EDITORIAL
Mais perto do rebaixamento
Todo mundo sabia que o risco de o Brasil perder o grau de investimento tinha aumentado, desde a semana passada, quando o governo reduziu drasticamente suas metas de superavit fiscal. O que não se esperava, ou, pelo menos, o que mais desejavam o governo, economistas e empresários, é que o país ganhasse mais prazo para […]
Todo mundo sabia que o risco de o Brasil perder o grau de investimento tinha aumentado, desde a semana passada, quando o governo reduziu drasticamente suas metas de superavit fiscal. O que não se esperava, ou, pelo menos, o que mais desejavam o governo, economistas e empresários, é que o país ganhasse mais prazo para tentar impedir seu rebaixamento à condição de pagador duvidoso, ou seja, de investimento especulativo.
Na verdade, esse prazo já tinha sido dado no início do ano pela Standard & Poor’s (S&P), a mais importante das agências internacionais de risco de crédito. A agência entendeu que o governo da presidente Dilma tinha, afinal, reconhecido que as trapalhadas na condução da política econômica de seu primeiro mandato lançaram o país num perigoso atoleiro fiscal, e que ela estaria disposta a implantar e a angariar apoio político para um severo ajuste fiscal. Adiou a revisão da classificação brasileira, de março para o fim do ano.
Mas, em seus relatórios sobre o Brasil nos últimos meses, a S&P deixou claro que observaria o país com redobrada atenção. A real capacidade do governo de implantar o ajuste tem sido o foco dos observadores da agência. Eles não tiraram os olhos do ambiente político e, principalmente, da má vontade da base aliada do próprio governo com relação às medidas que restringem o acesso a benefícios sociais e trabalhistas.
Tampouco escaparam à S&P — como de resto a todo observador internacional isento — os abalos nas lideranças e nas alianças políticas provocados pela apuração de graves casos de corrupção envolvendo empresas estatais e seus fornecedores. E que é cada vez mais evidente a incapacidade da presidente de aprovar no Congresso qualquer coisa a favor do ajuste e de impedir a criação de mais gastos.
Além disso, no âmbito específico do desequilíbrio fiscal, com a revisão da meta fiscal, a S&P já sabe que o buraco é mais fundo do que revelava o governo. Viu que passou a ser total a dependência de receitas crescentes para serem cobertos os deficits e os compromissos herdados do primeiro mandato. Receitas que não virão tão cedo, despesas difíceis de ser evitadas.
Diante desse quadro, a S&P usou termos elegantes ao afirmar que ainda reconhece o ajuste que o Brasil vem tentando fazer, mas que “os riscos para sua execução subiram”. Foi como justificou a decisão de passar de estável para negativa a perspectiva da nota soberana de classificação de risco que, hoje, está apenas um ponto acima do nível de pagador não confiável. Quer dizer que, a qualquer momento, a S&P pode rebaixar a nota do Brasil, fechando as portas do país a investimentos de grandes fundos internacionais e encarecendo toda operação de crédito que o governo e as empresas brasileiras contratarem no exterior.
Essa perspectiva aumenta a responsabilidade do Congresso, que precisa abrir mão de interesses eleitorais ou de corporações sindicais para aprovar o que falta do ajuste, bem como cessar a geração de novos gastos. Não será tarefa fácil. Ao retornar do recesso, os políticos trarão de suas bases a decepção do eleitor que acreditou nas promessas da campanha que reelegeu Dilma. Deputados e senadores terão de honrar o voto que receberam e encontrar um meio de viabilizar o ajuste e evitar que a conta mais alta fique com o povo, na forma de desemprego e prolongada recessão.
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