100 anos do mestre Antônio Almeida
O artista faleceu aos 86 anos, no dia 02 de janeiro de 2009, em decorrência de um câncer.
Durante a Semana de Arte Moderna, entre os dias 13 e 17 de fevereiro, de 1922 vários artistas e intelectuais ligados à elite cafeicultora paulista, nomes como Oswald de Andrade; Anita Malfatti; Mário de Andrade; Manuel Bandeira; Heitor Villa-Lobos; Di Cavalcanti; dentre outros, se reuniram no Teatro Municipal de São Paulo, e apresentaram ao Brasil a Arte Moderna.
O novo estilo foi criado para romper com os padrões artísticos vigentes na época. Alguns meses depois, do mesmo ano de 1922, no dia 27 de maio, há exatamente 100 anos, nascia no Povoado Jacaré, em Barra do Corda, o pintor, escultor, gravador, poeta, muralista, ilustrador, entalhador e tapeceiro, Antônio Alves de Almeida, aquele que mais tarde se tornaria um dos maiores expoentes da arte moderna , pai da arte urbana do Maranhão, e um dos artistas visuais mais versáteis do Brasil.
Hoje na data em que se comemora o centenário de nascimento de Antônio Almeida, O Imparcial presta uma homenagem em forma de resgate histórico da trajetória desse grande artista.
Nasce um grande artista
Fruto da união de uma piauiense e um cearense, ambos agricultores, Antônio Almeida nasceu numa localidade onde a principal atividade era o trabalho na roça, e foi nesse meio rural onde aflorou o seu talento para as artes visuais, quando aos 5 anos de idade ele presenciou uma pessoa desenhando uma cena e aquilo o impressionou.
Daí em diante o autodidata, que definia a si próprio como intuitivo, nunca mais parou. Passava o tempo observando cenas do cotidiano, paisagens, e pessoas, e depois reproduzia em forma de arte.
Foi mandado para estudar na sede do município, aprendeu a ler, o que impulsionou sua busca por conhecimento, assim descobriu as obras de grandes escritores, como Casimiro de Abreu, Castro Alves, Euclides da Cunha, e Camões.
Na juventude foi morar em Pedreiras, mas continuou a produzir. Gostava de desenhar pessoas com as fisionomias caricaturadas, o que lhe rendeu a primeira exposição
Da terra de João do Vale para a capital
Aos 22 anos Antônio Almeida embarca em um trem, tendo como destino a capital do estado, desembarcando em são Luís em 1944, com parco dinheiro no bolso, porém, com sua peculiar inquietude e grande fome por conhecimento.
Em São Luís teve contato com os grandes mestres que reinavam no cenário das artes plásticas, Telésforo Moraes Rego e Newton Pavão, que lhe forneceram alguns pinceis e tinta. Em dezembro daquele mesmo ano, eles o convidam para participar do II Salão Artur Marinho, onde seus trabalhos tiveram ampla aceitação do público, e lhe serviu de passe para fazer parte do distinto grupo de intelectuais da Movelaria Guanabara.
Daí em diante, o jovem artista seguiu conquistando espaço, construindo uma sólida, e respeitada carreira artística, e, em dezembro de 1950 participou, com a obra “O Cortiço”, do I Salão de Pintura da Sociedade de Cultura Artística do Maranhão (SCAM), ganhando o segundo lugar.
Do tradicional ao moderno
Após sua primeira fase na capital, influenciado pelas obras de artistas plásticos como Paul Cézanne, Henri Matisse, e Paul Klee, Antônio Almeida resolve romper com a forma tradicional de fazer arte, o que lhe fez receber críticas de colegas e do público em geral.
Já em 1952 participou, com o seu autorretrato, do Salão de Artes Plásticas do Ceará, a obra lhe rendeu a medalha de prata, e também a honra de ser comparado ao pintor holandês Van Gogh.
Foi um dos organizadores da Revista Legenda que contou com sua primeira ilustração estampando a capa, além da publicação do conto de sua autoria: “A Estranha Amante de Wagner”. No ano de 1953 participou da 2ª Bienal internacional de São Paulo.
Diversificando sua arte
Antônio Almeida começou a diversificar suas técnicas, produziu aquarelas em guache, colagens, e descobriu a pintura em grandes dimensões, começando assim sua dedicação à execução de painéis que retratam motivos populares, lançando mão de temas ligados aos costumes, cultura, tradições, e a religiosidade do povo maranhense, se tornando o percussor da arte urbana.
No ano de 1968, o artista foi convidado por José Sarney para ilustrar o livro de contos “O Norte das Águas”. Sempre buscando a inovação, Antônio Almeida optou por usar a técnica de xilogravura para produzir as ilustrações. Participou da 10ª edição da Bienal Internacional de São Paulo, no ano de 1969. Ainda em 1969 produziu, no estilo parede sulcada, dois murais no Parque do Bom Menino, quando da sua inauguração.
