As regras constam do projeto de Lei de Responsabilidade das Estatais, cujo relatório preliminar foi aprovado nesta quarta-feira (19) em reunião da comissão mista encarregada da elaboração da matéria. O projeto irá agora a exame das duas Casas do Congresso, que poderão aprimorar o texto apresentado pelo relator, deputado Arthur Oliveira Maia (SD-BA).
As normas serão aplicadas a toda e qualquer empresa pública e sociedade de economia mista, da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, inclusive as que exploram atividade econômica em sentido estrito, as que prestam serviços públicos e as que exploram atividade econômica sujeita ao regime de monopólio da União.
– Nos últimos tempos, em virtude do escândalo da Petrobras, ficou evidenciado, mais do que nunca, a necessidade de que haja uma atenção maior com a governança das empresas estatais. Acreditamos que o relatório representa a linha média do sentimento. Haverá oportunidade de que emendas novas sejam feitas, e o assunto, aprofundado – afirmou o deputado Arthur Oliveira Maia.
Com 94 artigos, o anteprojeto da Lei de Responsabilidade das Estatais incorpora propostas que já se encontravam em tramitação no Senado, como o substitutivo ao Projeto de Lei do Senado (PLS) 167/2015, do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), que preside a comissão mista; o PLS 343/2015, do senador Aécio Neves (PSDB-MG); e o anteprojeto apresentado pelos presidentes da Câmara, Eduardo Cunha, e do Senado, Renan Calheiros, quando do lançamento da comissão.
Transparência
Presente à reunião da comissão mista, o presidente do Senado, Renan Calheiros, manifestou total apoio ao projeto de lei, e ressaltou que a transparência não pode circunstancialmente ser conveniência para qualquer aprimoramento constitucional.
– Acho que não só com relação à Lei de Responsabilidade das Estatais, mas com relação às saídas para o Brasil, temos que perseverar, acreditar, fazer o que precisa ser feito para retomarmos o desenvolvimento e recuperarmos a condição de fazer a economia crescer. Essas saídas não estão acabadas, mas são uma demonstração de que nós já começamos a caminhar, priorizando aquilo que, de maneira suprapartidária, caracteriza o interesse nacional – disse Renan.
O senador José Serra (PSDB-SP) explicou que as emendas de sua autoria acatadas pelo relator coadunam-se ao “espírito” do projeto, pois criam restrições à ocupação de cargos nas estatais por pessoas sem a devida qualificação técnica.
– A comissão produziu um trabalho bom. Estamos como num Titanic. Se o choque com o iceberg é inevitável, vamos jogando o bote salva vida para o lado para sobreviver. É o caso desse projeto, que preenche uma lacuna demandada pela Constituição. Se não dá para salvar o governos, vamos, pelo menos, resolver problemas pontuais gravíssimos. Tomara que o exemplo se desdobre e se repita em outros setores do país e da legislação, que tomemos essa comissão como exemplo – afirmou Serra.
Serra também sugeriu à comissão mista a identificação de todas as estatais, como forma de recomendar ao governo federal a extinção das empresas que deveriam ser fechadas. O senador disse que há hoje 140 empresas estatais apenas no plano federal.
– Tem uma quantidade inacreditável. Tem, por exemplo, uma empresa para o trem bala, que continua lá, gastando – afirmou o senador.
O parlamentar disse ainda que as estatais deveriam ser expressamente proibidas de fazer publicidade para produtos sem concorrência no mercado.
O senador Antonio Anastasia (PSDB-MG) também saudou o projeto, mas defendeu o aprimoramento da proposta, como forma de evitar futuros questionamentos judiciais. Ele considera que o texto determina a possibilidade de aplicação unilateral de multas por parte de empresas de direito privado, que, a rigor, não podem impor penalidade unilateralmente a outrem.
– Temos empresas que não deveriam ser empresas, que deveriam ser autarquias ou secretarias, mas, por deturpação, ficam nessa condição – disse Anastasia.
O deputado Danilo Forte (PMDB-CE) também saudou o projeto, mas defendeu o aprimoramento da proposta no que tange ao controle de gerenciamento das estatais.
Antes de encerrar a reunião, Tasso Jereissati disse que projetos como o da Lei de Responsabilidade das Estatais devem provocar mudanças nos próximos anos.
– No futuro, à medida que a governança comece a funcionar de maneira adequada, moldando não só a lei, mas a cultura da empresa. A falta de controle de estatais causou talvez o maior escândalo da história do Brasil – afirmou.
Fiscalização e controle
O projeto define as atribuições mínimas de fiscalização e controle a serem exercidas em participações em sociedades empresariais nas quais as sociedades de economia mista e empresas públicas não detenham o controle acionário. As estatais deverão adotar práticas de governança e controles proporcionais à relevância, à materialidade e aos riscos do negócio do qual são participantes.
No texto também são definidos quais os deveres e responsabilidades do ente estatal quando sua participação acionária na sociedade é minoritária. A inexistência atual de regras que estabeleçam esses requisitos não apenas gera insegurança jurídica como tolhe a atuação de órgãos de controle e dificulta exigir do ente estatal fiscalização e controles proporcionais à sua participação, observa Arthur Oliveira Maia.
O texto do relator também prevê a possibilidade de que a estatal disponha de programa interno de formação gradual de líderes. O objetivo é preparar empregados com o mínimo de dez anos de experiência profissional para assumir futuros cargos de destaque e de direção da empresa. O projeto também limita a atuação da estatal ao ato que fundamenta a sua criação, para evitar que as empresas atuem em setores alheios à sua atividade ou sejam ainda usadas no controle da inflação, a exemplo de episódios recentes envolvendo a Petrobras.
O projeto traz ainda dispositivos sobre licitações, contratos e fiscalização pelo Estado e sociedade, e enumera disposições aplicáveis somente às empresas estatais que atuam no setor produtivo. A restrição se justifica visto que as estatais do setor de serviços já se submetem às regras próprias dos órgãos e entidades públicos. As disposições finais do projeto buscam harmonizar o texto da proposição ao arcabouço jurídico vigente.
Outras regras
O texto aprovado estabelece que as despesas com publicidade e patrocínio da empresa pública e sociedade de economia mista não ultrapassarão, em cada exercício, o limite de 1% da receita bruta do exercício anterior, nem superarão 35% das despesas aplicadas em pesquisa e desenvolvimento no mesmo período.
As estatais também deverão implantar uma área de compliance e riscos, diretamente vinculada ao diretor presidente, além de um comitê de auditoria estatutário. Os valores relacionados à dispensa de licitação poderão ser alterados pelo chefe do Poder Executivo, desde que submetido a exame do conselho de administração. E qualquer atividade que as estatais vierem a exercer fora de sua atuação principal terá que ser publicada no plano anual de negocio das empresas.
De acordo com o projeto, a sociedade de economia mista, durante o prazo de quatro anos, a contar da vigência da lei, poderá manter ações preferenciais em seu capital, vedada a emissão de novas ações preferenciais. Ela também terá o prazo de dois anos para manter pelo menos 25% de suas ações em circulação no mercado. As estatais terão o prazo de dez anos para efeitos da prevalência de suas ações ordinárias.