CONSTITUIÇÃO

Poder de veto no STF

O Supremo Tribunal Federal já foi palco de grandes debates. Como exemplo, podemos citar temas como biografias não autorizadas, aborto em caso de feto anencéfalo e o financiamento privado de campanhas eleitorais. Foram temas de grande importância e abriram caminhos para que demandas da sociedade encontrassem eco naquela Corte. Recentemente comemoramos a decisão da Suprema […]

O Supremo Tribunal Federal já foi palco de grandes debates. Como exemplo, podemos citar temas como biografias não autorizadas, aborto em caso de feto anencéfalo e o financiamento privado de campanhas eleitorais. Foram temas de grande importância e abriram caminhos para que demandas da sociedade encontrassem eco naquela Corte. Recentemente comemoramos a decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos a favor do casamento gay. Um passo já dado no Brasil, em 2011, com a decisão favorável à união civil entre casais do mesmo sexo.

De Casa da Suplicação do Brasil, em 1808, a Supremo Tribunal Federal, são mais de dois séculos como guardião maior dos preceitos constitucionais. Mais especificamente na questão da lei eleitoral, a Corte já se manifestou sobre várias questões complexas, sempre com coerência e respeitando opiniões divergentes do debate político e de movimentos organizados da sociedade civil.

Foi assim quando da ação que questionou a constitucionalidade da cláusula de barreira há oito anos. O mecanismo restringia o direito ao funcionamento parlamentar, o acesso ao horário gratuito de rádio e televisão e a distribuição dos recursos do Fundo Partidário. A ação, impetrada pelo PCdoB, sustentava que uma lei ordinária não poderia estabelecer restrições que acabavam por submeter os partidos a tratamento desigual. A ação foi vitoriosa, mas ouso dizer que o tratamento desigual persistirá enquanto o poder econômico influenciar os resultados eleitorais.

Há no STF previsão regimental semelhante à da Câmara dos Deputados, o pedido de vistas. Na Câmara, o instrumento é utilizado quando um projeto em tramitação nas comissões é colocado em votação e um deputado não se encontra seguro o suficiente sobre o tema para votar, ou, ainda, quando diverge do parecer apresentado e gostaria de se manifestar contrariamente. Os deputados que pedem vista têm o prazo de duas sessões para tal manifestação. Findo o prazo, o parecer volta à pauta e é votado, com ou sem a apresentação de voto por parte do parlamentar que pediu vistas.

No Supremo, o prazo é o mesmo, mas, como não é observado, o pedido de vistas se transformou em poder de veto. Na prática, se um ministro não concorda com o rumo de determinada votação e deseja impedir que seja concluída, basta pedir vistas e, mais de um ano depois, o tema fica num limbo jurídico. A indefinição de matéria já votada pela maioria coloca a ação na mesma situação de Dante Alighieri, com a diferença de que não aparece sequer uma Beatriz para reverter o quadro. Uma comédia nada divina.

Se, em 1907, algum ministro daquela Corte tivesse se utilizado desse subterfúgio, talvez o banimento da família real ficasse pendente de votação até que fosse eleito um parlamento que pusesse fim ao decreto que o estabeleceu e, finalmente o habeas corpus impetrado em favor de Luís d’Orleans e Bragança, príncipe da Casa Imperial do Brasil, pudesse ser concedido. Quem sabe, então, a monarquia fosse restabelecida.

É razoável que um ministro queira se informar melhor sobre determinado tema antes de manifestar o voto. O que não é aceitável é que isso demore mais de um ano — mais precisamente 455 dias. Com resultado de seis votos favoráveis e um contra, o STF caminhava, majoritariamente, pelo fim do financiamento empresarial de campanhas eleitorais no Brasil. Enquanto o STF aguarda que o autor do pedido de vistas retorne do processo, a Câmara dos Deputados se apressa, passando por cima de normas regimentais, para inscrever na Constituição o financiamento privado de campanhas.

O processo democrático do voto foi interrompido pelo pedido de vistas e a sociedade clama por um mínimo de decência de quem se alegava insuficientemente informado para se manifestar. Se um ano não bastou para tanto, talvez o ministro deva considerar pedir ajuda aos universitários.

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