Mais de 13 horas de sessão, um discurso de quase 50 minutos e a paciência para responder, um por um, os 47 senadores que lhe apresentaram questionamentos. Todo o esforço, contudo, em vão. A presidente afastada, Dilma Rousseff, até conseguiu produzir um material para o futuro do PT e da biografia dela, mas incapaz de virar votos. A partir de hoje, após uma nova rodada de longos debates, os senadores devem aprovar o afastamento definitivo de Dilma da Presidência da República.
Depois da maratona dilmista no Senado, a conta do Planalto continua a mesma: entre 60 e 62 votos favoráveis ao impeachment. “O discurso pode ter sido bom para o ego dela. Mas não convenceu ninguém aqui dentro”, reforçou o líder do DEM no Senado, José Agripino Maia (RN). “Se ela tivesse sido objetiva, respondendo pontualmente aquilo que lhe era perguntada, poderia até convencer alguém. Mas quando perguntávamos uma coisa, ela respondia outra”, prosseguiu o líder do DEM.
O rito de ontem acabou massacrante para todos, inclusive para a petista. Mas inócuo, na visão de alguns dos próprios aliados. “Foi longa demais a fala dela. Quando ela esbarrou no tecnicismo, aí sim que não conseguiu mais o apoio de ninguém mesmo”, afirmou um petista.
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Mesmo assim, ainda há movimentos em Brasília e muitas conversas acontecerão ao longo do dia de hoje. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que esteve ontem quase o dia inteiro no Senado, acompanhando a sucessora, se empenha pessoalmente em conversar com um núcleo de senadores maranhenses: João Alberto, Edison Lobão, ambos do PMDB, e Roberto Rocha, do PSB.
A cúpula petista autorizou acordos municipais para que candidatos petistas no Maranhão apoiem nomes do PMDB, em detrimento de alianças antigas com o PCdoB. “Lula tem conversado com muita gente. É claro que ele não viria para a cidade para ficar calado”, admitiu o ex-ministro do Esporte e da Defesa Aldo Rebelo.
Alguns senadores ainda se mantêm em cima do muro, embora a pressão sobre eles seja brutal. Telmário Mota (PDT-RR) afirmou que decidirá hoje o voto no processo. “O discurso dela foi bom, ela manteve a tese de que foi injustiçada”, desconversou. Após a intervenção dele no plenário, o pedetista foi abraçado por aliados de Dilma. Mas a realidade colocou-lhe encostado na parede.
A popularidade de Telmário despencou no estado que já é, tradicionalmente, anti-PT. Ele tem ouvido cobranças de eleitores de que o governo Dilma jamais investiu em Roraima, apesar do apoio que ele lhe confiava. Espremido entre um governo federal comandado por Michel Temer e uma realidade local na qual quem dá as cartas é o senador Romero Jucá (PMDB), Telmário está sem opções a não ser votar favorável ao afastamento da petista.
Conhecido nacionalmente após dizer que nomearia uma melancia para a Secretaria do Patrimônio da União (SPU), o senador Hélio José (PMDB-DF) fez um discurso ambíguo, ao elogiar a presidente Dilma Rousseff. Mas assegurou que não votará a favor da petista. “Continuo votando com o PMDB. Apenas fiz justiça a um governo que achei bom”, justificou. Tão logo disse isso, encontrou-se com um interlocutor de Temer no plenário e marcou um encontro com ele o mais rapidamente possível.
Primeira senadora a questionar Dilma, Ana Amélia (PP-RS) afirmou que o discurso da petista não mudou votos simplesmente porque não trouxe nada de novo ao debate público e interno. “Dizer que ela é vítima de um golpe, que não cometeu crimes nas pedaladas e que o governo Temer vai tirar direitos sociais é uma repetição de tudo o que ela vem falando desde o início do processo”, criticou Amélia.
Ana Amélia admite, contudo, que Dilma foi, ao longo do tempo, diminuindo o tom agressivo com que dirigia os ataques aos senadores. Tanto que, ao longo da maratona de ontem, não houve praticamente nenhum incidente digno de registro, apesar do receio de parte a parte em torno de excessos. “Mas ela não pode reclamar, ficamos mais de 200 horas na comissão especial ouvindo testemunhas. Todos chegaram aqui com as convicções fechadas”, completou a senadora do PP.
Um dos votos virados ao longo do processo — no caso, para uma decisão favorável ao impeachment —, o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) criticou o discurso da petista ontem. “Ela tinha três opções. Poderia ter feito um discurso histórico, um político ou um jurídico. Optou, equivocadamente, pelo último”, afirmou Cristovam. “Nesse sentido, ela aproximou-se de José Dirceu, ao se defender na Câmara durante o julgamento do mensalão. Fidel Castro, em seu discurso de despedida do poder, afirmou: ‘a história me absolverá’. Era isso que ela deveria ter dito”, sugeriu.
Outro voto com o qual os aliados de Temer contavam, no entanto, continuará ao lado de Dilma. “Eu fui ministro do Tribunal de Contas dos municípios e examinei este processo com muito cuidado. Dilma não cometeu crime de responsabilidade com os decretos e o Plano Safra”, vaticinou o senador Otto Alencar (PSD-BA). Ele lembrou que foi convidado por Temer para participar de uma cerimônia de revitalização do Rio São Francisco. “Fui, porque é uma bandeira minha. Mas nem Dilma nem Temer me ofereceram nada. Até porque sabem que isso não adiantaria nada.”