Consumo

De onde vem a água potável?

O mercado de abastecimento por meio de caminhões-pipa, que crescia bastante nos últimos anos, hoje enfrenta, além da ilegalidade de algumas empresas, a oferta que ultrapassa a demanda

Venda de água em carros pipas. Foto: Honório Moreira.

As interrupções do fornecimento de água, rompimento de adutoras e outros problemas de outrora fizeram crescer um mercado que há muito era exclusivo das pessoas com maiores condições financeiras ou de restaurantes, empresas de ramos variados e locais com um grande consumo de água.

O boom de caminhões-pipa, que começaram a seguir de um lado a outro da cidade nos anos 2000, parecia ser um negócio lucrativo, fácil e de muita clientela, principalmente com a popularização dos serviços em bairros mais periféricos.

Mas, apesar de um número elevado deles ainda se manter no ramo, o que existe realmente é uma queda na procura desse serviço, principalmente entre as empresas que atuam de forma legal, pagando todos os impostos necessários e com preocupação com o meio ambiente.

A principal queixa dos revendedores de água é a facilidade com que alguns caminhões não vinculados às empresas prestam o mesmo serviço, com preços menores, e não são obrigados a pagar taxas ou manter o padrão de qualidade da água.

Há 24 anos no mercado, o empresário Gilvan Sabóia observa um ambiente muito diferente de quando começou, apenas com o abastecimento por meio de caminhões-pipa, e destaca como um dos problemas enfrentados hoje a existência de empresas ilegais e a oferta exagerada para uma demanda que diminuiu.

“Eu tenho uma empresa totalmente legalizada, e com isso tenho custos, tenho técnicos em meio ambiente atestando a qualidade da água, toda uma estrutura para oferecer serviços de qualidade e, claro, tudo isso encarece o valor final da água. Por outro lado, há pessoas que não têm nenhum tipo de credenciamento, seja na Secretaria de Meio Ambiente (Sema) ou órgãos fiscalizadores. Algumas pessoas simplesmente compram um caminhão-pipa, deixam estacionado em postos de gasolina, pois nem têm um espaço adequado para ele, e durante o dia vão em fontes para abastecer o carro e revender a água a preços mais baixos. A população é claro que procura por preços menores, principalmente as pessoas mais carentes, que se juntam para comprar água para várias casas em uma mesma rua”, atesta Gilvan Sabóia.

Custos

Os preços variam entre os caminhões com capacidade para 8 mil litros até 32 toneladas, e os valores ficam entre R$ 140 e R$ 600. Segundo Gilvan, para entrar no negócio de água, são necessárias algumas autorizações, principalmente para que seja feita a perfuração dos poços de onde a água será retirada, assim como local apropriado, estudo preliminar da área, entre outras coisas. Hoje, Gilvan diz que é impossível se manter apenas com os caminhões-pipa, e na verdade direcionou a empresa para outros caminhos. “Eu trabalho atualmente com a captação e manutenção de poços artesianos, além da distribuição e também com rede de esgotos. Consigo ter lucros ainda com a distribuição em carros-pipa por conta de alguns contratos com grandes empresas, como hospitais, escolas e outros, mas é claro que a demanda é muito menor que a oferta”.

Ele conclui com sua visão particular sobre o crescimento desse mercado e faz previsões para o futuro. “Acredito que o crescimento se deu por conta de vários fatores de antigamente, o rodízio do sistema de abastecimento da Caema, as quebras que aconteciam frequentemente nas redes de água, assim como trabalhar com pipa se tornou muito barato. Hoje, faço poucas entregas em residências, e ainda existem algumas em condomínios. Mas, só para ter uma ideia, nesses anos todos nunca teve um síndico de prédio, por exemplo, que veio aqui saber dos estudos que faço sobre a qualidade da água, sempre a preocupação com o preço mais barato, uma parcela da população que se preocupa com a qualidade da água antes do preço. Acho que, com a obra da Italuís, esse mercado deve diminuir ainda mais”.

