ESPECIAL - SEMANA DA CONCIÊNCIA NEGRA

Jornalismo: ferramenta de transformação

Neste mês da Consciência Negra, O Imparcial conversou com alguns jornalistas maranhenses negros.

Renata Harrison conta que certa vez procurava vaga de repórter televisivo, fez seletivo com 20 pessoas e e era a única negra. (Foto: Arquivo pessoal)

De acordo com uma pesquisa que traça o perfil do jornalista brasileiro, 1,8% dos 750 jornalistas entrevistados se declararam pretos ou pretas e atuam em veículos maranhenses.

O estudo Perfil Racial da Imprensa Brasileira, idealizado pelo grupo Jornalistas&Cia, se deu para medir o efetivo perfil racial e contribuir para que o jornalismo possa caminhar de forma mais ágil em direção à diversidade e à inclusão, passando a ser mais equilibrado em seus quadros de colaboradores e no próprio noticiário, em especial no que diz respeito à questão racial.

Neste mês da Consciência Negra, conversamos com alguns jornalistas maranhenses negros para saber o que pensam a respeito da profissão que escolheram, quais os desafios que enfrentam enquanto profissionais pretos ou pretas, e como acham que podem contribuir para um jornalismo mais combativo em relação ao racismo e outras formas de preconceito.

Se é difícil para um profissional qualquer ingressar no mercado de trabalho, acredite, para o negro é ainda mais. Com esses jornalistas e jornalistas falamos sobre mercado de trabalho, dentre outros assuntos. Confira quem são nossos entrevistados:

  • Aline Alencar – Jornalista e Chefe da Ascom na Escola de Governo do Estado. 14 anos de profissão.
  • Pedro Sobrinho – Jornalista na Mirante FM. 36  anos de carreira.
  • Renata Harrison – Jornalista, e empreendedora na Pretume Assessoria. 8 anos de profissão.
  • Neres Pinto – Jornalista de O Imparcial. Mais de 50 anos de carreira.
  • Emanoel Pascoal – Jornalista com 22 anos de carreira. Gestor de Imprensa na Secretaria de Comunicação do Estado.
  • Jailson Mendes – Proprietário do Blog do Jailson Mendes desde 2009. Formado há 2 anos.

Preconceito no mercado de trabalho

Aline Alencar – “Um fato que toda pessoa negra sabe é que sempre sofreremos racismo, independente do lugar, da roupa que usamos, condição financeira ou posição social. Acredito que o enfrentamento, no sentido de não abaixar a cabeça, é a forma que melhor lido com isso. Contudo, não nego que é exaustivo e muitas vezes deprimente a situação, mas sigo lutando e conquistando meus espaços da melhor forma que está ao meu alcance”.

Aline Alencar é Jornalista e Chefe da Ascom na Escola de Governo do Estado. (Foto: Reprodução)

Renata Harrison – “Ja enfrentei problemas com meu cabelo. Que eu só entraria na empresa se o alisasse. Então, foi em um momento eu que eu tava em transição do liso para o cacheado. Um momento bem delicado de autoestima para nós que passamos por esse momento. Foi ruim mas eu soube passar por cima e seguir”.

Neres Pinto – “Não detectei, ao longo desse tempo, nenhum preconceito pelo fato de ser um jornalista negro. No rádio, como setorista político na Assembleia, entrevistei dezenas de parlamentares. Também participei de entrevistas com governadores em pleno período da ditadura militar, e comandantes do antigo 24º BC. No esporte, entrevistei craques de renome nacional como Zico, Rivelino, Júnior, Leão, Toninho Cerezo, Roberto Dinamite, entre outros. Também ouvi Zagalo, Telê Santana Felipão e Luxemburgo, técnicos da Seleção, o presidente da Fifa, João Havelange, e todos me trataram muito bem. Percebo, porém, que certas pessoas têm uma certa antipatia ao trabalho da imprensa. É fácil perceber, por exemplo, numa coletiva. Quando a pergunta não agrada o entrevistado, ele responde com ironia ou arrogância, no intuito de esconder a verdade ou intimidar o repórter. No entanto, isso nunca me intimidou nem me desestimulou a continuar na profissão”.

Neres Pinto é Jornalista de O Imparcial. (Foto: Reprodução)

Pedro Sobrinho – “Costumo dizer que o Racismo Estrutural, assim como outras formas de preconceitos que absorvemos ao longo estão enraizados, é necessário muito conhecimento e sensibilidade pra que se perceba que estamos sendo preconceituosos. Na área do jornalismo, assim como em outras profissões, esta estética de beleza eurocêntrica reina e dita as regras. E muita das vezes, isto é manifestado no inconsciente, e acaba reverberando no dia a dia. Em 36 anos em cumplicidade com o jornalismo, não senti de fato o preconceito racial na pele porque está questão identitária, ancestral e de pertencimento, negritude, sempre estiveram junto de mim. Enfim, nós negros temos que estar sempre quebrando paradigmas, porque o racismo às vezes ecoa silenciosamente, veladamente. Se existe o problema, encaro e supero, enfrentando com personalidade, trabalho e profissionalismo”.

Pedro Sobrinho é Jornalista na Mirante FM. (Foto: Reprodução/Paulo Soares)

Jailson Mendes – “Já enfrentei preconceito sim, principalmente porque venho da zona rural, de uma comunidade quilombola chamada Beirada. Teve gente que já me perguntou se eu sou realmente jornalista, se eu passei por uma universidade, não só pela cor, mas inclusive pelo fato de eu sair de onde saí, da região mais pobre do Brasil, entendeu? E aí como é que eu lidei e lido? batendo de frente, provocando a justiça, mas mesmo assim a gente encontra resistência. Qualquer profissional da imprensa que está ligado diretamente com o povo, com a informação, sofre algum tipo de preconceito e isso é muito mais forte quando o o ou a jornalista, é preto vindo de uma comunidade pobre. E mesmo assim a gente continua fazendo o nosso trabalho, porque entende também que é preciso dar voz aos nossos rincões, dar voz ao nosso lugar. Dizer que que alguma tem que ser feita. E é por meio do jornalismo que a gente consegue fazer isso”.

Jailson Mendes é proprietário do Blog do Jailson Mendes desde 2009. (Foto: Reprodução)

Emanoel Pascoal – “Eu comecei a trabalhar muito jovem. Então, existia aquelas coisas: jornalista, novinho, preto… ‘o quê que esse rapaz quer aqui?’ Chegaram algumas situações em eventos, coletivas, que dependendo do local a pessoa perguntava: ‘você é o repórter?’ Dizia: ‘Sim. Sou eu o repórter’. Entendeu? Então, em um primeiro momento pode não ter sido nada muito explícito, mas esse tipo de comportamento, quando você questiona determinadas situações…. Mas eu não tinha, naquela época, esse entendimento que eu tenho hoje. Se olhar para trás, eu vou provavelmente resgatar algumas situações de preconceito. Hoje em dia eu me choco, mas eu sempre tenho uma resposta e posições muitos firmes em relação a isso, eu acho que consigo, pela maturidade, pelo tempo de estrada, aprendizado, leitura, conseguindo responder. Eu não me deparo hoje com muitas situações assim, talvez porque tenha diminuído um pouco o trabalho externo, já que agora gerencio uma equipe interna, mas talvez se eu fosse ao público também, eu encontrasse algum tipo de preconceito, de resistência”.

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