Duas obras de grande importância: “Brincadeira de Criança” e “Bumba meu Boi”. Os murais foram restaurados por Holândia Almeida e Alberto Almeida, filhos do artista, numa parceria com a Prefeitura de São Luís durante uma reforma total do parque no ano de 2020.
Na década de 70 continuou produzindo obras em grandes dimensões, e criou para a Assembleia Legislativa do Maranhão um painel em madeira. Antônio Almeida também participou, em julho de 1976, da Mostra de Arte, Pintura e Escultura, na programação em homenagem aos 50 anos do Jornal O Imparcial.
A mostra foi organizada por Nagy Lajos, e contou com outros grandes expoentes das artes visuais, nomes como Ambrósio Amorim, Maya Ramos, dentre outros. Ao longo dos anos da década de 1980, Antônio Almeida produziu grandes obras de caráter público, pintou com temas populares o mural, e o obelisco, da antiga Estação Rodoviária de São Luís, na época situada no Bairro da Alemanha.
No ano de 1985, participou da Retrospectiva Arte no Maranhão: Uma Visão de 100 anos, no Museu Histórico e Artístico do Maranhão.
Em 1986 foi indicado por Jomar Moraes, para ocupar uma cadeira na Academia Maranhense de Letras, se tornando o primeiro artista plástico a ocupar uma cadeira na AML. Na ocasião, Antônio Almeida doou para a academia três obras entalhadas em madeira. Já no ano de 1987 apresenta ao público maranhense seu painel de azulejos no prédio do extinto BEM (Banco do Estado do Maranhão), localizado na Rua do Egito.
Tal obra causa grande admiração, ainda nos dias atuais, pela a sua beleza e riqueza de detalhes. No mês de outubro de 1988 criou um painel sulcado na parede da fachada da Associação Comercial, com a mesma técnica de sulcado na parede, criou um painel no prédio da agencia do BEM na Avenida Kennedy, onde hoje funciona a Secretaria Municipal da Fazenda de São Luís.
Inovando ainda que nas adversidades
Em meados dos anos 1990, Antônio Almeida deixa de desenhar em face de um glaucoma que lhe faz perder a visão. Apesar da enfermidade, Almeida manteve sua mente em constante atividade criativa, e foi assim que o consagrado artista visual começa a fazer poesias, que ele ditava para filhos e netos escreverem, e assim publicou dois livros.
O livro de poemas Rastros de Procura, e Sentimento Solto, de Poesia e Prosa. Ainda com o auxilio de familiares e amigos, consegue organizar o livro, de poemas e prosas, Vida a Ir: Mensurando o Imensurável.
Para a eternidade
Antônio Almeida teve sua trajetória contada no Documentário Antônio Almeida 100 anos, de Geyse Nicácio, e Augusto Nicácio. No documentário o artista é reverenciado por intelectuais, e grandes nomes do cenário cultural maranhense: dentre eles o Ex-Presidente da república, e membro das academias de letras do Brasil e do Maranhão, José Sarney, que mantinha estreita amizade com o artista.
“Ele era um homem genial, porque ele era um diamante não lapidado. Mas ele era um grande poeta, porque ele trazia uma poesia pura, uma poesia simples que vinha da oralidade. Que cujas as raízes ele trazia da sua experiência do interior. Aonde o sentimento do poeta recolheu aquelas imagens”, relatou o Ex-Presidente.
Em outro trecho do documentário o jornalista, historiador e membro da Academia Maranhense de Letras, Benedito Buzar. “Essa figura extraordinária que foi Antônio Almeida, grande pintor maranhense, pessoa bastante exemplar e marcou a sua presença na vida cultural do maranhense com extraordinária fulgurância dada ao seu talento, dada a sua expressão cultural, a sua criatividade artística. Ele que foi um homem dos mais expoentes que fizeram parte das nossas artes plásticas”.
Ouvido pelo O Imparcial, o artista multimídia, e curador de artes mais antigo em atividade, Couto Corrêa Filho. “Antônio Almeida foi o primeiro artista multimídia no Maranhão, trabalhando com desenvoltura em todas as linguagens artísticas compreendidas sob denominação genérica de artes visuais, mantendo um padrão alto de criatividade e fartura artesanal em suas obras, contribuindo sobremodo para elevar o nível do fenômeno estético em São Luís e no Maranhão”.
Antônio Almeida faleceu aos 86 anos, em decorrência de um câncer, no dia 02 de janeiro de 2009, mas segue eternizado através da sua arte, expressada em variadas técnicas, servindo de inspiração artística, e um grande exemplo de determinação.