CULTURA

Dia Nacional do Tambor de Crioula foi criado há 14 anos

A manifestação histórica cultural que se mantém viva e em expansão.

Foto: ma.gov.br

O Dia Nacional do Tambor de Crioula comemorado na data de hoje (18), teve o seu primeiro registro escrito sobre a existência do Tambor de Crioula ocorreu em 1818, perpetuando-se até os dias atuais. A dança que enche os olhos diante dos movimentos das dançarinas que se sacodem livremente ao som da percussão dos tambores. Coreiros e coreiras acompanham o batuque e apresentam um espetáculo à resistência de matriz africana.

Este ritmo intenso e atemporal carrega uma forte expressão artística por meio da alegria e de movimentos eufóricos nas danças, tradicionalismo nas roupas, motivação religiosa e instrumentos importantíssimos que compõem o momento festivo tradicional.

Foto: oimparcial.com.br

Curiosamente, na década de 70, a capital do Maranhão se encantou com a beleza da tradição das danças coloridas e dos sons cativantes e, a partir disso, se popularizou e começou a ser visto como um dos mais importantes atrativos culturais afro-brasileiros. Por fim, em 2007, essa celebração cultural recebeu o título de Patrimônio Cultural Imaterial Brasileiro e, em 2016, o dia 18 de julho foi estabelecido como o Dia do Tambor de Crioula. 

Os movimentos coloridos acompanham formas e tradições

O som cativante dos tambores faz com que as coreografias se tornem mais livres e circulares. Os aspectos da dança se assemelham com o samba de roda do recôncavo baiano e com jongo, que é uma prática cultural muito comum no Sudeste, principalmente em São Paulo. 

Foto: ma10.com.br

Os vestidos coloridos usados pelas dançarinas tem como elemento de destaque as rosas nas vestimentas fazendo alusão a história do milagre de São Benedito.

Rosas que tradicionalmente são representadas nas apresentações. Há uma curiosidade sobre as saias: As mulheres têm o costume de vestir as saias por cima e nunca se abaixarem para vestir por baixo. O motivo disso é que na religião africana a cabeça é um ponto de conexão com o sagrado e você não deve se curvar sem uma razão. Então se abaixar para colocar a saia é uma prática incomum: as mulheres levantam os braços para vestir a saia da maneira correta, por cima. 

Os colares, que adornam os vestidos, têm cunho religioso. Tornando a composição uma representação forte de manifestação cultural, a qual cultiva o pertencimento e a renovação dos valores culturais afro-brasileiros.

Foto: portal.iphan.gov.br

São Benedito, a motivação para alegria do festival

De acordo com a mediadora da Casa do Tambor de Crioula, Domênica Antônio, a principal motivação da dança é a devoção e louvor a São Benedito. “Essa figura divina era um cozinheiro de um monastério, que, ao levar comida aos pobres, foi flagrado com uma cesta cheia de alimentos”, completou Domênica. Ao descobrirem essa prática, tentaram armar um flagrante, mas acabaram encontrando a cesta de comida, que se transformou simbolicamente numa cesta de rosas que compõe tradicionalmente elementos nas vestimentas dessa expressão artística cultural, que é a dança. 

Foto: seropedicaonline.com

Para além da devoção, o evento pode também aparecer em comemorações de aniversário, vitórias no esporte, nascimento, chegadas, despedidas, festa de preto velho, matança de bumba meu-boi, ou em uma simples reunião de amigos. 

A Casa do Tambor de Crioula

O som cativante dos tambores e a visão das coreografias livres e circulares levaram a capital do Maranhão a inaugurar a Casa do Tambor de Crioula, um lugar que resguarda e irradia conceitos e saberes associados ao Tambor de Crioula. O sobrado tradicional que representa a arquitetura luso-brasileira no Maranhão está localizado no Centro Histórico de São Luís, lugar culturalmente rico da cidade. Lá ocorrem eventos, festas e um grande fluxo de turistas. 

Hoje, o espaço é utilizado para fortalecer o processo de salvaguarda da manifestação, com o caráter museológico, antropológico e sociológico, assim como de um centro de pesquisa. Além de ser um local de difusão da manifestação, também protege a memória e a documentação da história dos afrodescendentes maranhenses. 

O local cultural de multiuso é destinado a exposição permanente, apresentações, vivências, atividades de ensino e formação, oficinas de saberes tradicionais como o ritmo, a dança, a confecção de indumentárias, os tambores, os artesanatos e inúmeras formas de produção e reprodução material e imaterial relativas a manifestação artística cultural do Tambor de Crioula.

