A luta do farmacêutico no mercado de trabalho
A profissão de farmacêutico conquistou marcos importantes nos últimos anos. Mas quer avançar mais. “Estamos no eixo da saúde pública do Brasil”, diz o conselheiro Fernando Bacelar
Hoje, 20 de janeiro, é comemorado o Dia Nacional do Farmacêutico. Nos últimos anos, a categoria coleciona avanços. Entre eles: a aprovação da Lei 132, que valoriza o reconhecimento da profissão e muda o conceito de ser farmacêutico.
Conselheiro mais jovem do Brasil, o maranhense Fernando Bacelar, que é professor e doutor em saúde pública, participou das mais importantes lutas encabeçadas pelo Conselho Federal de Farmácia. Em entrevista a O Imparcial, ele analisa a profissão e fala, por exemplo, do curso à distância de farmácia que pretende capacitar 70 mil profissionais gratuitamente em todo o Brasil.
O IMPARCIAL – Qual o papel do Conselho Federal de Farmácia e que avanços importantes vocês destacam?
Fernando Bacelar – Através desse conselho conseguimos uma coisa importantíssima que foi a criação do Fórum Nacional de Luta pela Valorização da profissão farmacêutica. Dentro desse fórum, destacamos cinco pontos a tratar. O primeiro deles é essa mudança de conceito dos estabelecimentos farmacêuticos que nós consideramos um avanço para o segmento. A única lei que tratava sobre farmácia e drogaria era uma lei de 1973 que estava muito ultrapassada, a Lei 5.991, lei de aspecto sanitário.
Qual sua participação na aprovação dessa lei?
Existia uma lei, de autoria da senadora Marluce Pinto, que tramitava há 20 anos no Congresso Nacional e tinha o objetivo de tirar o farmacêutico da farmácia. Nós fizemos uma lei contrária a isso. Mudamos o conceito do que era farmácia. Esse é considerado hoje o maior avanço da história farmacêutica. Outros pontos que nós lutamos foi que o farmacêutico tivesse um piso nacional; a redução para uma carga horária de 30 horas; inserção dos farmacêuticos no Sistema Único de Saúde (SUS), além de uma carreira nacional, onde os profissionais do SUS, médicos, enfermeiros, entre outros, tivessem uma carreira de estado, assim como a carreira jurídica, onde um juiz passa um tempo no interior e depois retorna para capital.
Essa é a lei que obriga as farmácias a ter profissionais…
É a Lei 1.321, que garante a presença do farmacêutico dentro dos estabelecimentos farmacêuticos e muda o conceito do que é farmácia. Enquanto a lei 5.991 tratava a farmácia como um simples comércio, a Lei 1.321 reclassifica esse conceito a farmácia como uma unidade de assistência farmacêutica e orientação individual e coletiva. Além disso, farmácia vai dispor hoje de vacinas de surtos epidemiológicos, aplicação de soro e ter autoridade técnica, onde vai ter o farmacêutico exercendo atribuições clínicas, por conta da atuação do conselho, em parceria com a Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Qual o grande mercado para o profissional farmacêutico hoje?
Temos trabalhado muito nestes últimos três anos para a valorização do farmacêutico como profissão. Nós temos dez eixos de trabalho, 134 especialidades de atuação profissional. Porém, a farmácia comunitária, que é o termo que a gente utiliza, é aquela que tem a maior empregabilidade. A profissão teve um hiato pós industrialização desses medicamentos, e este mercado começou a crescer principalmente nos países latinos sem uma correlação ao número de profissionais. Como o profissional possui muitas áreas de atuação nesse segmento, ele procurou as áreas mais rentáveis. Isso é tão claro que quando só tinha a Universidade Federal do Maranhão e perguntava para um profissional “Você é farmacêutico?”, era comum ouvir: “Não, eu sou bioquímico”. E hoje isso vem se transformando. O Conselho Federal de Farmácia criando uma nova diretriz, devido a Lei de Diretrizes de Bases de 1996, com a qual os profissionais da área da saúde não podem mais focar uma formação por habilitação. Eles têm que ter um foco de atuação generalista, principalmente para a saúde pública.
Qual será a bandeira em 2017 do Conselho Federal de Farmácia?
O Conselho Federal de Farmácia começou a veicular uma série de propagandas em rede nacional e grandes mídias mostrando a atuação do farmacêutico em todos os eixos, como laboratório de análises clínicas, a indústria, a docência, entre outros que temos trabalhado. Temos um guia de prática exitosas no Sistema Único de Saúde que mostra o farmacêutico como investimento e não como custo. E o que é mais importante é que o Conselho Federal de Farmácia lançou um curso na modalidade ensino à distância que vai ser copiado por todos os conselhos regionais do país para capacitar 70 mil farmacêuticos brasileiros de forma gratuita. Onde chegará na residência do farmacêutico um guia de práticas clínicas todo chancelado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), Organização Panamericana de Saúde e a Fundação de Médicos de Família. Essa é uma forma que o conselho que mostrar para o farmacêutico de como o conselho confia nele para trabalhar e mudar essa realidade da saúde no Brasil.
Por que medicamento é tão caro no país?
Nós não temos fabricação própria no Brasil. A gente tem matéria-prima, mas essa matéria-prima vai pra fora e a gente exporta novamente em forma de medicamentos caríssimos. Nós não temos um marco regulatório da saúde pública no Brasil. Nós temos planos de governo, mas não temos plano de nação. Ou seja, entra um gestor público e aplica um programa como o farmácia popular ou um outro parecido. Mas como nação eu pergunto: é isso que a gente precisa? A partir do momento que a saúde pública tiver um marco regulatório a gente vai entender o que a gente quer como plano de nação. E essa discussão perpassa pela farmácia como um todo. A farmácia está inserida em todos os eixos de saúde do Brasil. Se a farmácia já tivesse um entendimento e as conversações não tivesse politicagem e sim programas de política, a gente não teria planos de governo como a gente tem.
Como você analisa essa proliferação de redes de farmácia pelo país. Essa concorrência com os pequenos estabelecimentos é saudável?
Meu sonho como farmacêutico e como consumidor é que a farmácia brasileira fosse como farmácia europeia, onde os proprietários todos são farmacêuticos. Uma forma legal de diminuir esse avanço das grandes redes seria ter farmácias privativas ou exigir que um percentual delas fossem de farmacêuticos. A gente costuma dizer que “farmácia não é supermercado, farmácia é um local de cuidado em saúde”. Ela tem que ser vista como a porta de entrada da saúde. Hoje temos 27 conselhos regionais, que tem que ter como zelo o mantimento da ética profissional. Isso faz toda a diferença.
Hoje é muito comum as pessoas comprarem suplementos, hormônios e até medicamentos pela internet. Alguns deles que ainda não são nem comercializados no Brasil. Como é que o senhor vê essa prática?
Segundo a Anvisa, todos os medicamentos que são importados para ser consumido no Brasil precisam de autorização do Ministério da Saúde. Justamente para dar segurança ao usuário daquilo que ele está consumindo. Para esse ano nós vamos trabalhar, eu e mais dois colegas do Conselho Federal de Farmácia, uma aproximação maior junto a Anvisa e o Conselho Federal de Medicina e Nutrição para que a gente possa criar um marco regulatório dessa questão que chamamos de nutracêuticos e suplementos alimentares. Isso virou uma febre e vem sendo vendido na internet de uma forma muito simples e que não há um responsável técnico sobre isso.