Grupo Grita lança nova edição do projeto Escola de Arte no Anjo da Guarda, em São Luís
No lançamento, O IMPARCIAL conversou com personagens desta história de descoberta de talentos em comunidade, que já atravessa gerações
“Uma ferramenta poderosa e transformadora” — é como a jovem Laudilene Góis define a arte levada até ela pelo trabalho do Grupo Grita, no Anjo da Guarda, em São Luís. O teatro Itapicuraíba (sede do Grita) é uma arena como os antigos teatros gregos, evocando as raízes e a alma da profissão de atuar.
Ao lado de veteranos e coordenadores, no centro do teatro, Laudilene Góis exalta o trabalho do grupo teatral, consolidado há décadas no bairro e descobridor de talentos através de gerações.
Na tarde desta segunda-feira (17), o Grita lançou nova edição do projeto Escola de Arte: destinado a 90 jovens talentos a serem descobertos no Anjo da Guarda. A Laudilene se junta, na arena, a colega atriz Elza Aires, de 20 anos. As duas chegaram ao teatro na primeira edição do projeto, em 2019.
“É um orgulho e uma esperança muito grande ver uma nova turma se tormando. Com sonhos parecidos com os meus”, comenta Elza Aires.
Na arquibancada da arena, uma dessas sonhadoras aguarda ansiosa a programação de abertura no teatro.
Com apenas 13 anos, Damilly Stephany já é uma música nata: ela toca contrabaixo e vai cursar aulas de violão do Grita.
Sempre gostei muito de música e instrumento. Pelo curso ser perto da minha casa e gratuito, ficou mais fácil pra mim.
DAMILLY STEPHANY, DE 13 ANOS
Veterano das novas turmas, Carl Pinheiro entrou no Grita em 1998. O ator exemplifica profissionais consolidados cuja trajetória foi possível através do projeto.
Formado em teatro pela UFMA e com produções como espetéculos de Reynaldo Faray e Ubiratan Teixeira, e o filme Muleke Té Doido 2 no currículo, Carl Pinheiro agora passa adiante a missão comunitária e transformadora do Grita com a arte.
“Dou aulas de teatro para o regime fechado em Itapecuru. O teatro do Grita me ensinou a acreditar que o teatro liberta, faz vencer, também é educação.”
CARL PINHEIRO, ATOR DESCOBERTO PELO GRITA
Através da Escola de Arte, o Grita oferece três cursos: dança, teatro e música, com aulas de violão. Cada curso deve contemplar trinta prodígios do Anjo da Guarda.
Gerações
O grupo Grita foi criado em 1975 por um grupo de atores que inclui Zezé Lisboa e Claudio Silva. Em pronunciamento durante a abertura, para Claudio, é impossível não se emocionar ao percorrer a trajetória do projeto, hoje consolidado no Anjo da Guarda.
O Teatro Itapicuraíba — palavra em tupi-guarani que significa “pedra miúda de pequeno igarapé” — foi erguido em 1979, em um terreno ocioso vizinho à Igreja de Nossa Senhora da Penha. O que daria lugar a um hospital, virou um berço de arte e magia.
Ao que de imediato remete aos antigos teatros gregos da gênese da atuação, Claudio Silva prefere se referir como oca: a estrutura original do teatro foi construída, literalmente, palha sobre palha.
“É uma grande satisfação estar aqui, com 69 anos e ainda aqui. Abrirmos o teatro e receber o povo. Nos damos conta de que estamos alcançando nosso objetivo.”
CLAUDIO SILVA, COORDENADOR GERAL DO GRITA
Desde 1981, o Grita opera como teatro comunitário, o que potencializa moradores do Anjo da Guarda produzir espetáculos — sendo a Via Sacra um dos exemplos mais conhecidos desse tipo de produção.
A tradicional montagem da Via Sacra foi criada em 1981, visando traduzir o sentimento libertário da Paixão de Cristo, para a população.
Centenas de moradores do Anjo da Guarda e região colaboram com a execução da peça, entre atores, produção e equipe técnica.
A montagem da peça percorre cerca de 2 km de ruas do bairro, com atos encenados em várias localidades do Anjo da Guarda. O percurso até a cruz e a ressurreição, eternizados na Bíblia, leva uma verdadeira multidão há 42 anos, para acompanhar de perto a via crucis encenada pelo Grita.
Co-fundadora do grupo de teatro, a atriz Zezé Lisboa lembra que outras montagens também contaram com participação comunitária, além do espetáculo tradicional de Páscoa.
“Já fizemos ‘Um Bom Malandro Não Morre‘, que apresentamos em um arraial, com direção de Tácito Borralho. O que percebemos é uma mudança no sentido de transformação, de como perceber a arte”, diz Zezé Lisboa.