EDITORIAL
Doença crônica
Capital dos Jogos Olímpicos 2016, o Rio de Janeiro se debate ante a falência do sistema público de saúde. A crise não é herança maldita de governos passados — a presidente da República, o governador e o prefeito foram reeleitos em 2014 — nem tampouco exclusiva da Cidade Maravilhosa, que receberá, de 5 a 21 […]
Capital dos Jogos Olímpicos 2016, o Rio de Janeiro se debate ante a falência do sistema público de saúde. A crise não é herança maldita de governos passados — a presidente da República, o governador e o prefeito foram reeleitos em 2014 — nem tampouco exclusiva da Cidade Maravilhosa, que receberá, de 5 a 21 de agosto, 10.500 atletas vindos da maioria das nações. O mal é crônico e afeta a maioria, senão todos, dos municípios e unidades da Federação.
Como país anfitrião, o Brasil se mostra incapaz de prestar assistência médica digna. Pior: o poder público é desleixado com a população que abastece os cofres do Estado. Os governantes não cumprem, minimamente, o que determina a Constituição de 1988. Os serviços públicos de saúde há muito deixaram de ser mecanismo de superação das doenças; tornaram-se de agravamento das moléstias, sem contar com as epidemias cujos primeiros sinais são subestimados por quem deveria evitá-las.
Mulheres, homens, crianças, jovens ou idosos — pouco importam a faixa etária ou as leis que impõem prioridades de atendimento —, sobretudo os mais carentes, são largados à própria sorte quando chegam à unidade de saúde em busca de socorro. Faltam leitos, profissionais, medicamentos, equipamentos necessários ao atendimento digno, há muito pagos pelos abusivos impostos cobrados dos usuários. Recorrer à Justiça faz pouca ou nenhuma diferença. O gestor se mantém firme na alegação de que não há meios para cumprir as decisões liminares e segue impune, blindado por sistema ineficiente que vige em todo o território nacional. Para as autoridades e a classe mais abastada há as unidades privadas de saúde.
A falta de gestão e comprometimento com o bem-estar do cidadão e a burocracia medíocre estão entre os fatores que explicam, em parte, as tragédias na rede pública de saúde do país. O ministério com orçamento de R$ 91,5 bilhões — 11,3% a menos do que a proposta original de R$ 103,27 bilhões —, é um dos mais bem aquinhoados da Esplanada. No entanto, nada é suficiente para assegurar assistência adequada. Quando os profissionais do setor se insurgem contra os gestores, há um corre-corre para mitigar os danos decorrentes do descaso. Na maioria das vezes, a providência é tardia. O paciente morre, vítima muito mais da negligência do que da fatalidade ou do limitado alcance da medicina.
No interior do país, onde o exercício da cidadania ainda é algo em construção, entre as populações mais carentes, o drama é muito maior. Nas grandes capitais, as tragédias atraem a mídia e o poder público se vê acuado pela repercussão na opinião pública. O cofre é aberto e, como sempre, pacotes de ajuda são criados para conter a calamidade que ameaça a imagem política do gestor. Diante da decretação de estado de emergência, o Planalto anunciou a liberação de R$ 155 milhões ao governo fluminense, a Prefeitura do Rio concedeu empréstimo de R$ 100 milhões e o Executivo estadual recolheu mais R$ 152 milhões de ICMS. Ou seja, não falta dinheiro.
O problema é crônico, em nível nacional, por falta de providências efetivas, como sistemas rigorosos que impeçam desvios de recursos; processos que reduzam o tempo de atendimento aos pacientes; manutenção de estoques de medicamentos e material de uso contínuo; revisão periódica de equipamentos; condições adequadas de trabalho dos profissionais do setor. Mais e principalmente: responsabilidade dos governantes com a saúde e a vida dos cidadãos.
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