ARTIGO

Risco e oportunidade

Os chineses representam a palavra crise por meio de dois ideogramas, um representa risco, outro, oportunidade. Nada mais adequado e aplicável ao Brasil dos nossos dias, em que só se fala de crise, qualificando-a como política, econômica, moral, financeira. Mais adjetivos se incorporarão aos dicionários dos meios de comunicação. Será que o país sairá desta? […]

Os chineses representam a palavra crise por meio de dois ideogramas, um representa risco, outro, oportunidade. Nada mais adequado e aplicável ao Brasil dos nossos dias, em que só se fala de crise, qualificando-a como política, econômica, moral, financeira. Mais adjetivos se incorporarão aos dicionários dos meios de comunicação. Será que o país sairá desta? Perguntam os analistas. Tenho certeza que sim. Desde que me entendo ouço essa palavra. A última é sempre a pior. Mas como bem sabem os economistas, elas são cíclicas no sistema capitalista, para alguns, ocorrem de dez em dez anos. No primeiro, chamado de virtuoso, a economia cresce, os empregos, a renda. Em seguida vem o decênio da depressão. O crescimento econômico desacelera, retorna o desemprego, baixa a renda.
O Brasil entre 2005 e 2012 conheceu um período de mudanças expressivas. Um terço da população transferiu-se da economia informal para a formal, milhões de postos de empregos foram criados. Ampliou-se a renda, o crédito e o consumo. Os governos do PSDB e do PT, de forma contínua, alavancaram os programas sociais de distribuição da renda, dentro da estrita previsão da Constituição Federal, de cunho socialdemocrata. Na segunda década, entrou em ação um dado determinante, a crise econômica das duas potências mundiais: os Estados Unidos e a China. Elevaram-se as taxas de juros, caíram os preços das commodities e dos produtos industrializados, ampliou-se o desemprego. Dentro da tradicional lógica dos ciclos do capitalismo internacional.
A Constituição de 1988, sucessora da de 1946, visando compensar a negativa de direitos da fase autoritária, foi de excessiva generosidade. O restabelecimento da democracia, em 1985, através do acordo negociado por Tancredo Neves e Ulysses Guimarães, enfrentou a crise fiscal, herdada da ditadura e o impedimento de Collor. Depois, vieram Itamar e Fernando Henrique, construtores do Plano de Estabilização Monetária, o Real, responsável pelo círculo virtuoso que se seguiu, ancorado no capitalismo financeiro internacional.
Os economistas da escola monetarista explicam que não poderia ser diferente. O Brasil, ao contrário dos asiáticos, dispõe de baixa taxa de poupança interna, e por necessitar de recursos financeiros, teria que se submeter aos desígnios do capitalismo internacional, transformando-se em paraíso dos banqueiros e rentistas pela oferta de elevadas taxas de juros. Os especialistas em mercados costumam dizer, parafraseando Churchill: nunca tão poucos ganharam tanto em tão pouco tempo.
O Estado e a sociedade brasileira estão endividados até o pescoço, por conta dos juros escorchantes que lhe são cobrados, na esfera privada em empréstimos, cheques especais, cartões de credito. Perderam a capacidade de investimento, trabalham para sobreviver. Aquele um terço incorporado entre 2005 e 2012 vê-se ameaçado de perder o emprego e a casa, além das dívidas.
Os erros de gestão cometidos pelo Estado, a exemplo do não-investimento em infraestrutura, saneamento e educação, têm que ser assumidos, mas em parte compreendidos pela sua pequena capacidade de investimento, em razão dos pagamentos das dívidas públicas, indexadas em juros altíssimos.
Ao lado disso o presidencialismo de coalizão, baseado em um sem número de partidos, atualmente a conta está em 34. A maioria sem conteúdo social, de programas meramente formais, forçou a adoção de desonerações fiscais, juros subsidiados pelo Tesouro, financiamento de grandes obras, tudo para manter a fidelidade da base aliada, propulsionando a corrupção, agravando a crise fiscal.
Mais que uma reforma ministerial, o país exige que se estabeleça um pacto de governabilidade, acima de partidos. Dele participando empresários, trabalhadores, profissionais liberais, estudantes, entidades associativas, brasileiros de todas as categorias sociais. Para negociar os ajustes propostos. Eles não podem recair sobre os mais fracos, deixando ao largo as corporações e grupos de privilegiados enquistados no Estado, aliados da plutocracia partidária.
A crise é grande, mas não é maior que o Brasil e seu povo. Não adianta tentar a solução pela partidarização de instituições tradicionais. O momento é de risco e de oportunidade, como apontam os ideogramas chineses, para pactuar pelo Brasil. Assegurando-se a seguridade social, há necessidade de reformar a Constituição e o Estado, alterando-se a legislação tributária e a fiscal. O modelo que aí está esgotou-se, tornou-se inviável.
Por fim, não é demais lembrar, para sair da crise é preciso voltar a produzir, a crescer com sustentabilidade. Sem produção não haverá o que distribuir. Impõe-se o reaparelhamento do parque industrial. As previsões cíclicas da economia não são leis irrevogáveis. Se a elites não fizerem as reformas necessárias, as ruas as farão.
VER COMENTÁRIOS
Polícia
Concursos e Emprego
Esportes
Entretenimento e Cultura
Saúde
Negócios
Mais Notícias