Indígenas podem usar etnia como sobrenome em registros de documentos
As mudanças possibilitam o registro de naturalidade como sendo da aldeia ou território onde a pessoa nasceu, ao lado do município onde a localidade está situada.
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Nesta terça-feira (11), o plenário do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), confirmou que agora pessoas indígenas podem inserir em cartório, no registro civil, o nome de sua etnia como sobrenome. As mudanças possibilitam o registro de naturalidade como sendo da aldeia ou território onde a pessoa nasceu, ao lado do município onde a localidade está situada.
As novidades fazem parte de uma alteração na resolução que regulamenta o registro civil de indígenas nos cartórios do país. A mudança do ato normativo havia sido aprovada em dezembro também pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), órgão que atua na disciplina da atuação dos cartórios. O envolvimento do CNMP acontece devido atribuição do Ministério Público de proteger o interesse dos povos tradicionais, assim como é determinaso pela Constituição.
Após o referendo dos conselheiros do Ministério Público, o novo ato normativo foi assinado pelos presidentes do CNJ, Luís Roberto Barroso, e do CNMP, o procurador-geral da República, Paulo Gonet.
A nova medida visa “preservar o direito à identidade e à integridade cultural dos povos indígenas e o imperativo de respeito aos seus costumes, línguas, crenças e tradições”, afirmou o procurador da República.
Antes das mudanças, era preciso a autorização de um juiz para que a etnia da pessoa indígena fosse adicionada em seus documentos oficiais, como identidade e certidão de nascimento. Após as alterações, basta que o próprio indígena solicite a alteração diretamente pelo cartório.
Caso seja solicitado, os novos registros poderão ser lavrados ainda em língua nativa. Em situações de dúvida a respeito de grafias, o registrador poderá consultar duas pessoas que tenham conhecimento da língua em questão.
Capacidade civil
As novidades também deram fim ao uso dos termos “integrado” e “não integrado”, que ainda eram postos nas certidões de nascimento de pessoas indígenas. Para os conselheiros do CNJ que debateram o assunto, tais questões não são compatíveis com a Constituição de 1988, que afirma não pode haver nenhuma condição que interfira na capacidade civil plena dos indígenas.
Ainda da mesma forma, foi também extinguida a exigência de apresentação do Registro Administrativo de Nascimento de Indígena (Rani), emitido pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Pela texto anterior, revogado no momento, o registrador civil poderia recusar o registro caso o documento não fosse apresentado.
A necessidade de se apresentar o Rani foi removida após solicitação da própria Funai, que compreendeu que o documento poderia ser um desafio burocrático em relação ao acesso a direitos básicos e políticas públicas pela população indígena.
Com as novidades, é previsto que o número de registros tardios de pessoas naturais aumente, atraindo pessoas indígenas que ainda não possuem nenhum tipo de documentação para que enfim possam ter a própria certidão de nascimento e passem a ter acesso a diversos serviços públicos.
“O Rani foi criado em outro contexto, quando a Funai exercia tutela sobre os povos indígenas. Era preciso fazer essa adequação, uma vez que, hoje, nós temos uma Constituição Federal bastante clara em estabelecer que os povos indígenas são legítimos, tanto para defender seus direitos, como para a sua autonomia, em respeito às suas diferenças culturais, inclusive perante os órgãos públicos, para poderem incluir seus nomes e línguas indígenas”, afirmou Joenia Wapichana, presidente da Funai.
Por meio de nota publicada, a Funai defende que “sejam garantidos os meios próprios de autodeclaração e de heteroidentificação pelas comunidades indígenas para comprovação de pertencimento étnico”.