Conhecido por ser expoente de manifestações culturais e religiosas, tais como o Boi “Anjo do Meu Sonho” (zabumba) e o espetáculo ao ar livre da Via Sacra, o Bairro do Anjo da Guarda está perto de comemorar 47 anos de existência. Marcado pela criminalidade, problemas com infraestrutura, saúde e saneamento básico, ele guarda a expectativa de mudança, possibilidades de crescimento nos seus mais variados segmentos.
No local, há muitos anos, residiam agricultores, pescadores e produtores de carvão, criado em uma época que não existia a barragem do Bacanga, tampouco a poluição no rio e praias que circunvizinham a região.
A origem
Tudo começou depois de uma grande tragédia. No dia 14 de outubro de 1968, o bairro do Goiabal foi vítima de um incêndio que até os dias de hoje não se sabe qual a origem. Uns acreditam que foi provocado por fogos de artificio, outros por uma lamparina. Tem até quem diga que foi por causa de um simples pescador que assava peixe na beira do rio.
Mas, ao que se sabe de fatos concretos e não de suposições, é que houve um grande incêndio no Goiabal, com uma mistura de casas em chamas, corpos queimados, lama de mangue e o desespero das pessoas, tornando o quadro ainda mais dramático. Ao todo, 78 casas ficaram completamente destruídas, deixando cerca de 100 famílias desabrigadas, conforme dados da Comissão Estadual de Transferência de População (CETRAP).
A solidariedade
Foi então que se instalou um sentimento de solidariedade e comoção não apenas pelos povoados próximos, mas também por parte do poder público, da igreja, da Companhia de Água e Esgoto do Maranhão (Caema) e até da antiga Telecomunicações do Maranhão (Telma). Os desabrigados foram remanejados para a localidade conhecida por Itapicuraiba, onde receberam roupas, alimento e cobertores.
Com o passar do tempo, a localidade, que havia sido rebatizada de Vila Anjo da Guarda, passou a ser conhecida por Bairro Anjo da Guarda, devido a seu crescimento repentino.
A história do anjo
No dia 1º de abril de 2007, o jornal O Imparcial imprimiu uma matéria contando como surgiu a então icônica estátua do Anjo na entrada do bairro. Segundo o registro jornalístico, a escultura de dois metros foi erguida junto à praça e foi esculpida por um padre italiano chamado Cherubino Luigi Dovera, também responsável pelos monumentos da Praça do Pescador e o Roque Santeiro (retirado do retorno do Bequimão após obras para melhorar o tráfego de veículos no local). O problema é que, devido à ação de vândalos, o marco foi retirado do local em 1998 e até os dias de hoje nunca mais se soube algo sobre ele.
Até que, no ano em que São Luís completou 400 anos, o icônico símbolo do Anjo da Guarda estava de volta. Segundo o que foi divulgado pela prefeitura, responsável pelo resgate desse símbolo do bairro, a iniciativa atendeu a uma solicitação feita pela própria comunidade em audiência com o então prefeito na época, João Castelo, durante o Programa Cidadania para Todos.
A nova estatua é feita em pó de mármore, calcita, poliuretano e fibra de carbono e de vidro aglutinado com resina de poliéster. Em seu interior foi colocada uma estrutura de aço galvanizado (tubos e chapas), recebendo uma leve pintura na cor branca.
O Anjo, batizado de “Arcanjo Gabriel”, recebeu esse nome em referência ao personagem bíblico o qual é responsável por levar as mensagens de Deus.
Idealizada pelo artista plástico Eduardo Sereno, ela precisou, de dois meses para ser concluída. O processo de criação foi feito a partir de um protótipo, o qual foi baseado em pesquisas de referenciais cristãos que pudessem ser associadas ao monumento perdido.
O Anjo da Guarda de hoje e suas principais carências
O Anjo da Guarda tem uma imediação grande. Com 300 mil habitantes e inúmeros problemas no que diz respeito à infraestrutura, saneamento básico, segurança e saúde, ainda subsiste por causa dos seus moradores e da criatividade e superação dos mesmos.
Lá, as ruas não possuem quebra-molas padronizados, a sinalização é ineficiente, as calçadas não estão niveladas e boa parte delas não está disponível para os pedestres. No campo da saúde, o problema é um pouco mais sério. Não existem postos de saúde que assistam gestantes em trabalho de parto, forçando-as a procurarem hospitais distantes e em alguns casos com difícil acesso.
De acordo com Marciel Gomes, presidente da Associação Comunitária Itaqui-Bacanga (ACIB), houve um bom crescimento em todos os setores sociais do bairro, só que estes ainda são insuficientes para dar conta da grande demanda atual. “Um bom exemplo é o Hospital Nossa Senhora da Penha, que está todo reformado e equipado, infelizmente também está parado há um ano. Tivemos também o Posto de Saúde Clodomir Pinheiro, que nasce junto com a história do bairro do Anjo da Guarda, mas que infelizmente se encontra de portas fechadas”, afirma.
Marciel ainda observa que, apesar disso, existem espaços que favorecem a comunidade, como, por exemplo, o Parque Botânico da Vale, propício para passeios ecológicos e atividades físicas, sem contar com as manifestações culturais que ocorrem anualmente nos períodos juninos e natalinos. “O bairro é muito rico em todo tipo de modalidade cultural, as quais vão desde bumba meu boi, à dança portuguesa, cacuriá, teatro, artesanato e praças”.
Quanto à mobilidade urbana, não só o Anjo da Guarda sofre, mas toda a região Itaqui-Bacanga. Em decorrência de a barragem ser o único meio de acesso para entrada e saída, quando ocorre algum acidente ou um fato que obstrua o trânsito nesse perímetro, todos os bairros e localidades, inclusive a Universidade Federal do Maranhão (UFMA), são afetados.
“Todos ficam prejudicados, não apenas os moradores, mas estudantes e trabalhadores. Se houvesse uma interligação da Praia Grande com as comunidades do Tamancão, Vila Nova, Anjo da Guarda e Praia da Guia, de forma que os mangues e ecossistemas que estão ao nosso redor não sejam afetados, com certeza viabilizaria e melhoraria esta região”, salientou Gomes.
Para o feirante Cleomir Nogueira, 42, o bairro agrega qualquer pessoa, apesar de suas dificuldades. Segundo ele, o número de agências bancárias ainda é insuficiente, é necessário haver maior rigor nas fiscalizações dos espaços públicos, além de um melhor saneamento básico. “Eu sou feirante, mas fica complicado trabalhar sabendo que o esgoto escorre ao ar livre. Infelizmente não são todos que têm a noção de pôr um cesto de lixo nas suas bancas, manter o ambiente limpo e higienizado”, afirmou ele.
No dia 14 de outubro, o Anjo da Guarda completará 47 anos, todos marcados por dramas, superações, carências sociais, cultura emergente e, acima de tudo, por uma comunidade que tem orgulho das suas origens.