Aprendendo

O jeito único de ser do autista

O autismo afeta pessoas que podem ter dificuldades de aprendizagem em diversos estágios da vida, mas assim como qualquer ser humano, cada pessoa com a patologia é única e todas podem aprender

Vitor Oliveira tocando teclado. Foto: Karlos Geromy

Eles vivem no mundinho deles. Às vezes dispersos, às vezes concentrados demais. Quando desde bem pequeno, Vitor de Oliveira Araújo, 15 anos, passava horas e horas vendo a mesma figura em um livro, ou quando não interagia com outras crianças ao redor, a mãe, Regina Oliveira, começou a perceber que havia algo de estranho. Mas foi somente aos sete anos, depois de percorrer consultórios de vários profissionais, que ela recebeu o diagnóstico: autismo moderado.

O susto foi grande, mas a vida seguiu com acompanhamento médico e hoje Vitor, que tem várias habilidades artísticas, conforme ele mesmo diz, leva uma vida quase normal. “É apenas um transtorno que me afetou o cérebro. Às vezes, ele me impede de fazer algumas coisas, mas eu faço quase tudo”.

O depoimento para a reportagem veio depois de um dia estressante que Vitor passou. A mãe dele, Regina, disse que ele estava muito chateado com alguma coisa que aconteceu na escola e desde então se fechou, decidiu não falar com ninguém.

“Ele, assim como outros autistas, foge muitas horas do dia e durante poucas ficam por aqui com a gente, mas ainda assim, no caso dele, fica 50% do dia convivendo conosco”, comenta Regina sobre o isolamento, característica comum aos autistas.

Vitor é uma das 7 mil pessoas, segundo a Associação de Amigos do Autista do Maranhão, que possui o transtorno no Maranhão. Hoje, 2 de abril, é o Dia Mundial de Conscientização do Autismo, e mais que figurar como um número, os autistas e suas famílias querem orientação, profissionais qualificados para atender a patologia, saber lidar com a patologia.

O transtorno

O autismo é um transtorno cujos sinais surgem geralmente, nos três primeiros anos de vida, mas segundo os pais, é difícil de ser diagnosticado logo, devido, principalmente à falta de profissionais de área da saúde capacitados. Os principais sintomas são os problemas com a linguagem, interação social e comportamento – que é restrito e repetitivo.

Acomete cerca de 20 entre cada 10 mil nascidos e é quatro vezes mais comum no sexo masculino do que no feminino. É encontrado em todo o mundo e em famílias de qualquer configuração racial, étnica e social.

Quando uma criança apresenta dificuldades para aprender a falar, problemas de interação social e movimentos repetitivos sem nenhum motivo aparente pode ser autismo. Mais recentemente, cunhou-se o termo Transtorno do Espectro Autista (TEA) para englobar o Autismo, a Síndrome de Asperger e o Transtorno Global do Desenvolvimento Sem Outra Especificação.

Pais devem ser orientados

Em 2012 um grupo de pais preocupados em dividir e somar experiências sore o autismo, como fazer, o que fazer, quem buscar, fundou o Grupo Ilha Azul. 18 pessoas organizam o grupo. Luise M. Winkler Mattos é membro fundadora e diz que como o grupo não tem associados, mas possuem um grupo em aplicativo de mensagem que conta 230 pessoas.

“Lá são trocadas as mais diversas informações, experiências… a gente comemora cada desenvolvimento das crianças, chora junto, diz qual melhor caminho”, conta Luise, mãe de Roberth Yudi, 8 anos, diagnosticado com autismo leve.

A percepção de alguma coisa estava diferente foi quando ele tinha 1 ano e meio porque ele não tinha contato visual, não interagia com outras pessoas. Antes de procurar um profissional tentou encontrar motivos para o comportamento. Um médico chegou a tranquiliza-la dizendo que era isso mesmo, e que cada criança tinha o seu tempo.

“A gente meio que se acomodou com isso até que depois de matriculá-lo na escola e a adaptação ser muito difícil, os profissionais me chamaram para dizer do comportamento dele e apontaram uma série de características que poderiam ser do autismo, até que um neurologista deu o diagnóstico de um autismo leve. Fiquei aliviada por não ser a forma mais grave do transtorno. Foi aí que comecei a buscar outras mães para saber como lidavam com seus filhos, porque pode parecer que não, mas os pais também devem buscar orientação de como devem tratar seus filhos, não apenas o filho deve ser assistido por um profissional”, aponta Luise.

O grupo sempre realiza eventos com profissionais de outros estados que esclarecem dúvidas sobre o transtorno.

Luta diária

Com pelo menos 40 associados, a Associação de Amigos do Autista do Maranhão atende crianças cadastradas, via projetos com duração determinada (hidroterapia, capoeira, por exemplo) patrocinados por doação, acolhimento e orientação de famílias.

Sem uma sede própria, o evento de hoje também é um pedido de alerta para que seja viabilizada uma sede própria para realização dos projetos e auxílio profissional aos autistas e seus familiares.

Presidida atualmente por Norma Assunção dos Passos, a AMA atua na defesa dos direitos dos autistas, como por exemplo no Conselho Municipal das Pessoas com Deficiência.

Mãe de Yuri Assunção, que recentemente fez 34 anos, Norma diz que a AMA agrega autistas de todas as idades. “O meu filho é um exemplo, é uma longa e árdua história de luta até aqui. Fez 34 anos e faz todas as atividades possíveis. É uma luta. Os pais devem saber como lidar com o filho autista, e a AMA está aqui para auxiliar, mas é preciso também que o poder público nos ajude, pois atualmente não contamos com o apoio do poder público. Yomar da Silva Martins, o nosso vice-presidente que tem um neto autista, é responsável pela iniciativa, de lutarmos e nunca desistirmos. Ele luta muito pela causa e merece todo o nosso respeito”, afirma Norma.

Vitor artista

Muito provavelmente Vitor experimentará várias coisas ao longo da vida. É característica dele. Autodidata, ele aprende sozinho e já se encantou pelo artesanato, pela música, pelos instrumentos, pelas artes marciais. Segundo ele, o que mais gosta de fazer é “ouvir música andando e treinar a minha arte marcial. Sei tocar teclado e aprendi sozinho na internet, mas o meu instrumento favorito é o sax”. Para a mãe dele, Regina, que também é artista (atriz e cantora) e incentiva essa área, a música é o que mais o acalma nos dias agitados. “Ele que escolhe o que quer ouvir. E toca de ouvido. Agora está fazendo sax, está na escola de música enquanto não quiser desistir, mas a música é a principal via de aprendizado dele”, diz Regina.

Sobre o Ilha Azul

Foi para facilitar essa interação e compartilhar experiências – O grupo surgiu com o intuito de desenvolver atividade de assistência integral e multiprofissional para atendimento aos indivíduos com TEA. É uma entidade de direito privado, sem fins lucrativos, que tem, entre seus objetivos específicos, a capacitação de profissionais especializados no atendimento de indivíduos com TEA, elaboração e fomento de políticas públicas que respaldem o desenvolvimento, o trabalho e a assistência ao indivíduo com TEA, além de promoção de debates, organização de eventos, seminários, feiras, cursos, especializações e ciclos de palestras sobre o tema.

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