O presidente da Câmara dos Deputados é um dos centros de gravitação da política nacional. Sob a sua coordenação, projetos polêmicos, como o da redução da maioridade penal, têm sido discutidos e aprovados. O último, versando sobre a imputação de responsabilidade penal aos menores de 18 anos foi objeto de Mandado de Segurança perante o Supremo Tribunal Federal-STF. Um grupo de parlamentares de partidos distintos, juntou-se para impedir o prosseguimento do processo legislativo, argumentando que a presidência da Câmara atropelara a Constituição e o Regimento da Casa Legislativa.
Sem adentrar o exame do mérito, o ministro Celso de Mello não concedeu a liminar, por se tratar de matéria de competência do Congresso, ainda em tramitação. Concedê-la, seria invadir as atribuições do Parlamento. Os parlamentares, que tanto se queixam da judicialização da política, são os principais responsáveis por sua ocorrência. Quando se encontram em minoria nas votações congressuais, batem as portas do STF para a decisão dos seus impasses.
Que os resolvam internamente. Formalizada a lei, aí sim, a Suprema Corte, guardiã da Constituição, julgará se ela está ou não de acordo com o seu espírito. Aos ministros do STF aplica-se o mesmo preceito. Não devem invadir as casas legislativas na tentativa de promoverem a aprovação de diplomas legislativos. Tudo em nome da separação e equilíbrio entre os poderes da República.
Na impetração do Mandado de Segurança, viu-se partidos chamados de esquerda e de direita unirem-se para impedir a continuidade do processo legislativo. Indicam dois aspectos: primeiro, as denominações de esquerda e direita não se aplicam aos partidos políticos nacionais. Segundo, as agremiações partidárias não conseguem expressar as reais tendências ideológicas da população brasileira.
Talvez seja oportuno, pelo menos provisoriamente, o emprego da denominação liberais e conservadores, prevalecente durante o Império, com as atualizações devidas. O Presidente da Câmara seria dos líderes da onda conservadora que avassala o país, decorrente da crise econômica e dos seus efeitos sociais.
São reflexões oportunas, no momento em que repercute nos meios de comunicação a entrevista do polêmico presidente da Câmara sobre a implantação do parlamentarismo como regime de governo, a partir de 2019, com o sucessor da atual presidente da República. Implantá-lo agora, seria um verdadeiro “golpe branco”, pois reduziria os poderes que lhe foram outorgados no último pleito presidencial.
Há certo consenso entre os constitucionalistas e cientistas políticos em torno da opinião de que o regime parlamentarista de governo é mais moderno e democrático, implicando na desconcentração unipessoal do poder, e em sua capacidade de superação de crises políticas, com a dissolução de gabinetes e a convocação de novas eleições. Estariam os defensores da tese impressionados com a atual crise econômica, que também é social e política, buscando saídas imediatas. Se for assim, estaremos correndo o risco de remendos, buscando falsas soluções através da legislação de ocasião.
Foi assim em agosto de 1961, com o impasse gerado pela renúncia do presidente Jânio Quadros e o veto dos ministros militares a posse do vice João Goulart- Jango. A saída encontrada, mudar o regime de governo para permitir a posse de Jango. O então governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola, artífice da Campanha da Legalidade, denunciou o golpe, mas a negociação prosseguiu no Congresso, sob a coordenação de Tancredo Neves. O parlamentarismo logrou aprovação como saída para a crise político-militar. Jango tomou posse diminuído de poderes, mas em janeiro de 1963, convocou-se plebiscito e o Presidente da República derrotou o parlamentarismo, apoiado inclusive pela oposição, pelos candidatos à Presidência da República, que desejavam conquistá-la com os poderes do presidencialismo.
No curto período de vigência do regime parlamentarista de governo, aprovou-se leis relevantes alterando o regime previdenciário; o Código Civil; a criação de estatais; a regulamentação da remessa de lucros das empresas estrangeiras para as suas matrizes. Apesar das sucessivas mudanças de gabinetes houve relativa estabilidade política.
Trinta anos depois, na vigência da Constituição de 88, convocou-se novo plebiscito sobre a forma de governo, em 1993, e o parlamentarismo novamente sofreu derrota, sob a inspiração dos aspirantes a Presidência da República.
Agora, de olho na crise, retorna o tema do parlamentarismo, como meio de contorná-la. O assunto é vasto, para começar, convém fazer a colocação essencial: sem partidos políticos fortes e representativos da sociedade civil, ele será inviável. Eles existem? Voltaremos ao assunto.