440 mil afastados

Mercado de trabalho: Afastamentos por transtornos mentais dobram em dez anos

Informações do Ministério da Previdência Social evidenciam que, na comparação com 2023, os números de 2024 impressionam, com um crescimento de quase 67%.

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Há mais de 10 anos atrás, em 2014, quase 203 mil brasileiros foram afastados do seu cargo de trabalho devido episódios depressivos, transtornos de ansiedade, reações a estresse grave e outras complicações relacionadas à saúde mental.

Dez anos depois, já no ano passado, os registros destes casos mais que duplicaram, elevando o número para 440 mil afastamentos relacionados a transtornos mentais e comportamentais, tal quantidade registrou recorde da série histórica.

Informações do Ministério da Previdência Social evidenciam que, na comparação com 2023, os números de 2024 impressionam, com um crescimento de quase 67%.

Causadores

Grande parte dos afastamentos ano passado foram decididos devido transtornos de ansiedade (141.414), seguidos por episódios depressivos (113.604) e por transtorno depressivo recorrente (52.627).

Entre as causas, também aparecem transtorno afetivo bipolar (51.314), transtornos mentais e comportamentais decorrentes do uso de drogas e outras substâncias psicoativas (21.498) e reações ao estresse grave e transtornos de adaptação (20.873).

Também fazem parte do número de afastamentos causados por doença mental em 2024 casos de esquizofrenia (14.778), transtornos mentais e comportamentais provenientes do uso de álcool (11.470) e uso de cocaína (6.873) e transtornos específicos da personalidade (5.982).

Como forma de comparação, ano passado, os afastamentos decorrentes por transtornos de ansiedade, cresceram mais de 400% em relação a 2014, momento em que somavam 32 mil. Já os afastamentos por episódios depressivos quase dobraram em uma década.

Entendimento

Para o professor de psicologia da Universidade Federal da Bahia e membro do Conselho Federal de Psicologia Antonio Virgílio Bittencourt Bastos, os números evidenciam uma realidade que já vinha sendo monitorada por especialistas: uma crescente crise de saúde mental no país.

Os indicadores de adoecimento e de sofrimento psíquico extrapolam o mundo do trabalho. A crise de covid-19 nos trouxe essa pós-pandemia. Vivemos numa sociedade adoecida. Houve uma ruptura muito profunda da forma como vivíamos e vivemos, em certa medida, sequelas dessa experiência traumática.”

Fora isso, a gente vive, na sociedade global, um contexto de mudanças muito profundas. Nos modos de interagir, na digitalização da vida, nos avanços tecnológicos que reestruturam toda a nossa dinâmica social. Esse conjunto de mudanças sociais, tecnológicas e econômicas geram um mundo muito mais inseguro e incerto”, concluiu.

Para Bastos, parte da crise de saúde mental é resultado de uma conjuntura maior, de reestruturação e de dinâmica acelerada de alterações. 

“Há um processo em curso. Estamos no meio de um processo muito intenso de reestruturação da vida em sociedade e é natural, é esperado que as pessoas reajam a essas mudanças com dificuldades”.

“Sem dúvidas, a gente tem fatores mais específicos no contexto de trabalho”, afirmou. “Esse impacto da revolução tecnológica, reestruturando postos de trabalho, redefinindo modelos de gestão, precarizando o trabalho e fragilizando vínculos. Isso, de alguma forma, torna a situação no trabalho específica, em que essa crise assume proporções, tonalidades e características próprias.”

Ao lado dessa dinâmica de transformação do mundo do trabalho e de mudanças drásticas, você também convive com modelos de gestão e práticas arcaicas, tradicionais. Temos uma cultura que favorece práticas mais autoritárias, que levam a maior quantidade de tensões e conflitos e relações interpessoais mais difíceis.

Saúde mental e qualidade de vida

De acordo com Bastos, devido toda esta situação, estabelecer a qualidade de vida se tornou um das missões mais desafiadoras desse milênio. “Como construir um mundo mais sustentável, harmônico, um mundo em que as pessoas conseguem equilibrar vida familiar, vida pessoal. Isso tudo é um grande desafio”.

Para ele, o momento crítico na saúde mental das pessoas chama a atenção e evidencia a importância em ações do estado, para assegurar apoio e suporte através de programas específicos, que não sejam de curto prazo. 

“Há soluções paliativas. Programas que não vão na raiz do problema. Você vê uma série de ações, projetos e programas desenvolvidos, mas que lidam com sintomas e consequências do problema. Não vão na raiz, no modelo de gestão, nos processos de trabalho“, explica.

Bastos também defende a existência de mudanças profundas: “[é necessário] mexermos em profundidade na forma como o trabalho está organizado, na forma como as relações estão estabelecidas. Nossa preocupação é não imaginar que basta dar assistência psicológica e o problema será solucionado.”

Fonte: Agência Brasil

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