Em 1947 o jornal O Imparcial (Diários Associados) abriu concurso para uma vaga de repórter. Classificado em 1º lugar, José Sarney, que usou o pseudônimo de “Zé da Ilha”, produziu a melhor reportagem e foi logo aproveitado como repórter de polícia. Em seguida se tornou responsável por um suplemento cultural, em que procurava acompanhar os movimentos literários.
Neste 1º de maio em que O Imparcial comemora 89 anos como o mais tradicionais jornal do Maranhão, o Caderno Impar entrevistou o ex-presidente do Brasil, jornalista, escritor e imortal da Academia Brasileira de Letras, José Sarney, e convidamo-o a relembrar como foi a época em que trabalhou no matutino, como eram as condições em que trabalhava, quem eram os seus companheiros de trabalho e sobretudo, sobre a criação do suplemento cultural Letras e Artes, de O Imparcial, em 1950, quando passou a exercer o cargo de chefia do Jornal e do referido suplemento. Entre outras afirmações Sarney declarou na entrevista que sente um bem querer muito grande pelo Jornal, onde teve espaço para escrever suas criações. “O Imparcial marcou a minha vida”, afirmou.
Trajetória
Em 1953 Sarney bacharelou-se pela Faculdade de Direito do Maranhão, época em que ingressou na Academia Maranhense de Letras. Ao lado de Bandeira Tribuzzi, Luci Teixeira, Lago Burnet, Bello Parga, José Bento e outros escritores, fez parte de um movimento literário difundido por meio da revista que lançou o pós-modernismo no Maranhão, A Ilha, da qual foi um dos fundadores.
Em sua vida literária e cultural, Sarney trabalhou como redator dos jornais O Imparcial, Combate, Jornal do Dia, Jornal do Povo e O Estado do Maranhão. Foi colaborador dos jornais Diário de Pernambuco e Correio do Ceará, das revistas Clã (Ceará), Região (Pernambuco) e Ilha (Maranhão), do Jornal do Brasil, do O Globo, das revistas Senhor e o Cruzeiro e da Folha de S. Paulo.
José Sarney, além de membro da ABL, faz parte também do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão, da Academia Maranhense de Letras, da Academia Brasiliense de Letras, da Academia das Ciências de Lisboa e do InterAction Council (chefes de Estado e de Governo). Foi Presidente da República, no período de 1985 a 1990 e mais recentemente, Presidente do Senado.
O Imparcial – Como e em que situação o senhor veio trabalhar no jornal?
José Sarney – Em 1947 os Diários Associados fizeram um concurso de reportagens que tinha como prêmio um contrato para O Imparcial. Fiz uma série de reportagens sobre A Quinta do Barão e Subterrâneos de São Luís. Entrei para o jornal com um salário de 80 mil réis por mês.
OI – E começou fazendo o quê?
JS – Fui escalado para cobrir a área policial, e todas as manhãs, acompanhado de um fotógrafo, Azoubel, eu percorria as delegacias da cidade.
OI – Quem eram os colegas na época e como era o ambiente de trabalho?
JS – Além do Azoubel, tinha o Emanuel, que era o chefe da redação, o João Silva, que depois foi para a Última Hora, no Rio, o Camelinho, o Galvão, o Bandeira, que era revisor, o Nascimento Morais. O ambiente era informal e éramos uma pequena comunidade.
OI – Qual foi a sua melhor e mais expressiva experiência como repórter?
JS – Havia um criminoso muito conhecido, José Teresa, que foi solto por ser considerado recuperado. Um comerciante do João Paulo montou uma armadilha no quintal para pegar um ladrão que o furtava, e matou o José Teresa. Eu escrevi uma série de reportagens sob o título “José Teresa entre o bem e o mal”, com informações sobre a sua vida, entrevistas com sua mãe e seus amigos. Foi um grande sucesso, vendido como um folhetim, com aumento da tiragem do jornal. Então fui promovido a redator e incumbido de rever os textos dos outros repórteres,
OI – Quando o senhor passou para a área cultural?
JS – De repórter policial passei a redator, de redator a secretário da redação, de secretário da redação a editorialista, e a partir daí, a direção me autorizou a fazer o suplemento literário “Letras e Artes”.
OI – Que pauta o senhor mais teve prazer de cobrir?
JS – As reportagens sobre a cidade de São Luís.
OI – E como era a cultura local na época?
JS – A cultura ainda era do século XIX, baseada nos valores do parnasianismo.
OI – Que artistas se destacavam?
JS – Os da velha geração eram Correa de Araújo, Costa e Silva, Antônio Lopes, Fernando Viana, Clodomir Cardoso, Rubem Almeida, Amaral Raposo, Erasmo Dias, Assis Garrido, Bacelar Portela. Os pintores consagrados eram Newton Pavão, Telesforo Rego.
OI – Sobre os movimentos culturais?
JS – Na minha geração formávamos dois grupos: no Centro Cultural Gonçalves Dias se reuniam Nascimento Moraes Filho, Ferreira Gullar, Lago Burnett; os “neo-modernistas” nos encontrávamos na Movelaria do pintor Pedro Paiva. Éramos os escritores Bandeira Tribuzi, Evandro Sarney, Carlos Madeira, Domingos Vieira Filho, Bello Parga, Nivaldo Macieira, Lucy Teixeira e eu, e os pintores Floriano Teixeira, Figueiredo, Antônio Almeida, Cadmo Silva, Amorim. Gullar e Burnett depois se uniram a nós e acabaram partindo para o Rio de Janeiro.
OI – Você criou o Suplemento Literário de São Luís?
JS – Foi o primeiro e por muito tempo não teve outro. Tínhamos colaborações do Brasil inteiro, fazíamos muito sucesso, dinamizamos o movimento cultural.
OI – Quando o senhor deixou O Imparcial e qual a melhor experiência que levou?
JS – Em 1958, quando me elegi Deputado Federal, deixei o jornal. O Chateaubriand me mandou dizer que eu não deixava O Imparcial, mas ficava licenciado. Assim, sempre me considero vinculado ao jornal.
A melhor experiência foi participar do grupo que tinha à frente José Pires Saboia, que foi meu grande amigo, meu padrinho de casamento, grande inteligência e um dos melhores textos da imprensa, além de grande jurista.
OI – Para finalizar: o senhor pode deixar uma mensagem pelos 89 anos do jornal?
JS – O Imparcial marcou minha vida. Ele abriu suas páginas para que eu escrevesse. Nelas publiquei meus artigos, meus contos, meus ensaios de juventude. Nelas saíram minhas primeiras poesias, que depois recolhi em A Canção Inicial. É uma referência da cidade, uma tradição por quem tenho um grande sentimento de querer bem.