O grupo MaraCrioula evidencia a representatividade do Tambor de Crioula no Maranhão

O Tambor MaraCrioula foi criado em 2 de maio de 2004 no bairro da Liberdade, em São Luís, que é conhecido por ser uma comunidade quilombola, tendo como fundador José do Nascimento Pereira Almeida, administrador, produtor cultural e servidor municipal. A instituição existe há 18 anos, o nome surgiu de uma junção do MARA (MARANHÃO) e complementou com o Crioula, fazendo menção à dança e a tradição maranhense. 

O MaraCrioula surgiu com a iniciativa de inserir os jovens na dança, devido antigamente a dança ser vista apenas para a participação de pessoas mais idosas. O MaraCrioula possui uma identidade se destacando por ser grupo diferenciado, tendo uma marca única, vestimentas próprias do grupo, músicas autorais gravadas e que são usadas nas apresentações. A criação do MaraCrioula teve inspiração em outros grupos na Ilha de São Luís, tais como: Tambor de Leonardo, Tambor de Apolônio e Tambor da Fé em Deus. O grupo iniciou-se com a faixa etária de 13 a 17 anos e compõe atualmente outras pessoas com diferentes idades por se identificarem com o grupo. Hoje, o MaraCrioula é formado por 35 componentes, tanto homens como mulheres.

Foto: Arquivo Pessoal do Grupo

A perspectiva e visão do Tambor de Crioula mudou muito para o fundador do grupo e para os próprios brincantes. Havia-se a ideia de que o Tambor de Crioula era somente para velhos, a ideia de que era coisa de preto, que era feitiçaria, que tinha-se a ideia de que era associado a macumba. Foram os pioneiros a levar a história da dança para bibliotecas públicas, tiveram também a oportunidade de apresentação sobre o grupo e a tradição para dentro de uma universidade privada, além de diversos outros espaços para desconstruir o olhar sobre essa tradição. 

O Tambor MaraCrioula se dedica a trabalhos sociais no bairro da Liberdade, em São Luís, e também há um museu comunitário onde contam a história do Tambor de Crioula e, respectivamente, a sua história em uma exposição sobre as indumentárias, os instrumentos de percussão, de fotos da trajetória do grupo, miniaturas da dança que ficam expostas para o público e são feitas por artesãs do próprio grupo e por outras pessoas da cidade que contribuíram para a realização dessas miniaturas, além da presença de São Benedito e a entidade Preto Velho que também fazem menção em suas danças.

Foto: Arquivo Pessoal do Grupo

Hoje, o grupo tem quatro CDs gravados, um DVD, uma cartilha educativa que fala especificamente do Tambor de Crioula e sobre o MaraCrioula. Contam atualmente com grandes conquistas dentro do estado e fora, tal como projetos aprovados pelo Ministério da Cultura, Funarte e a Fundação Palmares. O Tambor MaraCrioula ganhou o prêmio de Culturas Populares em 2012. Em 2014, o grupo teve a honra de ser contemplado pelo projeto Anjo de Memória que foi realizado pelo Instituto Brasileiro de Museus (Ibram) e foi o único grupo do Maranhão a ser contemplado pelo projeto Palco Cultural que aconteceu em Fortaleza e fizeram a abertura da Seleção Brasileira podendo apresentar a dança e fazer parte desse espetáculo sociocultural que é o Tambor de Crioula MaraCrioula.

O grupo tem um relatório anual, não se preocupando somente com a parte cultural dos brincantes e da comunidade, mas com o social, que inclui fazer algo específico em datas comemorativas, festivas do calendário, além de promover um auxílio específico aos componentes do grupo. O retorno do público nas apresentações do grupo são bastante positivas pelas batucadas diferenciadas, pela vestimenta, por causa da música, corpo técnico, interagindo muito mais com o telespectador, afirma o fundador José do Nascimento Pereira Almeida. 

Foto: Arquivo Pessoal do Grupo

Com a chegada da pandemia, o grupo teve que se adaptar e aderir a novas formas de comunicação com a comunidade e o seu público através das lives pelo Instagram e YouTube, mesmo não tendo o retorno financeiro desejado. Para conter o impacto financeiro, o grupo recebeu do Governo Federal cestas básicas que foram distribuídas para os brincantes, para a comunidade e amigos.

O Tambor de Crioula não é somente uma dança, não envolve somente a parte religiosa, mas o amor à tradição, a devoção e tudo o que ela carrega. Falta muito ainda o reconhecimento, o respeito pelo legado afro-brasileiro e muitas das vezes é esquecido na história.

Foto: Arquivo Pessoal do Grupo

O Tambor MaraCrioula foi contemplado pelo Fundo Baobá, no valor de R$3,000 que foram transformados em 120 kits de higiene básica, máscaras, álcool em gel e cestas básicas para a comunidade. No final do ano de 2020, conseguiu ajuda através do edital Aldir Blanc para ajuda de custos do grupo. O maior sonho do MaraCrioula atualmente é ter seu espaço físico para poder fazer as suas apresentações, para desenvolver atividades culturais e sociais.

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