Saúde mental

Preconceitos impedem busca de tratamento para depressão

Seja por constrangimento ou medo de ser alvo de preconceitos, o fato é que toda pessoa que apresenta um quadro depressivo não quer ser denominada como tal

Ainda não existe cura para a doença mas tratamentos têm se mostrado eficazes

Há pelo menos duas semanas, o país acompanhou a inacreditável história da jovem Bruna Andressa Borges, de 19 anos que usou a ferramenta de transmissão ao vivo do Instagram para veicular sua própria morte aos seus seguidores na rede social. O caso aconteceu na cidade de Rio Branco, no Acre. Dois dias após o suicídio da estudante do 3º período de Ciências Sociais na UFAC (Universidade Federal do Acre), os pais de Bruna se enforcaram na residência da família.

Por mais habituada que a sociedade brasileira pense estar com relação à depressão, os comentários postados nas redes sociais de Bruna Borges só mostram o quanto a doença ainda precisa ser melhor vista e entendida por quem convive com milhares de pessoas com depressão.

Seja por constrangimento ou medo de ser alvo de preconceitos, o fato é que toda pessoa que apresenta um quadro depressivo não quer ser denominada como tal, e comparecer ao consultório de um psicólogo é um dos principais receios de quem precisa de tratamento psicológico.

Franselmo Braga é psicólogo e atende frequentemente casos de pacientes com depressão. Segundo ele, depressão e ansiedade são os principais problemas que levam as pessoas a procurarem um especialista. “Depressão e ansiedade são os motivos mais comuns que levam pessoas a procurarem ajuda em minha clínica”, disse.

Há dois anos Franselmo recebe inúmeros pacientes em seu consultório em uma clínica particular em São Luís e, com frequência, se depara com pessoas em estado depressivo.

O psicólogo conta que, mesmo com o aumento considerável no número de pessoas com depressão nos últimos anos, trata-se de uma doença que já existe há muitos séculos e que só foi potencializada por diversos fatores hodiernos.

“Um dos registros mais antigos da depressão pode ser encontrado no I Livro de Samuel no Antigo Testamento que fora escrito no século IX a. C. fazendo referências ao rei Saul; outros registros encontram-se nos escritos de Homero (século VIII) referindo-se à história do Suicídio de Ájax na obra Ilíada”, contou Franselmo.

Segundo ele, a maioria dos casos de suicídio é antecedida por um quadro depressivo que se agrava progressivamente até que culmine na consumação da própria morte. “A depressão está no topo dos motivos que levam alguém a cometer suicídio, e esses registros históricos mostram que esse não é um problema tão recente, como alguns acreditam”, afirmou.

Entenda melhor a depressão

Franselmo Braga conta que dados são contundentes ao apontarem as mulheres como principais alvos da doença. “Há uma estimativa da Organização Mundial da Saúde (OMS) que, no mundo, 350 milhões de pessoas vivam com depressão. As mulheres são mais afetadas, e 1 a 2 em cada 10 mulheres têm depressão pós-parto”, disse.

Os dados da Organização Mundial da Saúde também dão conta de que os afetados geralmente têm entre 18 a 29, mas essa faixa etária pode se estender até os 50 anos.  É importante ressaltar que quem não se enquadra nesse grupo também está suscetível à doença.

Regionalmente ainda não há um levantamento que detalhe os casos da doença no Maranhão, mas o que se sabe é que no estado os casos são tão frequentes quanto no resto do país.

Levantamentos nacionais apontam que membros das classes C e D costumam ser mais frequentes nos consultórios de psicólogos apresentando sintomas de depressão do que os que pertencem a outras classes sociais.

