A pobreza que afeta a dignidade
Para muitas mulheres, menstruar significa se afastar do convívio social, se isolar, ir contra os direitos humanos.
Menstruação significa saúde, certo? Mas para muitas mulheres ela significa também, dor de cabeça, preocupação, constrangimento, falta de dignidade. Para muitas mulheres, menstruar significa se afastar do convívio social, se isolar, ir contra os direitos humanos.
O mais recente relatório do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) e do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), revelou os dados da pesquisa “Pobreza Menstrual no Brasil: desigualdade e violações de direitos” que apontam a existência de 713 mil meninas vivendo sem acesso a banheiro ou chuveiro nos seus domicílios, e mais de quatro milhões não têm acesso a itens mínimos de cuidados menstruais nas escolas.
Dessas, quase 200 mil alunas estão privadas de condições mínimas para cuidar da sua menstruação na escola.
No levantamento sobre estar totalmente desassistida nesses cuidados, os estados com maiores percentuais são: Acre (5,74%), Maranhão (4,80%), Roraima (4,13%), Piauí (4%) e Mato Grosso do Sul (3,61%).
Na semana em que se comemora o Dia Internacional da Dignidade Menstrual, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) chama a atenção para a urgência de garantir que todas as pessoas que menstruam tenham direito a itens de higiene, infraestrutura adequados e informação.
Para marcar a data, o UNICEF reúne adolescentes e jovens de São Luís até o dia 4 de junho, para uma semana de rodas de conversa e oficinas educativas com foco na dignidade menstrual, na igualdade de gênero, e na co-criação de soluções para o manejo menstrual.
As atividades acontecem das 8h às 18h, na Fundação Justiça e Paz se Abraçarão (FJPA), Rua Dez, 2564 – Cidade Olímpica, em São Luís-MA.
“Mais especificamente em São Luís, o nosso foco de trabalho em relação ao tema da dignidade menstrual tem uma concentração na população de meninas adolescente negras, afrodescendentes, ou de comunidades tradicionais. É a população mais vulnerável, mais frágil em situações como essa. O que a gente sabe hoje é que a pandemia revelou uma realidade que estava invisibilizada por mitos e preconceitos. Essas meninas, especialmente, não tinham acesso aos recursos na própria família para manejar o seu limite de vida, de maturidade do sistema reprodutivo. Então, essas meninas entram no ciclo menstrual, sem informação, sem saber como manejar isso, sem compreender o próprio corpo, e no limite do absurdo, sem acesso a um absorvente”, disse Ofélia Silva, chefe de escritório do UNICEF em São Luís.
A violência menstrual é a falta de acesso das mulheres que menstruam a recursos, infraestrutura e conhecimento para o cuidado da sua menstruação.
O levantamento feito pelo Movimento Mulheres de Axé do Brasil – Núcleo Maranhão informou que grande parte da população brasileira feminina, na sua maioria negra, não tem acesso a protetores menstruais e outras formas de garantir a sua saúde básica no período menstrual de forma adequada, recorrendo muitas vezes a métodos pouco seguros para conter o sangue da menstruação.
Instituição distribuiu 19 mil absorventes em SL
As ações fazem parte das iniciativas de dignidade menstrual do UNICEF em três cidades: São Luís, Belém e Recife. Nos últimos meses, o UNICEF junto a parceiros, contribuiu com a dignidade menstrual de 55 mil adolescentes e jovens que menstruam e vivem em comunidades vulneráveis das três capitais.
Foram distribuídos mais de 120 mil pacotes de absorventes e cerca de 5 mil adolescentes foram engajadas e engajados em rodas de conversa. Em São Luís, o UNICEF distribuiu 19 mil absorventes.
A instituição conta com a parceria do Coletivo Menina Cidadã da Fundação Justiça e Paz se Abraçarão (FJPA), das Secretarias Municipais de Educação e Assistência Social de São Luís, e da Secretaria de Estado de Educação, para as ações do projeto Menina Cidadã que acontece na macrorregião da Cidade Operária e Cidade Olímpica.
“Todos por conta dessa pandemia se conscientizaram. Foi um movimento nacional e já há o compromisso, a normativa legal da entrega de absorvente das escolas. E aí, o que a gente quer é que essas ações sejam permanentes e que não precisem depender de um doador, isso tem que ser inserido nos órgãos públicos. Precisa ser uma política de estado, ou seja, não deve depender de quem está nos governos. Deve ser permanente, continuada e financiada pela política, pelo orçamento público. Essa é a nossa bandeira.”, pediu Ofélia.
Os diálogos nas escolas são liderados por meninas adolescentes que realizaram meses de treinamento sobre direitos das mulheres, empoderamento jovem e participação social, com apoio da Escola Superior do Ministério Público do Maranhão.
A série de atividades de mobilização e engajamento no bairro de promoção de direitos de crianças e adolescentes tem resultado em mais de 200 outras meninas engajadas, participando das ações de multiplicação.
Em enquete realizada pelo UNICEF em 2021 com 1,7 mil crianças e adolescentes que menstruam, 62% afirmaram que já deixaram de ir à escola ou a algum outro lugar de que gostam por causa da menstruação, e 73% sentiram constrangimento nesses ambientes.
A dificuldade de acesso a serviços de água, saneamento e higiene adequados impactam diretamente, ocasionando a pobreza menstrual e consequentemente o desenvolvimento socioemocional, autoestima e autoconfiança. Além disso, a dificuldade da gestão menstrual adequada pode levar à evasão escolar.
“Isso se reflete em uma semana fora da escola, ou em situações ainda mais graves porque, sem acesso a absorvente, elas tendem a repetir as fórmulas das mães e das avós. Bota papelão, bota paninho, bota enfim, tudo que tiver a mão, ou simplesmente não saem de casa. Isso é uma condição medieval. Não é possível que a gente continue aceitando, por preconceito ou mito, que esse problema continue existindo”, comentou Ofélia.
Os impactos do UNICEF na promoção da dignidade menstrual fazem parte das inciativas “Água e Higiene nas escolas”, e “dignidade menstrual”. Em São Luís, as Os impactos do UNICEF na promoção da dignidade menstrual fazem parte das inciativas “Água e Higiene nas escolas”, e “dignidade menstrual”.
Em São Luís, as ações são realizadas em parceria com a prefeitura e o setor privado. Junto ao UNICEF, SEMPRE LIVRE® e CAREFREE® apoiam 45 mil adolescentes de Recife e São Luís, com a doação de 90 mil pacotes de absorventes (2 para cada adolescente), junto com material informativo sobre dignidade menstrual.
Além disso, foram realizadas oficinas com 1.310 adolescentes, promovendo o desenvolvimento de competências para a vida, o empoderamento e a saúde menstrual.
“Assim como a gente conquistou o direito de que os preservativos sejam oferecidos em todo o território, em unidades de saúde, e a gente aceita que isso aconteça porque a vida sexual, a vida reprodutiva é parte da condição humana, e tem que ser preservada como direito, a gente também tem que reconhecer que as mulheres tem direito a receber esse apoio, certamente as meninas, certamente as mulheres mais vulneráveis” disse Ofélia.