LUTO

bell hooks, um dos maiores nomes do feminismo, morre aos 69 anos

Quando decidiu se tornar autora, Gloria Jean Watkins adotou o nome inspirado na bisavó materna – bell hooks.

(Foto: Monica Almeida/The New York Times)

A escritora, crítica, feminista e intelectual negra bell hooks morreu, nesta quarta-feira (15/12), aos 69 anos. Ela estava doente e faleceu em casa, em Berea, no Kentucky, enquanto estava cercada por amigos e familiares, informou a sobrinha da autora, Ebony Motley.

Natural da cidade rural de Hopkinsville, no Kentucky, Gloria Jean Watkins, nome de registro da intelectual, nasceu em 25 de setembro de 1952. Do núcleo rural, ela foi para a academia: formou-se em literatura inglesa na Universidade de Stanford, tornou-se mestre na Universidade de Wisconsin e doutora na Universidade da Califórnia.

Ao decidir se tornar autora, ela adotou o nome inspirado na bisavó materna — bell hooks — em letras minúsculas, para “não roubar o destaque do conteúdo da escrita” dela.

hooks fez história ao afirmar que a luta feminista vista até a década de 80, o chamado feminismo mainstream, focava apenas em um grupo seleto de mulheres brancas, de classe média e alta, e não valorizava e nem defendia as necessidades das mulheres negras.

A partir da obra Ain’t I A Woman? (E eu não sou uma mulher?), publicado em 1981, as ativistas do movimento tiveram que ampliar a mesa de discussões para que a luta feminista, verdadeiramente, abraçasse todas as mulheres. Em 2002, o Publishers Weekly, especialista em publicações literárias, avaliou a obra como uma das vinte mais influentes publicadas entre 1981 a 2000.

Ela é dona de mais de 40 livros, ensaios, poesias e até mesmo obras infantis, com temáticas focadas em feminismo, racismo, cultura, política, papéis de gênero, amor e espiritualidade.

De volta às raízes 

Na infância, hooks enfrentou resquícios da segregação norteamericana entre negros e brancos no Kentucky, e, por uma parte da infância, estudou em escolas públicas para negros. Na adolescência, passou a estudar em colégios integrados, locais em que viveu discriminação por ser minoria entre alunos e professores.

A experiência de discriminação racial, o pertencimento a classe trabalhadora e a rotina com uma família numerosa — com pais e sete irmãos— foram a base para os primeiros estudos da autora sobre raça, classe e gênero. hooks integrava os temas em uma busca para identificar os fatores de perpetuação dos sistemas de opressão sobre ricos contra pobres; homens contra mulheres e brancos contra negros.

Em 2004, ela voltou para o Kentucky para lecionar no Berea College. A volta, marcante para a autora, foi registrada por ela no livro Belonging: A culture of place (Pertencimento: A cultura do lugar). Em 2010, a faculdade em que ela passou a doar os dias para passar os conhecimentos adquiridos, homenageou-a com uma galeria de arte e literatura chamada Instituto bell hooks, que abriga a coleção de arte contemporânea afro-americana adquirida pela autora, artefatos pessoa se cópias dos livros dela publicados em outras línguas.

Em uma entrevista ao jornalista Tom Eblen, em 2018, hooks afirmou que o local era uma forma de aproximar a universidade com a comunidade. “Muitas pessoas não se sentem confortáveis em vir aos campi da faculdade para uma conversa. Eles sentem que aquele não é o seu lugar “, disse ela. “O objetivo do instituto é ser esse tipo de local democrático. Não são necessários diplomas”, declarou.

Ao saber da morte da autora, a instituição publicou uma nota de lamento. “O Berea College está profundamente triste com a morte de bell hooks, distinto professor residente em estudos dos Apalaches, autora prodigiosa, intelectual pública e uma das estudiosas feministas mais importantes do país”, disse o colégio em um comunicado.

Luther King, Malcom X e Paulo Freire: as influências de hooks

A autora não escondia as principais inspirações na hora de escrever suas obras e manifestos. Além dos ativistas negros Martin Luther King e Malcom X, a intelectual revelou que, ao buscar conhecer mais sobre o papel da educação na libertação da sociedade, encontrou no patrono da educação brasileira, Paulo Freire, o caminho.

Uma das obras, Ensinando comunidade – uma pedagogia de esperança, hooks conta sobre o encontro com o autor. “Aprendi muito com seu trabalho, aprendi novas maneiras de pensar sobre a realidade social que era libertadora. Paulo foi um dos pensadores do qual o trabalho deu-me uma linguagem. Ele me fez pensar profundamente sobre a construção de uma identidade na resistência”, disse.

“Existe uma frase de Freire que se tornou um mantra revolucionário para mim: ‘Nós não podemos entrar na luta como objetos para nos tornarmos sujeitos mais tarde’”, explicou na obra.

“Existe uma frase de Freire que se tornou um mantra revolucionário para mim: ‘Nós não podemos entrar na luta como objetos para nos tornarmos sujeitos mais tarde’”, explicou na obra.

“Realmente, é difícil achar palavras adequadas para explicar como esta frase era como uma porta fechada — e eu lutei comigo mesma para achar a chave — e aquela luta engajou-me num processo de pensamento crítico que era transformador. Esta experiência posicionou Freire em minhas mãos e no meu coração como um professor desafiador, de quem o trabalho ampliou minha própria luta contra o processo colonizador — a mente passível de colonização”, escreveu.

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