Pesquisa aponta que excesso de açúcar prejudica o cérebro
A exposição crônica a uma dieta rica em açúcar resulta em resistência à insulina, um hormônio que desempenha papéis regulatórios fundamentais no cérebro.
Há algum tempo, estudos têm indicado uma relação significativa entre a obesidade e o aumento do risco de desenvolvimento de distúrbios neurodegenerativos, como o Alzheimer. No entanto, os mecanismos exatos que ligam esses dois fatores ainda não estavam totalmente compreendidos.
Cientistas do Centro Fred Hutchinson Cancer Research, nos Estados Unidos, publicaram na revista Plos Biology uma pesquisa que lança luz sobre essa conexão.
De acordo com o artigo, a exposição crônica a uma dieta rica em açúcar resulta em resistência à insulina, um hormônio que desempenha papéis regulatórios fundamentais no cérebro, influenciando a cognição, a alimentação e o metabolismo.
Nesse novo estudo, liderado pela cientista Mroj Alassaf, os pesquisadores aproveitaram as semelhanças entre humanos e moscas da fruta para investigar em profundidade essa relação. Inicialmente, eles demonstraram que uma dieta rica em açúcar levou à resistência à insulina nos órgãos periféricos desses insetos.
O foco se voltou para os cérebros das moscas de fruta, com especial atenção para as células gliais, componentes do sistema imunológico, uma vez que se sabe que disfunções nesses componentes, em particular nas microglias, estão associadas à degeneração neural.
Os pesquisadores forneceram dietas diferentes a dois grupos de drosófilas por mais de três semanas. Um grupo recebeu uma alimentação padrão, enquanto o outro foi submetido a um regime que levou à obesidade crônica, com cerca de 30% de glicose. Posteriormente, os cérebros das moscas da fruta foram dissecados para análise.
Para avaliar a resposta à insulina, os cientistas utilizaram a enzima PI3k como marcador. As descobertas revelaram que a dieta rica em açúcar resultou em uma diminuição dos níveis dessa enzima nas células gliais, um indicativo claro de resistência ao hormônio.
Além disso, foi observada degeneração em estruturas cuja principal função é a remoção de detritos do sistema nervoso central, resultando em níveis reduzidos de uma proteína chamada Draper.
Os autores do estudo acreditam que essas descobertas podem ter um grande impacto. Segundo o artigo, “usando moscas da fruta, fica estabelecido que dietas ricas em açúcar desencadeiam resistência à insulina na glia, interrompendo a sua capacidade de eliminar detritos neuronais.” Isso fornece informações sobre como as dietas que promovem a obesidade podem contribuir para o aumento do risco de doenças neurodegenerativas.
De acordo com o neurologista Marcelo Lobo, do Hospital Santa Lúcia em Brasília, este estudo pode abrir caminho para novas pesquisas. Ele sugere que a busca por receptores PI3k em seres humanos e a tentativa de bloqueá-los podem oferecer efeitos benéficos no que diz respeito à resistência à insulina. Além disso, enfatiza a importância de manter hábitos de vida saudáveis, como uma alimentação com baixos níveis de açúcar e sódio, controle do peso, sono de qualidade e atividade física, como elementos neuroprotetores.
Simone Van de Sande Lee, diretora do Departamento de Obesidade da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem), considera os achados um avanço, mas destaca a necessidade de uma investigação mais profunda da relação.
Ela ressalta que estudos anteriores já mostraram a indução de inflamação cerebral com uma dieta rica em gordura, embora em roedores, e que ainda não sabemos se os mecanismos são semelhantes em seres humanos e quais componentes específicos da dieta podem desencadear esses processos. Portanto, é importante conduzir mais pesquisas para entender melhor essas interações em seres humanos.