A Academia Maranhense de Letras Jurídicas homenageou a Constituição de 1946 nos 69 anos de sua promulgação, ocorrida dia dezoito passado, no Auditório da Seccional da OAB, promovendo o Seminário “Inovações na Prestação Jurisdicional”. Ao tempo em que se abordou a História do Direito Constitucional, refletiu-se sobre a contribuição daquela Carta Magna para a construção do Estado do Bem-Estar Social. Lançou-se os olhos para a política pública da distribuição da Justiça. Os expositores não poderiam ser melhores: o Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Reinaldo Soares da Fonseca, discorreu sobre a “A Importância da Conciliação na Prestação Jurisdicional”, e o Juiz Federal Roberto Veloso acerca do “Processo Penal Justo e a Constituição”. Ambos professores talentosos, integram a “Escola de Direito do Maranhão”, a nossa velha Faculdade, depois denominada Curso de Direito da Universidade Federal do Maranhão, que daqui a 2 anos celebrará o centenário de fundação.
Para o auditório lotado, o primeiro palestrante comunicou significativas alterações na legislação processual penal, e como se dá a influência de textos bíblicos na elaboração legislativa e na interpretação das leis. Não tive a oportunidade de dizer-lhe das minhas suspeitas: embora os romanos tenham feito a separação entre Direito e Religião, a junção retornou na Idade Média, e novamente desfez-se, aparentemente, na Renascença europeia. Penso, pelas origens, as duas manifestações culturais guardam muitas ligações, de quando em vez afloradas.
Exemplo disso, são os preâmbulos das constituições brasileiras, todos invocando a proteção de Deus. O Supremo Tribunal Federal decidiu: eles não são mera peça retórica, integram o Direito Positivo, logo, é afoito falar-se em Estado laico, mesmo depois das revoluções francesa e da Independência norte-americana.
Na oportunidade evidenciou-se, a primeira Constituição do Brasil independente, a Imperial de 1824, dispunha no artigo 161 sobre a obrigatoriedade da Conciliação, antes da propositura da ação judicial. Como provê a sabedoria bíblica, nada há de novo sob a face do sol. As normas, os modos e os costumes vão e voltam. O Código de Processo Civil-CPC, vigente a partir do próximo ano, prescreve a obrigatoriedade da Conciliação, precedendo a propositura das demandas judiciais, forçando os tribunais a instalarem Centros de Conciliação e Mediação para cumprirem o preceito. Recentemente os corregedores dos tribunais estaduais pediram maior prazo para o CPC entrar em vigor. Alegam a necessidade de adequar vários procedimentos previstos pela lei futura à realidade das Cortes estaduais.
O ministro Reinaldo em sua bem-sucedida exposição lembrou, tramitam 100 milhões de processos nos tribunais brasileiros, para o exame de 16.900 juízes, tornando impossível a solução dos conflitos pela via judicial, face a constante reposição do estoque pela interposição de novas demandas. Aludiu a criação dos juizados especiais estaduais e federais, permitindo o acesso dos mais pobres a prestação jurisdicional. Pela menor complexidade do rito e restrição a um sem número de recursos, melhoraram a eficiência do Poder Judiciário. Mas a suas agendas estão superlotadas.
Na esfera penal a situação é dramática. A população carcerária é de 640 mil pessoas, destas 41% estão presas provisoriamente, preventivamente, por flagrante, temporariamente. 130 mil em prisão domiciliar. Totalizando 750 mil pessoas. 300 mil mandados de prisão esperam cumprimento, com a potencialidade de chegar-se a um milhão de pessoas.
Reinaldo pergunta: “o que faremos com tantas pessoas? ” A disponibilidade atual é de menos de 400 mil lugares para presos. Tem-se portanto o dobro de pessoas nesse espaço.
Lançou o desafio a reinvenção do quadro da Justiça Criminal com novas experiências de ressocialização. Está provado, a cultura da beligerância e da litigância não resolverá nas áreas cível e penal a questão crucial da eficiente prestação jurisdicional a sociedade brasileira, que paga com impostos uma estrutura onerosa. Ano passado gastou 70 bilhões de reais, 90% com salários.
A Conciliação existia na Constituição Imperial e no atual Código de 73. Cumprindo a lógica da cultura brasileira, há leis que pegam, e outras não. Como adverte o professor Kazuo Watanabe, novas leis surtem efeito no longo prazo. Mas aí estão o novo Código de Processo Civil, as leis de mediação e arbitragem, que poderão reduzir o déficit de Justiça, desde que a sociedade participe, aderindo a cultura da paz, da conciliação, não postulando por mais sentenças do Estado-juiz. O Seminário do dia 18 foi exitoso, o presidente Raimundo Marques e o Desembargador Alberto Vieira da Silva testemunharam os bons frutos da Escola de Direito do Maranhão.