Mais de dois milhões de britânicos pedem novo referendo sobre a UE
Parlamento é obrigado a responder a qualquer demanda que supere 10.000 assinaturas
Por: Estado de Minas
Uma petição online reivindicando um segundo referendo sobre a saída do Reino Unido da Europa já reuniu mais de dois milhões de assinaturas, demonstrando a expressiva divisão da população britânica na votação realizada na última quinta-feira (23).
O grande número de acessos à petição, hospedada no website do Parlamento britânico, acabou fazendo com que o site entrasse em colapso. De acordo com o Parlamento, qualquer petição com mais de 100 mil assinaturas será levada à debate na casa.
No curto prazo, contudo, demandas por uma nova votação têm poucas chances de serem acatadas, tendo em vista que os votos pela saída do Reino Unido do bloco europeu superaram em mais de 1 milhão aqueles que optaram pela permanência dos britânicos na UE.
Em decisão histórica que pode mudar o rumo da geopolítica mundial nos próximos anos, os britânicos optaram, em referendo, por deixar a União Europeia (UE). O resultado, divulgado por volta das 3h de ontem (horário de Brasília), indicou que a opção “sair” venceu por mais de 1,2 milhão de votos a de permanecer no bloco. Com os votos dos 382 distritos do Reino Unido apurados, a escolha a favor do Brexit (termo que une as palavras Grã-Bretanha e “saída”, em inglês, Britain Exit) venceu por 51,9% a 48,1%.
O resultado abalou mercados financeiros e provocou uma onda de choque e incredulidade global, uma vez que pesquisas indicavam que a maioria dos britânicos eram favoráveis à permanência no bloco. Logo após a confirmação da vitória do Brexit, o primeiro-ministro David Cameron anunciou que vai renunciar ao cargo. Em pronunciamento em frente à residência oficial, o premiê afirmou que o Reino Unido “deve buscar um novo primeiro-ministro” para negociar o processo de saída da UE.
O premiê defendia a permanência do Reino Unido na comunidade europeia e fez intensa campanha nos meses anteriores ao referendo. Cameron permanece no cargo até outubro e ressaltou a importância de uma “negociação equilibrada” para que nem o bloco nem o país passem por instabilidades políticas e econômicas. “Agora que a decisão foi tomada, precisamos encontrar o melhor caminho. Farei o que for preciso para ajudar”, afirmou. Antes do pronunciamento, ele foi ao Palácio de Buckingham para comunicar pessoalmente à rainha Elizabeth II sua intenção de renunciar.
As reações das autoridades da UE sobre o referendo britânico foram imediatas e os presidentes das instituições do bloco pediram, em comunicado ao governo britânico, que torne efetiva a decisão da população “o mais rápido possível” e inicie o processo de saída. “Agora esperamos que o governo do Reino Unido torne efetiva a decisão do povo britânico o mais rápido possível, por mais doloroso que o possa ser este processo”, diz o comunicado assinado pelos presidentes da Comissão Europeia, Jean-Claude Junker, do Conselho Europeu, Donald Tusk, do Parlamento Europeu, Martin Schulz, e pelo primeiro-ministro holandês, Mark Rutte, que ocupa a presidência da UE.
Próximos passos
A decisão das urnas, no entanto, não significa a saída automática da UE. Em tese, o Parlamento britânico, pode ignorar o resultado e não iniciar as negociações para a saída do bloco, prevista no artigo 50 do Tratado de Lisboa – que definiu as regras para o funcionamento do bloco. Mas esse passo seria inédito e altamente improvável, uma vez que a decisão da população terá grande peso para os parlamentares.
A decisão pela saída venceu por mais de 1,2 milhão de votos, o equivalente a 51,9% dos eleitores
Os integrantes do Parlamento Europeu também começarão nos próximos dias a discutir o processo de saída e a maioria dos integrantes já manifestou o desejo de uma separação rápida para evitar graves prejuízos ao bloco. O próximo passo será a manifestação formal do Reino Unido, por meio de carta enviada aos outros 27 membros, do desejo de deixar a UE.
A decisão já começou a provocar movimentos na Europa. A primeira-ministra escocesa, Nicola Sturgeon, afirmou ontem que a Escócia deverá realizar um segundo referendo sobre sua independência e que lideranças do país pretendem fazer o que for preciso para garantir o lugar na UE. Na Escócia, 62% dos eleitores votaram pela permanência na comunidade europeia.
“Penso que um referendo sobre a independência agora é muito provável. A opção por um segundo referendo está na mesa”, disse, após a divulgação do resultado das urnas pró-Brexit. Em 2014, os escoceses rejeitaram a proposta de se tornar um país independente do Reino Unido e defendem a permanência da Escócia na UE.
Efeito dominó
Políticos de partidos da extrema-direita na França, Itália e Holanda comemoraram a decisão dos britânicos e pediram a realização de consultas populares em seus países sobre a permanência ou saída da UE. Marine Le Pen, líder do partido francês Frente Nacional, afirmou que os cidadãos de seu país deveriam ter o mesmo direito de opinar sobre a situação do país no bloco. “Vitória da liberdade. Como tenho dito há anos, nós agora devemos ter o mesmo referendo na França e em outros países”, escreveu no Le Pen em suas redes sociais.
Farage, líder do Partido da Independência do Reino Unido, e apoiadores do Brexit comemoram o resultado
Na Holanda, o político Geert Wilders, que defende bandeiras contrárias à imigração de refugiados para a Europa, divulgou comunicado afirmando que “holandeses querem estar no comando de seu país, de seu dinheiro, de suas fronteiras e de suas políticas de imigração”. “Tão rápido quanto possível, os holandeses devem ter a oportunidade de se pronunciar a respeito da permanência”, afirmou. Wilders é um dos líderes das pesquisas para as eleições gerais da Holanda.
Já o político italiano Mateo Salvini, líder do partido Liga Norte, usou as redes sociais para celebrar a saída do Reino Unido e criticar defensores da UE. “Viva a coragem dos cidadãos livres! Coração, cérebro e orgulho derrotaram as mentiras, ameaças e chantagens. Obrigado, agora é nossa vez”, afirmou.
O presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, que reúne os chefes de Estado dos países-membros da UE, pediu cautela nas movimentações políticas pelo continente e afirmou que “não é hora de reações histéricas”. Após conhecer o resultado do referendo britânico, Tusk afirmou que os outros membros do bloco estão “determinados a manter a unidade” e veem a UE como “marco de um futuro comum”.