Múltiplos fatores podem levar uma pessoa a ter depressão

Uma pergunta que geralmente é feita pelas sobre depressão é: O que de fato leva uma pessoa a apresentar um quadro depressivo? A resposta que a Psicologia tem dado a ela é que não há um fator específico a partir do qual se possa afirmar categoricamente que foi a causa  da instauração da doença em determinados indivíduos. Há, contudo, alguns fatores que aparecem com frequência em pacientes que chegam aos consultórios médicos e ao observa-los em si mesmo ou quem está próximo,  é bom que se preste atenção pois se pode estar diante de uma saúde mental afetada.

As causas mais comuns da depressão são as patologias (câncer e doenças pulmonares, por exemplo), condições físicas (menopausa, falha na regulagem hormonal…)e o uso de substâncias químicas. Além disso, quem tem histórico familiar de depressão ou outras doenças psicológicas também tem grande tendência a sofrer com a doença.

Impaciência, insegurança, introversão, autoimagem ruim, timidez excessiva  e traumas na infância também contribuem para o desenvolvimento da depressão. É importante frisar que a simples presença de tais sintomas não é o suficiente para determinar se há depressão em alguém; o ideal é que, na existência de um ou mais desses fatores, se procure um especialista para que o caso seja investigado.

Uma doença sem cura, mas com tratamento

“Quando completei mais ou menos 12 anos eu percebi que estava me tornando um garoto depressivo. Eu ficava indignado pelo fato de todos me julgarem e nunca ninguém me ajudar. As pessoas me julgavam mais pelo o fato de eu me cortar e, por isso, me excluíam de alguns lugares”, esse depoimento é de um jovem que terá sua identidade preservada. O discurso apresentado por ele é comum entre quem sofre com a doença, geralmente se sentem inúteis e veem no suicídio a saída para fugir dos traumas.

Ainda sem cura, a depressão pode ser vencida com a ajuda de profissionais capacitados O mais indicado às pessoas com depressão é que busquem ajuda em um profissional qualificado, no caso o psicólogo, para lidar com essas demandas que estão causando sofrimento.

O uso de drogas pode levar alguém à depressão e o contrário também é verdade 

Marcelo Costa é diretor estadual do Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) e afirma que nos casos que chegam diariamente é perceptível uma forte ligação entre o uso de drogas e a depressão.

“Pelo menos 30% dos nossos atendimentos estão associados a um quadro depressivo. Muitos provocados pelo uso da droga”, disse o diretor do centro. Ele afirma ser comum a pessoas cheguem à depressão pelas drogas ou cheguem às drogas por causa da depressão.

Marcelo afirma que um diagnóstico feito equivocamente impede que as pessoas cheguem a iniciar um tratamento, além disso, a resistência que a sociedade insiste em ter em relação à doença é um fator determinante para o não-acesso a  um tratamento eficaz. “É muito comum que se confunda os sintomas da depressão com os de outras doenças”, disse.

O diretor diz que quando uma pessoa passa a se afastar de todos, ter insatisfação consigo mesma e deixar de realizar tarefas rotineiras, é preciso estar atento. Marcelo conta que o nível de depressão de uma pessoa pode ser medido por suas atitudes e até mesmo pela ausência delas.  “Um suicida sempre dá sinais. Sempre falar sobre. Escreve sobre. Ele sempre dá sinais”, afirmou.

“Conversar com um amigo pode agravar a situação”

Apesar de ser um pesadelo que assusta a sociedade há tempos, a depressão continua sendo estigmatizada e envolta em diversos preconceitos que acabam dificultando o acesso de quem precisa de ajuda médica a um tratamento eficiente. É comum se aconselhar a um depressivo que converse com alguém, saia para se divertir ou que busque apoio na fé como se esses caminhos fossem os mais eficazes.

“A depressão não é uma doença que se resolve com uma conversa ou que uma pessoa pode se curar sozinha. Ela envolve um problema com neurotransmissores que precisa de um acompanhamento com psicólogos, psiquiatras, serviço social e etc. Muitas vezes a conversa com os amigos pode agravar a situação e elevar o quadro niilista do paciente. Uma pessoa não pode se curar de depressão sozinha”, concluiu Marcelo Costa.

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