. Esse de Dilma, se não estou enganado, começou a se falar em impeachment em março. Antes de 90 dias de governo. É um processo novo, uma coisa nova para a gente. Além de ser só o segundo processo de impeachment. E é o segundo em circunstancias anormais, e junto com a crise política que arrasta todas as outras, econômica, social, ética. É um momento crucial do país, muito difícil.
O país aguenta?
Vai aguentando até estourar. O que é estourar? É desde o mais alto agente econômico lá de São Paulo, o mais rico, mais poderoso até o eleitor mais humilde não se conformar mais. Estamos paralisados totalmente.
E a sucessão Cunha?
Se esse processo for deflagrado agora, é uma coisa de amador, altamente perniciosa. Não se abre uma discussão, mesmo que seja interna, sigilosa e recatada para um cargo que não está vago. Se está discutindo a vacância de Cunha, isso só se pode fazer no momento em que Cunha cair. O vice-presidente assume, e tem cinco sessões para fazer a designação.