Crianças e adolescentes

Mais de duas mil ocorrências por ano contra crianças e adolescentes

A ameaça o tipo de agressão mais comum, dentre os vários tipos de violência; números de registros não correspondem à realidade

Como proteger o nosso público infantil da violência? Como atestar que ele vai chegar à vida adulta sem lesões, marcas, traumas físicos ou psicológicos? Como acabar com a violência contra crianças e adolescentes? Perguntas como essas são mais frequentes quando se constatam dados e estatísticas apontados pelos órgãos de proteção e defesa da criança e do adolescente. O caminho é longo, mas é necessário fortalecê-lo, principalmente em dias como o de hoje, de enfrentamento ao Dia Nacional de Combate ao Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, 18 de maio.

Dados da Delegacia Especial de Proteção à Criança e Adolescência (DPCA) apontam que até agora, neste primeiro trimestre, já foram instaurados 185 inquéritos de crimes variados, o que, em comparativo com todo o ano de 2016, quando esse número chegou a 475, é considerado alto. Por anos, a delegacia registra mais de 2 mil ocorrências.

Por dia, são registradas em média 10 ocorrências, entre ameaças, lesões corporais, abusos sexuais, desparecimento. Segundo a delegada Ana Zélia Gomes, ameaça é o mais frequente, seguido de lesão e abuso. “Mas não necessariamente os abusos são os que menos acontecem, são os que menos chegam ao nosso conhecimento. Porque esses crimes geralmente são praticados por alguém do ciclo dessa criança/adolescente e geralmente acabam não contando. Ou, quando contam, a família às vezes não quer expor. Porque a partir do momento que a família se predispõe a ir a uma delegacia e relatar um abuso, toda essa estrutura familiar desaba, embora seja de fachada, porque está acontecendo uma abuso contra uma criança ou adolescente”, alerta a delegada.

Esses dados, segundo especialistas, geram uma questão: ou os casos de violência estão aumentando, ou as pessoas estão denunciando mais. De todo modo, revelam ainda o quanto ainda se está longe no combate à violência contra a criança e o adolescente.

Levantamentos do Disque 100 apontam que a maioria das denúncias de violência sexual contra crianças e adolescentes no Maranhão é de abuso sexual.

Esses números também apontam que cerca de 90% dos autores de denúncias de violência contra crianças e adolescentes feitas, via Disque 100 e por meio dos 10 conselhos tutelares de São Luís, não chegam a ser punidos. Estes são alguns dados relacionados à violência contra crianças e adolescentes em São Luís e que se repetem no estado todo.

Todos os anos, entidades comprometidas com esta causa buscam sensibilizar as pessoas de maneira mais efetiva no 18 de maio. No início do mês, o Ministério Público do Maranhão abriu a programação da campanha de combate à exploração sexual infanto-juvenil com o seminário “Estupro de vulnerável e convivência marital: prevenção, abordagens e enfrentamento”.

Para a presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA), Janicelma Fernandes, um dos maiores desafios tem sido tirar do papel toda a política em defesa das crianças e adolescentes vítimas de violência e abuso sexual. “É preciso punir criminalmente o agressor, mas também prevenir e, principalmente, cuidar das vítimas, acolhê-las”, ressalta.

COMPARATIVOS SÓ CRESCEM

Mais de 70% das crianças vítimas de violência e abuso sexual que chegam ao Centro de Perícias Técnicas da Criança e do Adolescente (CPTCA), em São Luís, não têm vestígios físicos. A informação é da encarregada da Perícia Médica e Psicológica do Centro, Moara de Oliveira Gamba.

O Centro recebe crianças encaminhadas das delegacias, promotorias e varas para perícia médica, psicológica e social, e tenta oferecer um serviço diferenciado de acordo com a faixa etária da criança o do adolescente. Para detectar os indícios da violência, são adotadas técnicas nas perícias psicológicas e sociais que apontam sinais da situação vivida pela criança “Não se trata de um interrogatório porque temos que ter o cuidado de não revitimizar a criança/adolescente”, comenta a psicóloga.

