Fábio Feldmann*
Falta pouco. Em dezembro, Paris sediará a 21ª Conferência das Partes das Nações Unidas para Mudanças Climáticas (COP), com o propósito claro de se estabelecer acordo internacional que assegure que o aumento da temperatura média do planeta até o fim do século não supere os 2°C. Esse limite foi estabelecido em Copenhague, em 2009, em uma das COPs mais malsucedidas em termos de resultados e de organização. Existe, neste momento, uma expectativa muito positiva em relação aos objetivos da COP 21, por várias razões. A primeira, e absolutamente importante, é o fato de que há agora pouca incerteza sobre a mudança do clima por parte da comunidade científica, restando clara a necessidade de calendário com datas para a redução efetiva do lançamento de gases efeito estufa (GEE) na atmosfera.
A grande novidade nessa etapa de negociação é a obrigatoriedade dos países de apresentar seus INDCs — Intended Nationally Determined Contributions (Contribuição Nacionalmente Determinada Pretendida, em português) para o Secretariado da Convenção de Mudança do Clima, a quem caberá a consolidação na COP 21. Esses INDCs passarão, a partir de então, a ser vinculantes, tornando-se um mapa para que os países caminhem na direção de uma economia de baixo carbono.Vários países já apresentaram seus INDCs, a exemplo de EUA, México, China e União Européia.
O Brasil está prestes a divulgar a sua proposta, valendo registrar que o país tem obtido bons resultados em termos de redução de desmatamento, mas, em relação a energia, indústria, agricultura e transporte, o nosso desempenho está muito aquém do desejado. Soma-se a isso o fato de que, com a recessão econômica em curso, nossas emissões encontram-se em patamares mais baixos, mas pelo motivo errado. Caso estivéssemos em plena atividade econômica, certamente precisaríamos de controle e fiscalização redobrados.
Se analisarmos as propostas dos países será fácil constatar que, em termos quantitativos, o que está posto na mesa das negociações é muito pouco ambicioso, dada a urgência dramática de redução das emissões. Um bom exemplo é a China, país campeão de emissões, que propõe aumentá-las em termos absolutos até 2030 e, a partir de então, se compromete a reduzi-las. As outras INDCs também não revelam grandes compromissos. Sob a perspectiva quantitativa, não há muito o que se esperar de Paris. Por outro lado, o fato de se estabelecer um acordo vinculante, é visto por grande parte dos negociadores como avanço concreto.
Também é relevante assinalar que a partir de Paris todos os países vão se debruçar sobre os respectivos orçamentos de carbono (carbon budget). No caso do Brasil, muitas oportunidades são vislumbradas em termos de restauração florestal, amparada legalmente no recente Código Florestal, ficando evidente que o país tem muitos desafios em termos de criar as condições para que a nova economia florestal e de carbono seja implementada. Aliás, uma das críticas mais pertinentes ao Protocolo de Kyoto diz respeito ao fato de que nele foi dada pouca atenção aos esforços de conservação de estoque de carbono nas florestas, bem como na geração de créditos relativos ao seu seqüestro.
Como observador das negociações desde o início, creio que a COP 21 apresenta, de maneira geral, condições melhores para que tenhamos avanços efetivos. A começar pelo setor empresarial, que, ciente dos impactos do aquecimento global, demanda dos negociadores sinais inequívocos do que se chama precificação do carbono. Em outras palavras, o custo da emissão do carbono deve ser incorporado no modelo de negócios das empresas e das respectivas cadeias produtivas.
Os EUA, no segundo mandato do presidente Barack Obama, transformaram-se em país disposto a enfrentar no plano doméstico os desafios da mudança do clima. Como consequência, sua diplomacia está disposta a ter papel positivamente decisivo nas negociações, ao contrário do período republicano na Casa Branca. A China, como dissemos, também tem incorporado no plano doméstico a dimensão climática em seu planejamento estratégico, o que tem grande peso para o sucesso de Paris.
Do Brasil esperam-se ambição e audácia nas negociações internacionais, como já o fez em Kyoto e em Copenhague: sugeriu, em 1997, sob gestão de FHC, o que veio a se tornar à época o inovador Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) e, em 2009, sob a gestão de Lula, assumiu corajosamente compromissos voluntários refletidos na Política Nacional sobre Mudança do Clima. A incógnita é como se comportará nas atuais circunstâncias de crise econômica, baixa credibilidade e governança pífia.
*Consultor na área de Sustentabilidade e Mudanças Climáticas, ex-Secretário Geral do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas e ex-secretário de Meio Ambiente do Estado de São Paulo