No último 28 de maio o Senado Brasileiro aprovou a Medida Provisória de Número 668 do Governo Federal que propunha a inclusão de mais 74 municípios, além dos atuais 1133, no semiárido brasileiro. Segundo o texto da medida que vai para a sansão da Presidente da República o Ceará terá mais 32 municípios, Alagoas mais 22 e a Paraíba mais 20 incluídos no semiárido. Muito bom para as populações.
Com esta inclusão os municípios incluídos terão, como os demais já detém, o acesso às políticas públicas e financiamentos governamentais diferenciados, absolutamente necessários face às carências que rondam todos eles. Dentre outras vantagens esses municípios também passarão a ser beneficiados com descontos na taxa de juros ao serem contemplados com os financiamentos advindos dos recursos do Fundo Constitucional do Nordeste (FNE). Esses municípios também terão prioridade no acesso aos recursos deste Fundo. Serão também beneficiados com os recursos prioritários do PRONAF. Participarão de uma série de benefícios sociais diferenciados que ajudam amenizar as condições de vida das populações que ali sobrevivem.
As áreas definidas no ecossistema do semiárido apresentam características climáticas, de solos, de cobertura vegetal e, por consequência, de fauna nativa bastantes características. As Nações Unidas caracterizam as regiões do planeta de acordo com esta sinergia de características. Em 1948 foi realizado um trabalho seminal de autoria de Thornthwaite. Aquele trabalho, mundialmente acatado, gerou o índice de aridez (IA) no qual as Nações Unidas se baseiam para fazer a classificação das regiões. O IA é uma equação singela em que no numerador se encontra o volume de precipitação de chuvas que cai numa determinada área num período de tempo e, no denominador situa-se o que é tecnicamente chamado de evapotranspiração potencial. Este nome que pode parecer estranho para os leitores, nada mais é do que a água que evapora dos solos pela ação da incidência dos raios solares, do vento e aquela que as vegetações eliminam também devido às ações do calor e do vento. Mais intensa a insolação, mas expostos o solo e a vegetação às ações dos raios solares, dos ventos e menores os níveis de precipitação de chuvas, mas dramática será a situação da região. Ou seja, se chover menos do que a capacidade do solo e das plantas de reter água, haverá problemas numa escala crescente. As piores situações em relação a esta escala são os climas hiper-aridos, áridos e semiáridos. São as chamadas “Terras Secas”.
Não obstante existir a definição técnica de semiárido, mundialmente consolidada e aferida pelo IA, observa-se uma notável confusão, em nível de Parlamento e dos Governos, no que concerne à aplicação do conceito para a caracterização dos municípios do semiárido brasileiro. O que transparece é que prevalecem mais critérios políticos, o que não seria ruim, se não viessem contaminados por interesses de poderosos da região que costumam sobrepor suas demandas privadas às evidencias técnicas e aos interesses mais gerais das populações.
A propósito, o Banco do Nordeste do Brasil contratou uma equipe de técnicos de alto nível que, em 2005 fez um estudo criterioso das características dos municípios do Nordeste visando a delimitação do semiárido. Segundo aquele estudo, o Ceará, por exemplo, deveria ter 181 dos seus 184 municípios incluídos no semiárido. Este estudo foi solenemente ignorado naquele mesmo ano em que foi feito o “Redimensionamento do Semiárido pelo Ministério da Integração Nacional”. Por este documento o Ceará teria apenas 150 municípios. Agora, dez anos depois, o Governo Federal, do qual o Ministério faz parte, sugere que apenas dois municípios do Ceará não estão no semiárido. A pergunta que se faz então é: O que mudou?
O que mudou foi a pressão política. Senadores do Ceará, principalmente, apoiadores do atual Governo Federal, e sob o apelo de uma seca que perdura há quatro anos, levaram o caso como consumado para o Governo Federal. Contrataram às pressas entidades que fizeram um documento técnico que serviu para a demanda que é política. Claro que é bom incluir os municípios no semiárido. O que se coloca em dúvida é a forma como se deu esta conquista. Ao sabor de uma convulsão social em que o estudo técnico, que deveria ser a base de tudo, serve apenas como âncora secundária de apoio.
Em trabalho que eu e uma equipe elaboramos, mostramos que no Maranhão têm ao menos 15 municípios com IA incluído na faixa que define o semiárido. Esses municípios exibem indicadores sociais e econômicos piores do que aqueles que prevalecem naqueles já incluídos no semiárido brasileiro. Na Tese que elaborei recentemente para submeter-me ao concurso objetivando ascender a Professor Titular na UFC estão mostrados todos esses municípios e os seus indicadores. Na minha avaliação o que falta é uma postura mais incisiva dos parlamentares e do Governo do Maranhão para fazer valer algo que é tecnicamente demonstrável. Podemos até, se for do interesse do Governo do estado, atualizar o estudo pelo Laboratório do Semiárido da UFC para que possamos consolidar os fundamentos para demandar algo que é justo. Afinal aproximadamente um milhão de conterrâneos sobrevivem sob aquele ecossistema em condições precaríssimas.