Os números apresentados pelo CPTCA apontam até este primeiro trimestre um aumento de 23 por cento no registro de ocorrências de violência. São 391 atendimentos, envolvendo 181 casos de violência sexual. Os dados comparativos, segundo ela, só têm aumentado. “Aí a gente se pergunta: está tendo mais violência, ou as pessoas estão denunciando mais? Outra coisa que é bem interessante, nós fizemos uma vez uma coleta sobre os bairros de maior incidência de violência. Isso não diz pra gente sobre uma realidade total, porque se formos ver, as duas áreas de maior incidência são Coroadinho e Itaqui-Bacanga. Mas será que a demanda de violência sexual só tem ali naquela região? É o que nos chega quando, por exemplo, o conselho tutelar é mais atuante. Mas a gente não tem como relacionar isso como sendo a área que tem mais violência porque esses crimes infelizmente acontecem em todas as classes e a classe alta não denuncia. Chegam poucos casos aqui, muitos procuram acompanhamento particular”, constata a psicóloga.

REDES SOCIAIS

Para a delegada Ana Zelia, o que facilita a prática desses crimes são as redes sociais, quando a criança e o adolescente têm mais acesso e estão mais vulneráveis a abordagens externas, mas dá para perceber os sinais de que algo está errado.

“Todo mundo hoje tem acesso à internet, computador, celular, mas poucos são os pais que conseguem fazer um controle do conteúdo que esses filhos estão acessando. O primordial é o representante dessa criança ou adolescente prestar atenção. Porque 10% das vezes que a criança ou adolescente está sofrendo algum tipo de conduta criminosa ele dá sinais. Ou ele fica mais calado, irritado, o comportamento muda. Mesmo ele não conseguindo verbalizar, dá para perceber pelo comportamento. Esse é o primeiro passo”, constata a delegada.

PARA COMBATER

Para marcar o 18 de maio, entidades comprometidas com esta questão estão desenvolvendo em São Luís atividades e ações desde o início da semana. A programação inclui debates, exposição, panfletagem, caminhada e corrida alusiva à data. O ponto alto será uma caminhada no dia 18, com concentração a partir das 15h, em frente à Biblioteca Pública, na Praça Deodoro, seguindo pela Rua Grande até a Prefeitura Municipal, na Praça Pedro II.

A presidente do Conselho Municipal de Defesa da Criança e do Adolescente (CMDCA), Janicelma Fernandes, admite que um dos maiores desafios tem sido tirar do papel toda a política em defesa das crianças e adolescentes vítimas de violência. Ela destaca o 18 de maio como uma boa oportunidade de dar maior visibilidade ao problema e mobilizar a sociedade para denunciar.

A Secretaria Estadual de Direitos Humanos e Participação Popular (Sedihpop) em parceria com a Secretaria Estadual de Educação (Seduc) está realizando desde o ultimo dia 15, diversas ações de mobilização em escolas públicas de São Luís, com ações estratégicas que visam conscientizar a população no combate a este tipo de violência no estado. Hoje a programação da Semana 18 de Maio encerra visitando os alunos da UEB Gomes de Souza, na Vila Maranhão, zona rural de São Luís.

“A cultura de proteção da infância e da adolescência é direito e responsabilidade de todos nós – poder público e sociedade civil. As ações têm como foco os jovens de escolas públicas de São Luís. O objetivo do governo é ampliar os espaços de debate e enfrentamento dentro e fora das escolas, nas ruas, praças, feiras, espaços públicos e redes sociais”, destacou o secretário estadual de Direitos Humanos e Participação Popular, Francisco Gonçalves.

COMO DENUNCIAR

O Disque 100 é um serviço de recebimento, encaminhamento e monitoramento de denúncias de violência contra crianças e adolescentes, especificamente, e contra os direitos humanos, em geral. Ele funciona diariamente de 8h às 22h, inclusive nos finais de semana e feriados. As denúncias são anônimas e podem ser feitas por discagem direta e gratuita.

A DATA

Instituído pela Lei Federal 9.970/2000, o Dia Nacional de Combate ao Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes foi instituído em memória da menina Araceli Santos, 8 anos, vítima de extrema violência e abuso sexual, assassinada brutalmente neste mesmo dia, em 1973, na cidade de Vitória, no Espírito Santo.

NÚMERO DE CASOS

– O número de ocorrências de crimes contra crianças e adolescentes no Maranhão passa de 2 mil por ano, segundo a Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente.

– Os casos de abuso sexual fazem parte de 85% das denúncias de violência sexual.

– Cerca de 90% dos autores de denúncias de violência contra crianças e adolescentes feitas pelo Disque 100 e por meio dos 10 conselhos tutelares de São Luís não chegam a ser punidos.

– Muitas famílias desconhecem o assunto e não sabem quais órgãos procurar quando se deparam com esse tipo de crime.

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