De teté às rosas

Outro cacuriá de Dona Teté?

Familiares da saudosa caixeira não descartam a possibilidade de um cacuriá no futuro com esse mesmo nome, embora digam que isso não estava nos planos.

Dona Teté faleceu em 2011, vítima de um AVC (Foto: Reprodução)

Esta semana o meio cultural foi surpreendido com a mudança do nome de Cacuriá de Dona Teté, para Balaio de Rosas, além do anúncio de uma nova marca e vestimentas para o grupo. A notícia foi dada pelo Grupo Laborarte, mas gerou burburinho. Afinal de contas, vai ser criado um novo grupo com o mesmo nome, e os herdeiros da caixeira, vão formar um novo grupo?

Eu conversei com Venceslau Pires Santos, neto de Dona Teté, e ele disse que também foi pego de surpresa com o anúncio, toda a família, aliás. Mas adiantou que não há, pelo menos por enquanto, a intenção de fazer um grupo com esse nome. O neto e uma neta, familiares de Teté, não faziam parte do Cacuriá de Dona Teté, já bem antes de Teté falecer. O que há, desde a morte da caixeira, é um contrato firmado com o grupo Laborarte (que atualmente vigora até 2026), onde a família recebe direitos autorais.

“Nunca houve essa história de formarmos um grupo com o nome da minha avó. Minha esposa, com meu cunhado e minha filha tem um cacuriá chamado Cacuriá da Basson, aí disseram por aí que o grupo passaria a se chamar Cacuriá de Teté da Basson, mas nunca houve isso. De nossa parte nunca houve. Mas agora, com isso, não tá descartada essa possibilidade futuramente”, disse Venceslau.

De acordo com Rosa Reis, coordenadora do Laborarte, a ideia da mudança do nome se deu de forma natural. “Nós resolvemos mudar o nome porque já algum tempo vínhamos trabalhando o cacuriá, com vários projetos de fomento e entendemos que precisamos caminhar dessa forma. Ter retirado juridicamente o nome de Dona Teté do cacuriá não vai de forma alguma inviabilizar o legado que ela deixou”.

Rosa lembrou que o cacuriá foi produzido dentro do Laborarte e que desde então foram feitos vários trabalhos com dona Teté, que sempre foi uma mulher empoderada e irreverente.

Aos 50 anos de idade, Teté (Almerice da Silva Santos, nascida em 1924, no bairro do Batatã/Coroadinho) iniciou sua vida na cultura, quando começou a participar as festividades do Divino Espírito Santo, promovidas pelo folclorista Alauriano Campos de Almeida, o reverendo “Seu Lauro”, na Vila Ivar Saldanha. Ela até chegou a participar de grupos de Tambor de Crioula, mas sua grande paixão era mesmo o cacuriá.

O rebolado sensual – e polêmico – da dança ganhou destaque por onde passava. O grupo de Cacuriá do Seu Lauro recebeu um convite do Laboratório de Expressões Artísticas (Laborarte) para ensinar o toque de caixa do Divino para uma peça teatral. Foi aí que Dona Teté assumiu o posto de mestre e passou a repassar seus ensinamentos. Em 1986, influenciados pelo Laborarte, nasceu o Cacuriá de Dona Teté.

O grupo faz sucesso nacional, principalmente com apresentações em festejos durante o período junino, e internacional, com músicas como “Choro de Lera”, “Jabuti” e “Jacaré”, escreveu o jornalista Fernando Costa, em O Imparcial. Após a morte de Nelson Brito (esposo de Rosa Reis, falecido em 2009), e dona Teté (em 2011), o cacuriá seguiu seu curso, mas segundo Rosa, era chegada a hora dele caminhar por outros rumos.

“Nós não vamos enterrar o nome de Teté. Só não vamos ter esse nome juridicamente. E foram várias as situações que nos levaram a tomar essa decisão, como questões de visibilidade da família, muitos confundiam achando que eu era filha de Teté, e isso causou algumas coisas. Nós ficamos muito sentidos também, mas chegou a hora da gente fazer essa mudança. Vamos continuar enaltecendo o nome de Teté, o legado dela, mas estamos entregando o nome dela para o estado do Maranhão”, disse Rosa.

A cantora ainda acrescentou que esse “entregar” é deixar a família de dona Teté à vontade para, se quiser, utilizar o nome. 

“Nós nunca negaremos nossa origem, mas tmbém temos trabalhado em outras composições no cacuriá, de autoria minha, de Camila Reis, de Joãzinho Ribeiro, algumas inclusive enaltecendo o legado de Teté, e que se somam às já conhecidas do público, no nosso repertório”, disse Rosa.

Segundo Venceslau, nunca houve, por parte da família, a intenção de desfazer esse vínculo com o Laborarte.

 “Vovó com Nelson Brito era uma relação de mãe e filho, muito ligados. Então, eles não levaram isso em consideração. E isso aconteceu logo perto da comemoração do centenário de minha avó. Eu tô muito chateado com essa situação toda, mas vamos seguindo. A família estará presente nas homenagens do centenário de minha avó”, disse.

Camila Reis, cantora e filha de Rosa Reis, escreveu:

“Esse nome não é propriedade nossa, o legado de dona Teté é bem maior que o nosso grupo. Atualmente parte de sua família também fazem e mantém um grupo de cacuriá. Porque seríamos nós os detentores desse nome e não um de seus descendentes??? Entendemos e decidimos que seria mais ético entregar esse nome para o Maranhão e seguir nosso caminho enquanto grupo cultural. Também nos dói o coração, também temos apego pelo esse nome, ela é nossa mestra, nossa rainha. O legado e o nome de Teté não é posse do Laborarte e das 50 pessoas que hoje compõe esse grupo. Seguiremos fortalecendo a memória de Teté e preservando a tradição do cacuriá. Seguindo nosso coração com respeito a Teté, aos seus descendentes e também a nós enquanto grupo que ama dançar cacuriá”.

Centenário de Teté

Centenário de TetéNo próximo dia 27 de junho é o centenário de vida de Teté. E nesse dia, no Largo de Santo Antônio, haverá várias homenagens para ela, que incluem, o pedido, por meio de um projeto de lei (em elaboração) transformando essa manifestação em patrimônio da cultura maranhense e esta data como parte do calendário junino do Estado. Ainda para que a data seja considerada Dia do Cacuriá.

Haverá ainda um encontro com grupos de cacuriá, exibição de vídeos de Dona Teté e ainda o anúncio da produção de um documentário que conta a história de vida de Teté e do nascimento do espetáculo, “Cacuriá de Dona Teté”, que se tornou referência no Brasil inteiro.

Dona Teté

Criada com a avó paterna e a madrinha – pois perdeu a mãe aos quatro anos de idade e o pai aos quatorze – Teté passou a adolescência na rua do Cisco, hoje Riachuelo, no bairro do João Paulo. Aos 12 anos, começou a trabalhar como empregada doméstica.Como precisava trabalhar, Tété estudava em casa, fazendo cartilha – livro que ensina os primeiros rudimentos de leitura –, e cursou apenas a 1ª série do ensino fundamental.

Casada com Manoel dos Santos, a quem chamava carinhosamente de “seu Manoel”, Dona Teté teve uma filha. Da sua família, a única pessoa que herdou o gosto pelo cacuriá foi seu neto, Beto, que já foi caixeiro da brincadeira e seu grande parceiro em todas as apresentações.Dona Teté faleceu em 2011, vítima de um AVC.

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