Em 2003, pouco antes da nomeação de Carlos Ayres Britto para o Supremo Tribunal Federal-STF, estávamos nós, os diretores das escolas de governo, rede imaginada pelo professor Fábio Konder Comparato, reunidos em Aracaju, para abordar extensa pauta sobre a educação política nos estados brasileiros. Procurador do Tribunal de Contas do Estado, professor de Direito Constitucional, o futuro ministro contou com o aval do professor Comparato, que telefonou ao Presidente Lula, ratificando referências sobre o postulante ao cargo. Também é verdade, era conhecido do chefe do Executivo, por conta de sua militância no Partido dos Trabalhadores, no período inicial, chegando a ser candidato a deputado Federal, em 1990.
Cometo esta inconfidência com o propósito de demonstrar a inutilidade das suspeições lançadas sobre o advogado Luiz Edson Fachin quando da submissão do seu nome ao Senado, de acordo com o processo constitucional precedente a sua nomeação ao STF. As ligações partidárias por si só não se constituem em impedimento para a isenção do juiz da Corte Suprema.
À noite Ayres Britto ofereceu-nos jantar em uma Pizzaria de Aracaju e tivemos oportunidade de em conversa informal constatar o seu elevado saber jurídico, ao lado da simplicidade no trato. Convenceu-nos da procedência da sua indicação para o STF, que se confirmou ao longo da sua judicatura, quando votou com isenção e independência, contrariando interesses do governo, em nome da fidelidade aos princípios constitucionais a que jurara lealdade.
Defendeu teses importantes em relatórios e votos, um deles, no Julgamento da Arguição de Preceito Fundamental (ADPF) 130, determinou que o plenário do STF extinguisse a Lei de Imprensa- nº 5.250/67, diploma espúrio, entulho autoritário, que convivia com a Constituição de 1988. Deixou claro, por ocasião do julgamento, o caráter absoluto da Liberdade de informação, na forma de liberdade de imprensa, pela sua condição de porta-voz da sociedade, a única capaz de regulá-la em decorrência de suas escolhas.
Na sessão de julgamento em 30 de abril de 20009, enfatizou a inteira incompatibilidade entre a então vigente Lei de Imprensa e os princípios da Constituição Federal. Adiantou: os excessos cometidos, caracterizando difamação, injúria, calúnia, devem ser reparados através de procedimentos previstos na legislação criminal e cível aplicável.
Desde a década de noventa do século passado, a discussão arrastou-se no Congresso Nacional, destacando-se o Anteprojeto de Lei de Imprensa nº 1.111/91, de autoria do senador Josaphat Marinho, relatado pelo então deputado Vilmar Rocha. Não obstante a respeitabilidade de ambos, o texto não logrou aprovação, não se transformou em Lei. O crescimento de novos meios de informação, incluindo a ampliação da internet, contribuiu para a paralização das tentativas de normatização da matéria. Ayres Britto chamou a atenção para auto –aplicabilidade e eficácia imediata dos preceitos asseguradores da Liberdade de Imprensa, contidos nos artigos 5º, incisos IV, V, XIII, XVI, e 220 da Constituição Federal.
Ontem, o Centro de Estudos Constitucionais e Gestão Pública e a Associação Maranhense de Advogados-AMAd, promoveram a palestra digital de Ayres Britto alusiva ao Dia Mundial da Liberdade de Imprensa. Em seguida, lançou-se mais um número da “Revista Juris”, contemplando relevante conteúdo produzido pela comunidade jurídica maranhense.
A palestra revelou-se oportuna para a celebração da data universal da Liberdade de Imprensa, nessa conjuntura em que a internet, não sujeita ao poder econômico ou político, transparece as manifestações da cidadania, gerando enormes repercussões no campo das atividades políticas. A nominada “classe política ” vem sendo questionada pela população, sob a acusação de utilizar-se do Estado para fins particulares.
Será, portanto, inútil o Estado tentar controlar as comunicações da internet, internacionalizada e responsabilizada pela queda de diversos regimes políticos no mundo inteiro. Recentemente esteve no Brasil o professor espanhol Manuel Castells, para participar do ciclo de palestras “Fronteiras do Pensamento”. Considerado o maior especialista em sociologia das comunicações, e redes sociais, destacou na ocasião, as deformações do Estado patrimonialista brasileiro e a importância do pleno exercício da liberdade em todas as mídias.
Concluo, as mídias complementam-se, e podem ser todas sintetizadas na Liberdade de Imprensa, alma e coração de todos os povos, e, em especial dos brasileiros.