O rapper Emicida fez barulho nas redes sociais, no último dia 1º, ao divulgar seu novo clipe, Boa esperança. Dirigido por Kátia Lund e João Wainer, o vídeo tem fotografia de cinema e mostra a rebelião de empregados de uma mansão, que se revoltam com os patrões ao som das batidas de hip-hop e da letra que diz “favela ainda é senzala. Bomba-relógio prestes a estourar”.
A música faz parte de seu novo álbum, baseado em uma viagem feita por ele a Cabo Verde e Angola. O disco contará com as participações de Caetano Veloso e Vanessa da Mata e deve ser lançado em agosto. Antes disso, o rapper agendou para ontem show em São Paulo, para marcar outra de suas empreitadas: a criação de uma linha de roupas em parceria com a marca West Coast, com direção criativa do estilista João Pimenta.
Entre as peças, há camisas, botas, tênis e moletom, que custam de R$ 189 a R$ 389. “Minha mãe era empregada, eu morava na favela, mas ia ao bairro dos playboys todo dia e isso também foi importante na minha formação”, diz Emicida – ele cresceu no Bairro Cachoeira, zona norte da capital paulista. “Gosto da fusão dos dois mundos.” Aos 29 anos, dono da própria gravadora e recém-chegado de turnê pela Europa, Emicida gosta também de quadrinhos, política e contar histórias.
Quatro perguntas // Emicida
Por que se interessou pela proposta de lançar uma coleção de roupas?
Antes mesmo de a marca me procurar, eu andava desenhando roupas. Comprei uns livros de corte e costura num sebo e, às vezes, faço aula de tricô com a minha mãe. (Risos) Ficamos conversando sobre a vida e tricotando. Quando soube do conceito da coleção, do lance do workwear, de ser uma roupa de trabalho, achei que tinha a ver. Porque é isso que a gente faz – corre. Tanto que as etiquetas das roupas têm escrito “Corre Sempre”, com o desenho de uma marmitinha.
Você criou mesmo as peças?
Sim. O João (Pimenta) me deu um direcionamento e rabiscamos as ideias. Quis falar das quebradas, que é de onde o trabalhador sai todo dia para atravessar a cidade. Aí, liguei para o Opni, um coletivo de arte de São Mateus, que criou uma estampa baseada na fiação elétrica lá do meu bairro. Juntei João Pimenta, Emicida, West Coast e Opni nessa história. É disso que gosto.
Você já afirmou ser contra a redução da maioridade penal, pois acredita que os jovens precisam de escola e não de cadeia. Como foi a sua formação?
Meu pai morreu quando eu tinha 6 anos e a minha mãe sempre teve que trabalhar. Ela era doméstica em duas casas de família e, para fugir do estresse, começou a ler. Parei de estudar na 3ª série, pois comecei a brigar por causa dos comentários racistas que sofria. Depois, acabei voltando. Devo muito do que sei ao hip-hop também. Brinco que, na minha época, para entrar no hip-hop você tinha que saber toda a biografia do Malcolm X. O papel do MC é esse, passar informação.
Você se preocupa em não se tornar mainstream demais?
Na minha cabeça, sou underground! O que apodrece o mainstream é a sua atitude em relação a ele. Você não pode deixar que o mundo paute a sua busca como artista. E a minha busca é fazer justiça a esses 100 anos de música brasileira e mostrar que a maneira como o hip-hop se comunica é fruto da diáspora africana. É disso que trata meu próximo álbum.