A dona de casa Marilda Borges, moradora do Anil, admite que não se preocupa muito com a qualidade da água e que, na necessidade, busca o que estiver mais favorável. Ela alega que a água do abastecimento público também não é das melhores. “Eu não tenho como ficar gastando muito, e na falta d’água procuro os carros-pipa mais baratos, às vezes são caminhões bem velhos, mas também não posso dizer muito sobre a água da Caema. Tem um poço aqui no bairro e mesmo assim a falta d’água acontece, e como vou saber se essa água está sendo tratada antes de vir para minha casa. Até onde sei, ela é jogada direto na tubulação”, reclama Marilda.

Sobre os apontamentos da dona de casa, a Companhia de Saneamento Ambiental do Maranhão (Caema) informou que existem os chamados Sistemas Isolados, que fazem o lançamento na tubulação de abastecimento. A Caema ressaltou também que possui um programa de monitoramento e cloração de poços e redes e, através das obras do Italuís, assegurará mais 30% de água para regularizar o abastecimento de grande parte da cidade, atendendo inclusive a área do Porto do Itaqui.

Sobre a qualidade da água distribuída pelos caminhões-pipa, a Secretaria Municipal de Saúde (Semus) informou que tem feito vistorias para garantir a qualidade da água distribuída pelas empresas e pelos pipeiros. Todas as sextas-feiras, técnicos se deslocam para empresas de comercialização e transporte de água, para fazer vistorias e orientações. Aquelas que estão dentro das normas recebem um selo de aprovação que tem validade de um ano. O controle vai desde a inspeção do veículo (condições de limpeza e conservação) até o resultado da análise do material coletado nas fontes de abastecimento e nas cisternas. Estas análises verificam a potabilidade, a turbidez, a quantidade de cloro, a presença de coliformes e as condições dos carros-pipa que fazem o transporte da água.

E a qualidade?

Segundo os próprios motoristas, existem 18 empresas atuando com o abastecimento de água através de carros-pipa, mas, quanto aos que atuam à margem da conformidade, é impossível de se ter certeza. Os locais apontados como “dormitórios” de caminhões, que não têm sequer uma garagem para passar a noite, são postos de combustíveis ao longo da Ponta d’Areia, que supostamente realizam fretes de água para vários condomínios nessa região, bares e restaurantes.

Existem caminhões circulando com ferrugem, sinais de deterioração e vazamentos de água, o que indica precárias condições para o armazenamento e distribuição de água que possa ser considerada potável.

Em nota, a Sema disse ter conhecimento de ilegalidades no transporte e comércio de água por caminhões-pipa. Segundo o órgão, fiscalizações vêm sendo realizadas no intuito de coibir esse tipo de crime. A Sema informou ainda que, para qualquer empresa estabelecer um ponto de exploração e captação de água a partir da perfuração de poços artesianos, é necessário obter a outorga de água. São situações que requerem outorga de uso de recursos hídricos: a derivação ou captação de parcela de água existente em um corpo hídrico para consumo final, inclusive abastecimento público, ou insumo em processo produtivo.

Para o proprietário de uma empresa que trabalha exclusivamente com o abastecimento, Luis Raimundo, os números de 2016 para cá trouxeram consigo uma redução de 60% de pedidos, e manter o negócio é um trabalho árduo de dedicação “Houve um tempo em que recebíamos pelo menos 80 pedidos por dia e, hoje, saem do pátio entre 30 e 35 caminhões carregados por dia”. Ele acredita que vários fatores influenciaram no crescimento dessa demanda, mesmo que não pareça um bom negócio atualmente, como a explosão imobiliária. “A maioria dos meus clientes são condomínios e prédios, que têm um consumo grande de água. A maioria das pessoas que trabalha nesse ramo abastece esses locais, salvo os que conseguem abastecer residências em locais específicos. Eu já abasteci muito a área do Centro que, historicamente, sempre teve problemas com água, e que para mim era mais fácil abastecer por ter caminhões menores”.

Raimundo acredita que as condições melhores de abastecimento, assim como o aumento exponencial de poços artesianos, têm diminuído a procura. “Hoje, o abastecimento é bem melhor, você não vê constantemente quebras de adutoras e vem aí a duplicação do Italuís, o que deve diminuir ainda mais a procura. Além disso, hoje é bem fácil perfurar um poço artesiano na sua residência, e as pessoas estão optando por isso. Os clientes que se mantêm fiéis à compra de água são os que percebem uma economia maior nesse método do que pagar as contas de água de acordo com seu gasto, que por vezes é intenso”.

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