TEM VAGA, PATRÃO

Prédios históricos viram estacionamento no Centro da capital

A cada dia, mais estacionamentos surgem no Centro de São Luís . O negócio, que parece ser lucrativo , vai transformando as heranças históricas em espaço comercial

Foto: Honório Moreira/ O Imparcial

O Centro de São Luís está cada vez mais saturado com o número de carros que por ali passam diariamente. Achar uma vaga para estacionar é uma verdadeira jornada e requer paciência dos motoristas, além de muita sorte. Por conta disso, muitos casarões tombados e espaços vazios estão virando estacionamentos. Segundo a Superintendência do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) no Maranhão, existem atualmente identificados na capital nove estacionamentos de veículos explorando comercialmente a área de tombamento federal.

Deste total, cinco estão ocupando lotes vazios, cujos locais a instituição não sabe ao certo o que existia anteriormente à atividade de estacionamento. O que necessitaria de uma pesquisa histórica para saber ao certo. Os outros quatro estão inseridos em imóveis que sofreram modificações e alterações em sua estrutura física para que pudessem ser transformados em estacionamentos de veículos, de acordo com as fiscalizações do órgão. São Luís tem hoje 1.432 prédios tombados pelo governo federal e também pela Unesco, além dos 4.400 de responsabilidade do Estado.

Segundo o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), para montar um estacionamento rotativo, é necessário legalizar a empresa nos seguintes órgãos: Junta Comercial; Secretaria da Receita Federal (CNPJ); Secretaria Estadual de Fazenda; Prefeitura Municipal, para obter o alvará de funcionamento; Entidade Sindical Patronal em que a empresa se enquadra (é obrigatório o recolhimento da Contribuição Sindical Patronal por ocasião da constituição da empresa e até o dia 31 de janeiro de cada ano); Caixa Econômica Federal, para cadastramento no sistema “Conectividade Social – INSS/FGTS”; Corpo de Bombeiros Militar.

Além do cumprimento das exigências anteriores, é necessário pesquisar na prefeitura se a Lei de Zoneamento permite a instalação de estacionamento rotativo no local. Porém, a legibilidade destes estacionamentos no Centro da Cidade é bastante questionada.

Gustavo Braga, que trabalha como vendedor em uma loja no Centro, disse que a maioria desses imóveis não tem autorização para funcionar como estacionamento. “É estranho, você passar em um dia e não ter nada ali e no outro dia já existe um estacionamento! Acho que, como não tem ninguém que fiscalize essa área aqui, constantemente, eles aproveitam para fazer estacionamento”.

Foto: Honório Moreira/ O Imparcial

Negócio lucrativo

O preço cobrado pelos estacionamentos também é uma reclamação de muitos motoristas. Segundo Emerson Ramos, o valor alto cobrado em alguns locais não é justificado por estrutura nenhuma. “A maioria dos estacionamentos cobra entre R$ 3 e R$ 5. Alguns chegam a cobrar R$ 10 para estacionar em um espaço aberto que nem cobertura para os carros tem. Com certeza, são casas que deveriam estar abandonadas e agora estão aproveitando só o espaço para fazer estacionamentos”, conclui Emerson.

Ao que parece, o negócio é bem lucrativo, já que todos os estacionamentos no entorno do centro comercial, como os localizados na Rua do Sol, Rua da Paz, Rua de Santana, entre outras, estão sempre com um fluxo intenso de carros saindo e entrando e com suas garagens sempre cheias.

Apesar de não querer falar à reportagem, um funcionário de um estacionamento em uma rua de grande movimento do Centro admitiu que, no local onde foi instalado, existia anteriormente uma casa, que não soube explicar se era datada do período colonial, mas que afirma ter sido destruída para que houvesse espaço para mais carros.

Na mira da fiscalização

A Superintendência do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) informou em nota que a descaracterização ou mutilação do patrimônio cultural edificado tombado não é permitida pelo órgão, e vai contra o que preconiza o Decreto Lei nº 25, de 1937, que baliza todo o trabalho da instituição.
Segundo o órgão, todos os imóveis já identificados apresentam Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público Federal, que trabalha conjuntamente com o apoio da Superintendência. O Iphan, em cumprimento às atribuições constitucionais de fiscalizar o patrimônio cultural protegido pela União no Maranhão, afirma que realiza um árduo trabalho de fiscalização nos bens tombados e/ou valorados, orientando os responsáveis/proprietários sobre quais as medidas necessárias para garantir a preservação e conservação desse patrimônio.

No caso das edificações descaracterizadas para funcionamento da atividade comercial de estacionamento, a Superintendência do Iphan/MA diz que denunciou os proprietários ao Ministério Público Federal e abriu Ações Civis Públicas contra os mesmos por dano ao patrimônio cultural tombado pelo governo federal.
O órgão diz ainda não possuir dados acerca da emissão de alvarás, pois trata de serviço de competência exclusiva da Prefeitura de São Luís, através da Secretaria Municipal de Fazenda e da Secretaria Municipal de Habitação e Urbanismo, mas lembra que o uso de estacionamento como atividade comercial não é permitida pela legislação urbanística municipal.

O Departamento de Patrimônio Histórico, Artístico e Paisagístico (DPHAP), órgão ligado à Secretaria de Estado de Cultura e Turismo (Sectur), informou que conta com uma estrutura de fiscais que percorrem diariamente as ruas do Centro Histórico relacionadas ao tombamento estadual, notificando e, caso necessário, embargando quaisquer tipos de construções ou reformas irregulares. O DPHAP destacou que não emite pareceres em favor de obras para estacionamentos nessa região.

Já a Secretaria Municipal de Urbanismo e Habitação (Semurh) informou que realiza, por meio da Blitz Urbana, levantamentos técnicos diários para apurar essa situação, e que tem causado o embargo e a judicialização de casos em que foram constatadas irregularidades. A Semurh destacou ainda que quaisquer obras em imóveis no conjunto tombado devem ser aprovadas pelos órgãos de proteção, e que a maioria dos proprietários de imóveis com intervenções irregulares respondem a processos nas Justiças estadual e federal.

Imagem negativa

Para quem já apreciou as belezas dos azulejos e sacadas em estilo colonial de São Luís, é uma pena a perda gradativa de um museu a céu aberto. A turista baiana Teresa Mesquita diz que hoje o acervo arquitetônico preservado só existe na Praia Grande, um dos pontos turísticos que mais recebem visitantes.
“Eu vim a São Luís pela primeira vez há mais de dez anos. O Centro Histórico não era só aquele pedacinho, onde tem bares e eventos noturnos. A cidade era cheia de casarões. Até a parte comercial era nostálgica. Entre a Fonte das Pedras e o Arthur Azevedo, tinha história. Hoje é tudo comércio e quase não tem mais nada! Triste ver a história se perder assim”, lamenta ela.

Alguns motoristas, porém, acreditam que a existência de estacionamentos, mesmo em prédios históricos, é necessária para facilitar a acessibilidade de pessoas a um dos centros comerciais mais tradicionais da cidade. O taxista Felipe Silva estaciona sem problemas nos rotativos e acredita ser mais seguro que deixar o carro na rua.
“O movimento de pessoas no Centro é muito grande, e precisa sim de lugares para estacionar, o que quase não existe mais. Eu coloco sempre meu carro nos estacionamentos rotativos, porque, apesar do preço ser um pouco maior, é mais seguro, não pode acontecer de alguém passar e riscar o carro ou fazer qualquer coisa com ele”, afirma Felipe.

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