Sem São João, artistas e grupos folclóricos se reinventam para superar a tristeza da tradição interrompida pela pandemia
Com o São João maranhense cancelado, os impactos na cadeia econômica e produtiva envolvida diretamente com a festa são gigantescos.
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(Foto: Reprodução)
Tão certo para o brasileiro que em fevereiro (às vezes em março) tem carnaval, para o nordestino, junho é tempo de celebrar o São João. Mas quem diria?! Por causa da pandemia do novo coronavírus, os arraiais e as festas típicas do período foram cancelados, como medida de proteção contra o avanço do contágio.
Orgulho e tradição, com o São João maranhense cancelado, os impactos na cadeia econômica e produtiva envolvida diretamente com a festa são gigantescos. De acordo com a Secretaria de Estado da Cultura (SECMA), os prejuízos serão algo em torno de R$76 milhões de reais, o que corresponde a quatro vezes o investimento nas festas juninas em 2019.
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De cara, um dos maiores impactos é no turismo. Dados do Instituto de Pesquisa Interpreta revelam que, em 2019, o São João do Maranhão favoreceu uma ocupação hoteleira em São Luís de 70%. De quebra, quem passeou na capital maranhense também esticou até os Lençóis Maranhenses no período. Em Barreirinhas, a taxa de ocupação foi de 85%. O Aeroporto Internacional de São Luís movimentou, em junho do ano passado, cerca de 150 mil passageiros, o que representou uma alta de 15% em relação ao mesmo mês no ano anterior. Agora, sem esse grande e importante chamariz de turistas, a economia em torno da tradição viverá, certamente, o ano mais difícil da história até aqui.
Nem orquestras, nem matracas
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Se quem aprecia as atrações é impactado pela ausência dos festejos, imagine quem dedica a vida à cultura! Produtores culturais, brincantes, cantadores de Bumba Meu Boi e diversos grupos folclóricos já sentem as dificuldades causadas pela crise do novo coronavírus..
Concita Braga, presidente do Boi de Nina Rodrigues – um dos mais prestigiados do sotaque de orquestra do Maranhão – confidencia que tem encarado esse cenário com tristeza, mas ressalta que a prioridade é a saúde dos brincantes e suas famílias.
“Acredito que neste momento em que todos estamos apreensivos com a pandemia, o mais inteligente é não ter o São João. Ficamos tristes, pois faz parte da nossa história, e São Luís é a cara do São João. Estou com meu coração dilacerado de dor diante de tudo que está acontecendo, mas compreendo que não podemos ter o São João neste ano, e que o melhor neste momento é cuidar das nossas famílias, amigos e rezar para as pessoas que estão sofrendo sem ter uma luz. Vamos nos abster de nossas atividades em prol das pessoas que precisam de cuidados”, defende.
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Entre os grupos de Bumba Meu Boi do sotaque de matraca, marcados por aglomerações de brincantes, em meio a matraqueiros e pandeireiros comandados pelos amos (cantadores), o Boi de Maracanã é um dos que arrastam multidões de arraial em arraial. Ribinha de Maracanã, filho do saudoso mestre Humberto, conhecido como o Guriatã, hoje é o principal amo do grupo. Ribinha confirma que o discurso entre todos os envolvidos é o mesmo.
“Nós, como donos das brincadeiras culturais, temos que ter consciência deste momento tão difícil que estamos vivendo, e que preservar e cuidar de vidas nesse momento de pandemia é mais importante. Por parte dos brincantes, há uma forte conscientização das pessoas que estão aderindo com mais convicção ao isolamento social, o uso de máscaras, do álcool em gel”, opina.
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Ribinha de Maracanã comenta que não tem sido fácil para ninguém, principalmente, porque a cultura tem a ver com a paixão e a crença das pessoas. “Agora em maio, começariam os ensaios do Boi de Maracanã, depois já vinha temporada junina em todo Maranhão. Mas nós entendemos o momento, e acreditamos com fé em Deus que tudo em breve irá passar. Todos os anos, o Boi de Maracanã no dia 23 de junho recebe carinhosamente turistas de vários estados do Brasil e do exterior. No ano passado foi surpreendente! Muita gente esteve presente em nossa sede e acompanhou o boi a noite toda. Nossa cultura é muito forte!”, lembra Ribinha.
Lives juninas
O cantador Ribinha defende que parados os grupos não podem ficar e revela que tem lives programadas nas redes sociais para não deixar a chama da tradição se apagar. A primeira será nesta sexta-feira (22) e a próxima já tem data: 13 de junho: “Nós estamos com uma programação da nossa primeira live solidária do Boi de Maracanã no dia 13 de junho às 19h pelas nossas redes oficiais: YouTube, Instagram e Facebook. A live terá parte das arrecadações destinadas ao Instituto Antônio Bruno e a famílias carentes da zona rural nas proximidades do Maracanã, em São Luís. Também já aderimos fazer nossas reuniões on-line com os membros da nossa diretoria no comando da nossa presidente, Maria José Lima Soares”, especifica.
Ano a ano, a festa que costuma anunciar a chegada das celebrações a São João no Maranhão é a Festança Junina, sempre realizada no último fim de semana do mês de maio. Em 2020, como não dá para fazer a festa, o produtor cultural idealizador do evento, Mário Jorge, planejou e organizou uma live nas redes sociais com duas participações especiais: os cantadores Roberto Brandão, da Companhia Barrica, e o próprio Ribinha do Boi de Maracanã. A transmissão será nas rede sociais da Festança nesta sexta-feira (22), às 20h.
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Mário Jorge reforça que é uma grande tristeza cancelar um evento de grande porte e com sucesso público, mas que o momento é de priorização da saúde: “O momento é difícil, a gente passa o ano todo idealizando a festa, a identidade visual, a infraestrutura, para que ocorra tudo certo. É muito triste e complicado. O momento não é adequado. Enquanto as autoridades sanitárias e de saúde não derem um fim na pandemia, não teremos condições de realizar o evento”, destaca.
Mas Mário Jorge também deixa um fio de esperança ainda para o ano de 2020. “Se houver condições, e os órgãos responsáveis vierem a autorizar, poderemos fazer a Festança no mês de setembro ou outubro. O mais importante é a saúde. Quando se faz um grande evento, como um arraial, há aglomerações. O foco neste momento é a saúde em primeiro lugar”, conclui o produtor cultural.
Paliativos
Com o São João do Maranhão cancelado em face da crise sanitária do coronavírus, que impede aglomerações, a SECMA diz ter dado cumprimento ao seu compromisso com a cultura do estado. Exemplo é o Programa Conexão Cultural, que já ajudou mais de 600 artistas com apresentações on-line nas redes sociais institucionais. A Secretaria anuncia que, em breve, lançará outros editais específicos ao contexto junino em várias esferas.